Ainda houve a chuva a forçar um último adiamento. Mas o que são mais 20 minutos para quem esperou 108 anos. Quando voltaram, os Chicago Cubs confirmaram mesmo a vitória na World Series, o título norte-americano de basebol. Aconteceu história em Cleveland na noite de quarta-feira, o fim da maior seca de sempre no desporto americano e da lenda de uma maldição que passou de gerações em gerações.

O momento da vitória no campo

E visto do Wrigley Field, em Chicago, onde milhares de fãs dos Cubs se juntaram

Esta seria sempre uma grande história. A final da MLB de 2016 colocava frente a frente os Chicago Cubs, que na primeira metade do século XX foram um dos clubes de referência da modalidade, campeões em 1907 e 1908, finalistas mais um punhado de vezes, mas que não chegavam à decisão desde 1945. O ano da maldição, mas já lá vamos.

Do outro os Cleveland Indians, também duas vezes campeões, a última em 1948, três vezes finalistas depois disso, há 68 anos à espera de festejar. Portanto, duas equipas que, juntas, somavam 176 anos a sonhar com isto.

A final foi de fazer desesperar os adeptos de ambos os lados. Os Indians venceram o Jogo 1 em Chicago, os Cubs ganharam o jogo seguinte. Seguiram-se duas vitórias seguidas de Cleveland, 3-1 e parecia estar arrumado, mas ao Jogo 5 os Cubs deram a volta. E ganharam o jogo 6, e portanto forçaram a decisão na negra, o Jogo 7.

Pelo meio, muita esperanças e muitos nervos, para quem passou toda a vida à espera disto. Sob o peso de uma superstição que persistia, no caso dos Cubs. A «maldição da cabra».

A história, um mito que por cá tem paralelo com o de Bella Guttmán e a «maldição» ao Benfica na Europa, vem de 1945. Conta que a 6 de outubro desse ano Billy Sianis, adepto dos Cubs e dono do bar «Billy Goat Tabern», foi a Wrigley Field assistir ao jogo 4 da final e levou a sua cabra de estimação, Murphy. Mas um funcionário do estádio disse que a cabra cheirava mal e não podia entrar. Indignado, Sianis terá lançado a frase (ou escrito ao presidente do clube, as versões divergem) que perseguiu os Cubs até ontem: «Os Cubs não vão voltar a ganhar a World Series.»

Billy Sianis ainda tentou «levantar» a sua própria maldição, antes de morrer. E mais tarde um sobrinho seu também se propôs tentar quebrá-la. Para isso levou inclusivamente cabras, descendentes de Murphy, até Wrigley Field, em momentos importantes para a equipa. Mas os Cubs não ganhavam e a lenda viveu.

Até esta noite. Agora os Cubs ganharam.

Há muita gente em festa. E uma história para cada um deles. Como o homem que viajou 900 quilómetros, da Carolina do Norte até Indiana, para ouvir o jogo 7 no cemitério, junto à campa do pai, porque tinham combinado assistir a este momento juntos. «Tínhamos um pacto.»

Adeptos anónimos, outros famosos. O mais famoso de todos o ator Bill Murray, adepto de sempre dos Cubs, que celebrou como merecia ser celebrado. Com champanhe, muito. «Tornámo-nos tão bons perdedores.»

Por falar em perdedores, o momento foi assinalado com fair play por alguns dos mais notórios rivais. Antes de mais Barack Obama, o ainda presidente dos Estados Unidos e adepto assumido dos White Sox, a outra equipa de Chicago.

Ou LeBron James, jogador dos Cleveland Cavaliers e adeptos dos Indians, que acabou a dar os parabéns aos vencedores.

Histórias sem fim, umas mais insólitas que outras. Ao longo do dia as redes sociais propagaram coisas como esta: em 1993, alguém escreveu no seu livro de curso que os Cubs iriam ganhar a World Series em 2016.

E nos anos 80 o filme Regresso ao futuro II também previu que isto acontecesse, mas falhou por um ano.

Agora, nada disto é ficção. Os Cubs são campeões, e são mais que isso. São, na verdade, uma equipa forte e com ambições, diz o seu treinador, aliviado pelo fim da história da maldição. «Não tem nada a ver com maldições, com superstição. Se querem acreditar nessas coisas, vai-vos retrair durante muito tempo», disse Joe Maddon na festa. «Adoro tradição. Acho que vale a pena ser mantida, mas maldições e superstições não. Portanto é ótimo para nós ultrapassar isso e continuar a olhar para a frente, porque agora temos oportunidade para sermos bons por muito tempo, e sem restrições, sem peso negativo.»

A capa da Sports Illustrated no dia seguinte à vitória dos Cubs é um resumo feliz desta história, num trocadilho entre a palavra Cabra e a sigla GOAT, Greatest of All Times.

Artigo atualizado