A lesão do nadador Ryan Lochte, tão grave quanto anedótica, traz de volta à memória algumas das lesões mais insólitas da história do desporto. O registo de incidentes é demasiado vasto para abarcar várias modalidade, por isso, por esta vez, decidimos limitar-nos ao futebol. A escolha é rica: de frascos de perfume a triciclos, de alces a cães vadios, de eletrodomésticos a jogos de tabuleiro, eis algumas das formas mais inesperadas (e, em alguns casos, francamente estúpidas) de pôr em risco uma carreira.

Comecemos por um clássico: o famoso frasco de aftershave que levou o guardião espanhol Santiago Cañizares a falhar a convocatória para o Mundial 2002, devido a uma lesão num tendão de um pé. Quem aproveitou foi o jovem Iker Casillas, que a partir daí se fixou como titular da «roja».

O frasco de Cañizares é a prova de que os acidentes domésticos podem ter as origens mais inesperadas. Que o diga o defesa italiano Alessandro Nesta, que em 2005 teve de ser operado ao pulso, devido a uma tendinite crónica provocada por excesso de playstation. No mesmo ano, o finlandês Jari Litmanen falhou um jogo da sua seleção por ter sido atingido num olho pela anilha de uma lata de Coca-cola.

Os animais nossos amigos

Esse não foi, porém, o incidente mais estranho a afastar um jogador da sua seleção: em 1981, o defesa norueguês Svein Grondalen falhou um jogo de qualificação para o Mundial de Espanha. Motivo? Foi abalroado por um alce quando fazia jogging num bosque perto de casa.

O exotismo de um alce é difícil de bater. Mas o defesa do Corunha, Enrique Romero, bem tentou: em setembro de 2003, à chegada ao aeroporto de Pamplona para um jogo com o Osasuna, Romero viu uma pequena cobra no chão e, desafiado pelos colegas, decidiu pegar-lhe. Era uma víbora, e a mordidela na mão levou-o a falhar esse jogo e a permanecer internado no hospital até a reação alérgica passar.

Ainda assim, o perigo pode vir de onde menos se espera: um cachorrinho recém-chegado a casa, por exemplo. Em 1999, o médio do Barnsley, Darren Barnard, escorregou numa poça de urina do seu novo amiguinho Zak: valeu uma rotura de ligamentos no joelho e um período de recuperação de cinco meses, tempo mais do que suficiente para ensinar a Zak as regras da casa. Mas se Barnard teve azar, o que dizer do incidente protagonizado pelo guarda-redes Chic Broadie, do Brentford, e um cão anónimo que decidiu invadir o relvado durante um jogo com o Colchester, em novembro de 1970?



Dá vontade de rir, não dá? Talvez um pouco menos, se lhe dissermos que Broadie sofreu neste lance uma lesão no joelho que acabou com a sua carreira profissional. E o cão nem amarelo levou.

Outro momento extremamente doloroso, aconteceu com o luso-suíço Paulo Diogo que, em 2004, ao festejar um golo do Servette junto dos adeptos, ficou com o dedo preso pela aliança numa grade metálica. Ao descer para o relvado, ficou com metade do dedo arrancado. Nota de humor negro: ao deixar o relvado rumo ao hospital, ainda levou cartão amarelo (as imagens estão aqui, mas são só para estômagos fortes).

Outro festejo de consequências nefastas foi protagonizado pelo argentino Martin Palermo que, em 2001, após marcar o primeiro golo ao serviço do Villarreal, não resistiu a festejar junto da bancada onde estavam os (poucos) adeptos do «submarino amarelo». Parte da vedação ruiu, os adeptos cairam-lhe em cima, e o goleador argentino ficou seis meses afastado dos relvados, com fraturas no tornozelo, tíbia, perónio. Foi assim:



Quem tem filhos tem sarilhos

Ah, as crianças, essa permanente fonte de alegria! E de problemas: que o diga o internacional inglês David Batty, que falhou o Euro 2000 devido a uma lesão no tendão de Aquiles. A causa? Foi atropelado pelo triciclo do filho quando brincava com ele no jardim. Um azar que Kun Aguero também conheceu, em março deste ano, ao tropeçar na moto em miniatura do seu filho. Menos mal, a entorse passou depressa.

Mas não são necessários animais ou crianças por perto para as coisas correrem mal. Às vezes basta um jogo de Scrabble. Que o diga o guarda-redes francês Lionel Letizi, que em dezembro de 2002, durante um estágio do PSG, se lesionou nas costas ao apanhar uma peça que tinha caído ao chão. Letizi falhou os dois jogos seguintes da sua equipa e, consta, passou a dedicar-se ao jogo do galo nas concentrações.

Por sinal, os guarda-redes são especialmente vulneráveis a acidentes domésticos: dois internacionais ingleses, David Seaman e David James, sofreram lesões prolongadas, após tentarem apanhar comandos de TV do chão. Já o defesa do Glasgow Rangers, Kirk Broadfoot teve, em maio de 2009, um momento de azar quando, ao espreitar os ovos que tinha acabado de pôr no microondas, estes lhe explodiram na cara, provocando-lhe queimaduras faciais.

Mas em que é que estavam a pensar?!

O internacional inglês Darius Vassell levou o conceito de má automedicação a extremos desconhecidos quando, em 2003, decidiu usar um berbequim para rebentar uma bolha de sangue pisado situado por baixo da unha do dedo grande do pé. A ferida acabou por infetar, e a unha teve de ser arrancada no hospital, levando a parar duas semanas. Ainda assim, abençoado berbequim, Vassell recuperou a tempo de falhar o penálti decisivo contra Portugal, no Euro 2004.

Já Carlos Busquets, pai de Sergio, e guarda-redes do Barcelona nos anos 90, esteve várias semanas afastado dos treinos depois de aparecer com queimaduras graves nas duas mãos. A explicação: quis agarrar o ferro de engomar que a sua mulher tinha deixado cair.

A falta de senso comum teve outro episódio inesquecível em fevereiro de 2012, quando o médio argentino Ever Banega deixou o carro destravado enquanto abastecia. Ao vê-lo movimentar-se tentou detê-lo com a perna. Sem surpresa, acabou atropelado pelo próprio veículo, fraturando a tíbia e o perónio e ficando vários meses de baixa.

Também o internacional alemão Boateng tem uma história pouco edificante para contar: em 2010 lesionou-se no joelho esquerdo ao serviço da seleção e, durante o voo de regresso ao clube (que na altura era o Manchester City) foi atingido por um carrinho de bebidas, agravando o problema em mais algumas semanas.

Às vezes, as lesões estúpidas acontecem em pleno relvado. Exemplo: Steve Morrow, do Arsenal, marcou o golo da vitória na final da Taça da Liga, em 1993. No final do jogo, o seu parceiro de defesa, Tony Adams, decidiu levá-lo em ombros. Mas, depois, mudou de ideias, deixando Morrow despenhar-se, fraturando o braço e falhando a final da Taça, duas semanas depois. O incidente foi recriado por um programa humorístico, alguns anos mais tarde, com a participação bem-humorada do próprio Morrow. Realmente, mais vale rir.