O afastamento das competições europeias provou que o Sporting vive hoje uma grande crise de valores: valores financeiros, antes de mais.

Mas não só.

Jorge Jesus disse no final do jogo, por exemplo, que o clube precisa de conquistar títulos em Portugal antes de partir para uma odisseia de afirmação internacional.

Ora não podia estar mais em desacordo.

Na verdade até podia concordar com a afirmação do treinador, se ela viesse virada do avesso: o clube precisa de se afirmar internacionalmente para conquistar títulos em Portugal.

Afirmar-se na Europa significa apostar na divulgação do nome do clube. Gerar mais simpatia, conquistar novos mercados, internacionalizar a marca. 

Mas significa mais do que isso: significa também que o Sporting consegue exibir os jogadores nas maiores montras do futebol europeu.

Em dimensões diferentes, naturalmente, Liga dos Campeões e Liga Europa não são iguais, mas quando a segunda chega aos jogos finais adquire um peso sério. Ter a equipa nos grandes jogos europeus valoriza os atletas, valoriza os clubes e valoriza a assinatura.

Conseguir uma afirmação europeia, portanto, significa no fundo somar dinheiro e acrescentar valor. Que é na verdade o primeiro passo para ser grande: tão grande como os maiores da Europa, no caso do Sporting.

Numa altura em que o fosso entre ricos e pobres é cada vez maior, torna-se precioso não descolar do pelotão da frente: torna-se precioso não descolar de Benfica e FC Porto.

Para isso é preciso dinheiro, e o dinheiro nestes novos tempos chega sobretudo de duas formas: prémios da UEFA e vendas de jogadores.

Ora tanto a primeira forma, como a segunda impõem uma afirmação internacional.

Basta olhar para o último ano.

A Seleção Nacional foi campeã europeia e adquiriu com isso um profundo capital de credibilidade. Curiosamente no onze titular havia quatro jogadores do Sporting, sendo que três deles construíam o coração da equipa: construíam o meio campo de Portugal.

Foi a partir daí que o mundo conseguiu olhar para Alvalade e ver mais do que o berço de jovens promessas. Conseguiu ver o repositório de craques de nível mundial.

Por isso os grandes clubes de Inglaterra e Itália gastaram fortunas para levar João Mário, claro, mas também Slimani, arrastado na corrente de confiança gerada em Alvalade.

A lista de grandes negócios feitos na sequência de boas campanhas europeias é extensa e podia seguir pelos rivais do Sporting. Mas não vale a pena ir por aí, tornava-se até cansativo. O essencial passa por sublinhar que os grandes portugueses precisam de dinheiro para construir grandes equipas e atingir os ambicionados títulos nacionais.

Caso contrário, é verdade, torna-se um caso levado ao extremo.

Ou seja, o Sporting até pode ser campeão esta época, investiu para isso, sem dúvida, mas dificilmente conseguirá mais do que fez em 2002: um título isolado e com uma enorme fatura, que o clube tem de pagar nos anos seguintes.

Para evitar que o caminho para o título nacional se torne um problema, é preciso começar por afirmar o clube internacionalmente, e na Europa em particular.

Por isso regressa-se ao início do texto, para dizer que o Sporting atravessa uma crise de valores. Valores financeiros, sim, mas também valores classificativos: as prioridades estão trocadas.

«Box-to-box» é um espaço de opinião de Sérgio Pereira, editor do Maisfutebol, que escreve aqui às sexta-feiras de quinze em quinze dias