Chama-se Ansumane, tem 22 anos e vem da Guiné-Bissau. Em idade de júnior saiu do seu país natal em busca de um sonho e melhores condições de vida para si e para os seus. Para trás ficam 39 pessoas que sustenta e de quem sente muita falta. Aos poucos o sonho de se tornar futebolista profissional vai-se tornando realidade, mas as coisas nem sempre foram fáceis.

O relato da infância na Guiné é de uma realidade dura. «No meu caso, por exemplo, ia para a escola sem comer, ia treinar sem comer, jogávamos com bolas improvisadas, com o que havia, mas essa é a nossa realidade, é pobreza mesmo, mas por causa dela não podes desistir e tens de lutar», disse o jogador, numa reportagem da agência Lusa que vai a Freamunde e Bissau e conta a sua história.

E foi isso mesmo que o guineense fez. Depois do futebol de rua esteve no Benfica de Bissau e posteriormente, aos 15 anos, chegou ao Sporting local, que seria a sua porta de entrada para Portugal. Mesmo não querendo deixar a família, partiu em busca de um sonho e melhores condições de vida. Esteve três meses na academia do Sporting, passando depois pelo Candal, onde rapidamente atingiu a equipa principal. Seguiu-se Nogueirense, Ribeirão e agora Freamunde, do Campeonato Nacional Senior, o primeiro escalão não profissional do futebol português.

«A vida obrigou-me a ser adulto antes da hora. Mesmo na Guiné, por causa do meu pai, que era doente, tinha que ajudar e trabalhava muito com o meu irmão em ferro, carpintaria o que aparecesse», disse Ansumane, que depois da morte do pai assumiu a responsabilidade dos que deixou para trás.

Hoje na família, entre eles, mãe, irmãos e sobrinhos são quase quatro dezenas as pessoas que Ansumane ajuda, enviando em média 200 euros por mês: «São 39 pessoas que estão na minha casa e a quem tenho de dar de comer. Consigo enviar dinheiro todos os meses e tenho obrigação de os ajudar, porque que eles precisam, porque não têm mesmo.»

«Precisamos muito do apoio dele e é por isso que pedimos a deus para o ajudar na carreira», conta em Bissau Mussá Seide, de 32 anos, um dos irmãos do jogador. Em casa da família o desejo é só um: que seja pelo menos como Bruma, médio luso-guineense que se transferiu recentemente do Sporting para o Galatasaray, onde irá auferir um salário anual de um milhão de euros.

Ser pelo menos tão bom como Bruma «é o que todos na família esperam», diz Mussá, para quem este é um pedido razoável, uma vez que nem «sequer» lhe pedem que seja como «o Cristiano Ronaldo ou o Messi».

Mussá já perdeu a conta do número de familiares que dependem do dinheiro de Ansumane, a quem já não veem há cerca de quatro anos. A sua mãe, Sona Fati, de 48 anos, é a pessoa de quem o jogador sente mais falta. É ela própria quem garante ter dado à luz um bom avançado para qualquer plantel.

E tal tem-se confirmado. Na primeira jornada do Campeonato Nacional de Seniores, Ansumane, que joga como avançado, apontou dois dos quatro golos da vitória do Freamunde frente ao Vila Flor, deixando os adeptos na expectativa em relação a este guineense que, depois de muito batalhar, a pouco vai conquistando o seu lugar no futebol português.