Este texto pretende ser uma reflexão e um guia prático para ajudar os leitores que se sentem estupefactos perante o momento actual do futebol português. Parte do princípio de que os factos são sagrados e as opiniões são livres. Se aguentar até ao fim e quiser partilhar a sua opinião, caro leitor, o seu comentário será bem-vindo.
O que se passa hoje no futebol português?
Nem todos os passos são claros, mas o essencial creio que está à vista: trata-se de um luta entre Benfica e F.C. Porto (escolho a ordem alfabética para nomear os intervenientes).
Uma luta pelo título, mas também pelo dinheiro da Liga dos Campeões.
É também uma luta entre duas pessoas que antes foram amigas e hoje não se suportam, Jorge Nuno Pinto da Costa e Luís Filipe Vieira (outra vez por ordem alfabética).
Já não é uma luta entre duas culturas e duas formas distintas de estar no futebol (ainda recentemente, quando se recordou Pedroto, ficou à vista a base ideológica e comportamental que suporta o F.C. Porto dos tempos modernos). Hoje, por estranho que possa parecer, assistimos a um combate no mesmo terreno, com armas e estratégias muito semelhantes. O Benfica de outros tempos acabou (para ser justo, já tinha acabado há muito tempo, só não aparecera uma nova identidade, apenas o vazio).
Por que sucede?
Esta luta só acontece agora, de forma tão evidente, porque o Benfica está mais forte do que tem sido hábito neste século.
O facto de o clube da Luz aparecer mais sólido e competitivo retirou tempo ao F.C. Porto e ao fazê-lo permitiu a dúvida.
Nos últimos anos, o crónico campeão deu-se ao luxo de vender sempre os melhores jogadores, realizar dinheiro e mesmo assim continuar a vencer. Por duas razões simples: porque os adversários apresentaram fragilidades e porque teve tempo. Mesmo quando oscilou, o F.C. Porto manteve-se à frente ou pelo menos bem dentro da corrida.
Este ano, pela primeira vez nos últimos anos, o dragão está há demasiado tempo longe da liderança e quem vê os jogos percebe que existe uma possibilidade real de não chegar ao fim em primeiro. E até, pasme-se, é justo para o Sp. Braga colocar a hipótese de a equipa de Jesualdo Ferreira terminar fora dos lugares de acesso à Liga dos Campeões.
A informação é a chave?
O Benfica está mais forte por duas ou três razões fáceis de entender. Por um lado contratou um treinador que conhece o futebol português, o que reduziu a zero o tempo de adaptação, tão bem aproveitado pelo F.C. Porto no passado. Além disso foi feliz em duas ou três contratações e, não menos importante, montou uma estrutura forte de suporte a tudo isto.
Essa estrutura movimenta-se bem na parte menos visível do futebol.
Tem pessoas bem informadas, com experiência e conhecimentos vários. E tem funcionado como um corpo só, pelo menos publicamente.
Uma das áreas mais cuidadas é a da comunicação. Existe um canal de televisão sem grande expressão, mas que serve para ir passando a mensagem junto dos adeptos. Uma relação mais do que privilegiada com um jornal diário, que sublinha as forças próprias e as fraquezas alheias. Acresce ainda uma pressão constante sobre a generalidade dos meios de comunicação social, através de uma gestão atenta da informação: o que se dá, o que se contesta, quem fala, como se fala, a quem se fala.
No fundo, o Benfica joga com a comunicação social uma partida que o F.C. Porto «inventou» e que conhece há muitos anos. Neste tabuleiro, durante anos inclinado, as contas estão agora equilibradas.
(um aspecto lateral: nos dias que correm, seria interessante filmar, e divulgar, o comportamento que os responsáveis dos diversos clubes têm na zona de entrevistas rápidas a seguir aos jogos, hoje o único momento de exposição/fragilidade mediática que os protagonistas têm de enfrentar)
Guia prático: parte II