Depois de cinco jogos ao serviço do Newell’s, Diego regressa em 1995 ao seu Boca. D10S, o Barrilete Cósmico. Claudio Caniggia, recuperado do suicídio da mãe, também chega à Bombonera, logo depois de deixar o Benfica. Tal como Patrón Bermúdez. A esse grande Boca, juntam-se ainda os gémeos Schelotto, Martín Palermo, Córdoba e Solano. Há ainda Riquelme e Latorre. Um plantel de luxo, que contudo não consegue vingar.

Diego não está em muitos encontros consecutivos, mas ainda é Maradona. Em pleno ocaso da carreira, ainda vive inúmeros episódios intensos: o beijo apaixonado e polémico na boca de El Pájaro Caniggia durante o superclásico com o River, o reencontro indesejado e muito contestado com Bilardo na Bombonera e nova recaída no uso de drogas, da qual se escapa com um acordo jogo-a-jogo, que lhe permite continuar em campo. Depois, há o inoportuno Chilavert e a força do Vélez.

O sucesso é, por isso, relativo. É que o Boca encanta, mas títulos não consegue nenhum.

A 16 de setembro de 1997, o conjunto xeneize visita Liniers e o Vélez, para a quarta jornada do Apertura. Estão já, frente a frente, dois dos maiores candidatos ao título de campeão. Mais ou menos a meio da batalha, é altura para um duelo muito particular, debaixo de todos os holofotes. De um dos lados do livre direto, o Pelusa e a ameaça que faz pairar quase sempre sobre as balizas com aqueles meios-penáltis; do outro o Bulldog Chilavert, o louco guarda-redes paraguaio, entre os postes, capaz de cerrar os dentes e lutar até ao limite por cada bola, talvez ainda mais motivado que antes a provar alguma coisa, depois de não ter conseguido transferir-se para o Boca um mês antes. Apesar dos recados na imprensa.

Esta, a bola, não pode ir mais bem colocada. E basta dizer-vos isto, que conhecem Maradona e o seu jeito de enrolá-la, curvá-la, dar-lhe rédea curta até chegar ao destino, para que imaginem tudo o resto. O remate alinha-se com o ângulo superior direito da baliza dos locais e, como tantas vezes antes, a sentença parece inevitável. Antes que o grito se solte definitivamente, Chilavert voa, voa e desvia-o contra o poste. Diego reconhece a grandeza do momento, e aplaude o rival.

A batalha acaba com dois grandes zeros e uma ideia ainda por concretizar. José Luis Chilavert nega o último golo da carreira a Maradona, e festejará o título no final do campeonato. Sim, Diego não volta a marcar, e em outubro diz definitivamente adeus ao futebol. Esgotado pela pressão, e pelos controlos anti-doping sucessivos, D10S despede-se sem glória.

Ao longo dos anos, o guarda-redes paraguaio torna-se famoso ao fazer precisamente aquilo que Maradona não conseguiu naquele momento, em Liniers. À medida que vai aprimorando o remate nessas situações de jogo e até nos penáltis, os golos não param de chegar. Chega aos 59 em toda carreira. O máximo que consegue numa única época são 12, convertendo-se no especialista designado no clube e na seleção guaraní.

Nesse 16 de setembro de 1997, sete épocas antes de ele próprio dizer adeus, de novo no Vélez, a seguir a ter vestido as cores de Estrasburgo e Peñarol, é ao negar um golo a Maradona que conquista parangonas e manchetes.

Chilavert transportará essa arrogância, e até a rivalidade, dos relvados para o resto da vida. Não é a última vez que se coloca no caminho do grande astro argentino. Critica-o severamente na sequência do fracasso enquanto selecionador no Mundial-2010, volta a atacá-lo anos depois, lembrando que ele próprio foi várias vezes o melhor do mundo sem recurso a drogas. Uma violência verbal aparentemente gratuita, já que o Pelusa até tinha o paraguaio em boa conta, entregando-lhe o número 15 numa lista de 100 jogadores que mais admirava, na sua autobiografia Yo soy el Diego.  

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