Gerard Piqué provocou o Espanhol, foi jogar ao Cornellà-El Prat, passou o jogo todo a ser insultado e aos 82 minutos saltou para marcar o golo que garantiu o empate ao Barcelona. E a seguir dirigiu-se para as bancadas com este gesto, a mandá-los calar.

É Piqué, não esperem que seja politicamente correto. É Piqué e é o momento catalão. Do referendo pela independência às eleições e, agora, ao impasse na tomada de posse do novo governo, um processo que acentua diferenças.

O motivo próximo que levou ao gesto de Piqué foram as palavras do jogador do Barcelona há duas semanas, quando os «culés» levaram a melhor no dérbi da segunda mão da Taça do Rei, depois de terem perdido em casa do Espanhol. Nessa altura, Piqué referiu-se ao adversário com uma provocação óbvia. Chamou-lhe «Espanhol de Cornellà», não de Barcelona. Aludindo à localidade nos subúrbios de Barcelona onde o Espanhol tem sede, mas por arrastamento afastando-o simbolicamente da capital da Catalunha.

A imprensa espanhola noticiou que Piqué podia ser responsabilizado disciplinarmente por aquelas declarações. E neste domingo, lá está, o Barça foi a Cornellà. E o Espanhol marcou primeiro, e esteve na frente. E Piqué ouviu insultos à sua família, à mulher e ao filho. E, num daqueles «twists» que fazem do futebol esta coisa notável, foi mesmo Piqué quem evitou a derrota do Barça. E depois, não resistiu.

No fim, explicou. E foi ainda um bocadinho mais longe. «Dizer que o Espanhol é de Cornellà não é uma falta de respeito, é uma evidência. O Espanhol está cada vez mais afastado de Barcelona e tem um presidente chinês», disse. «Queixam-se por eu dizer isto e não investigam os insultos à minha família. Mandá-los calar era o mínimo que podia fazer. Os jogadores têm responsabilidades mas também são pessoas. E há um limite. E se quem manda não toma decisões e não diz nada, não ficaremos calados.»

Entre o Espanhol e o Barcelona há um mundo de distância, há os estereótipos que nunca dizem tudo mas marcam e dizem que um é o clube historicamente alinhado com o poder central, o outro o símbolo da força da Catalunha, do sonho da independência. Mas tem havido, apesar de tudo, alguma cordialidade. Como a tradição da fotografia conjunta dos dois treinadores antes do dérbi, retomada esta época com Quique Flores e Ernesto Valverde: foi interrompida na época anterior, porque a relação entre Quique e Luis Enrique não era boa.

Que consequências terá o incidente com Piqué num extremar de posições ainda é cedo para perceber. Na sala de imprensa, os dois treinadores tentaram tirar peso ao que se passou. «Contextualizo o gesto como parte do que se passou esta semana», disse Valverde. «Um jogador não pode mandar calar adeptos e muito menos os nossos. Os gestos são gestos e assim ficam. Mas os adeptos do Espanhol estão acima disso e saberão estar nos próximos dias.»