CAMINHOS DE PORTUGAL é uma rubrica do Maisfutebol que visita passado e presente de clubes dos escalões não profissionais. Tantas vezes na sombra, este futebol em estado puro merecerá cada vez mais a nossa atenção.

ATLÉTICO CLUBE DE PORTUGAL: AF LISBOA

Para quem atravessa a Ponte 25 de Abril proveniente da Margem Sul é praticamente impossível não reparar no estádio que se ergue do lado de Alcântara: a mítica Tapadinha, casa do Atlético Clube de Portugal.

Fundado em 1942, fruto da fusão entre o Carcavelinhos Football Club e o Foot-ball Lisboa, o Atlético cedo se assumiu como um dos clubes míticos de Lisboa e do país. Logo em 1946 chegou à final da Taça de Portugal, depois de eliminar Benfica e FC Porto, mas perdeu no jogo decisivo da Prova Rainha ante o Sporting, por 4-2.

Histórico do nosso futebol, o emblema de Alcântara foi-se afastando da ribalta do desporto rei em Portugal – a última presença na I Liga remonta à época de 76/77 –, mas poucos se esqueceram da equipa da Tapadinha, que andou entre o Campeonato de Portugal e a II Liga.

Até que em 2017 aconteceu o impensável: depois de duas descidas consecutivas, da II Liga e do Campeonato de Portugal, a equipa da SAD do Atlético não conseguiu inscrever os jogadores e acabou desclassificada dos Distritais de Lisboa.

A paisagem do Estádio da Tapadinha (foto cedida pelo clube)

Perto do abismo, o clube apoiou-se na denominada equipa B, que passou a ser o ator principal da Tapadinha, e tenta agora renascer das cinzas; diga-se, com relativo sucesso, como conta ao Maisfutebol o presidente do Atlético.

Mas primeiro, Ricardo Delgado explica de forma muito resumida o que aconteceu.

«Houve algumas divergências entre a SAD e o clube, isso é recorrente em Portugal não afeta só o Atlético. Houve um não cumprimento do acordo que existia entre a SAD e o clube e isso criou um distanciamento entre as duas entidades», começa por referir o dirigente.

«Entretanto a SAD foi proibida de jogar na Tapadinha e posteriormente não conseguiu inscrever jogadores, teve duas faltas de comparência e acabou por ser eliminada automaticamente dos campeonatos da Associação de Futebol de Lisboa.»

Ora, agora, há apenas um Atlético, o clube: «Neste momento já não existe sequer uma SAD do Atlético, existe apenas uma equipa única do Atlético, e que nos permite ir até à primeira divisão se conseguirmos.»

Ricardo Delgado, presidente do Atlético CP (foto: facebook Atlético CP)

«O primeiro objetivo é meter o Atlético nos campeonatos nacionais»

Depois da bolha entre clube e SAD rebentar, o Atlético assentou na Tapadinha e, com a tranquilidade necessária, subiu à Divisão de Honra da AF de Lisboa e este ano está novamente lançado para mais uma subida, já que a equipa segue em primeiro no campeonato com uma almofada de conforto de sete pontos na zona de subida. O próximo passo é o Pro-Nacional, mas o Campeonato de Portugal fica logo ali e Ricardo Delgado assume-o.

«O objetivo é chegar ao Campeonato de Portugal na época 2020/21, esse é o grande objetivo. Em relação à II Liga eu sou um bocado mais pragmático, acho que primeiro o Atlético precisa de munir-se de massa humana, massa crítica, sócios, adeptos, para conseguir sustentar uma II Liga. Para mim não faz sentido um clube estar na segunda divisão mais importante de Portugal e ter 100 pessoas a assistir aos jogos, que era o que acontecia na altura do Atlético SAD», argumenta.

«O primeiro objetivo é meter o Atlético nos campeonatos nacionais, que é um lugar seu por direito, pela história, pelo palmarés, pelo que o clube representa em Portugal… depois disso as coisas têm de ser mais controladas, tem de haver outro tipo de massa humana para que as coisas resultem», defende.

«Nunca se esqueçam que vão fazer parte da história, o Atlético é um histórico»

O novo Atlético constrói-se também em cima de uma base jovem, já que a média do plantel alcantarense ronda apenas os 22 anos. E a juventude também é uma bandeira assumida por Delgado.

«Um dos grandes problemas financeiros do Atlético também era a aposta em jogadores mais velhos que ganhavam mais dinheiro. Neste momento queremos ter uma equipa jovem, que esteja pronta a ajudar e que queira ficar na história do clube, porque a verdade é que eles vão ficar na história do Atlético quando daqui a um ano subirmos ao Campeonato de Portugal.»

Foto cedida pelo clube

Apesar do grupo ser jovem, é escolhido a dedo: «É fácil aparecerem jogadores para jogar no Atlético, mas a verdade é que nós não queremos qualquer pessoa a jogar no clube. 90% do plantel estuda, está a acabar mestrados, licenciaturas, trabalha… só dois ou três é que não têm qualquer ocupação. Temos algum cuidado com isso, independentemente de tudo, somos o Atlético Clube de Portugal e eles [os jogadores] têm de viver isso.»

«O que eu lhes digo é: “nunca se esqueçam que vão fazer parte da história, o Atlético é um histórico”. Claramente que é mais atrativo vir para o Atlético, mas é o que eu disse há pouco: há muitos jogadores que se oferecem, mas não queremos qualquer jogador, temos um perfil definido, queremos pessoas que sintam o clube, queremos jogadores que estejam ali para fazer parte da história», frisa.

«Neste momento se calhar o objetivo não é só a subida, é ser campeão nacional»

Fábio Oliveira é o rosto mais visível dessa juventude. 25 anos, o médio deixou o Lourinhanense, que ficou às portas do Campeonato de Portugal na época passada e este ano está novamente na luta pelo acesso aos campeonatos nacionais, e desceu uma divisão para capitanear o Atlético, neste seu regresso à Tapadinha.

Porquê? Fábio explica.

«O projeto do Atlético sempre me interessou desde o início, mas também foi um bocado por causa de distância da minha casa, já ia para a Lourinhã há cerca de três anos e meio e agora estou mais perto. Mas o mais preponderante foi mesmo o meu gosto pelo Atlético, já tinha representado o clube [nos juniores], e pelo projeto, foi isso que me fez mudar», começa por revelar ao nosso jornal.

Capitão de equipa, Fábio Oliveira já sabe o que é festejar com as cores do Atlético, depois de se ter sagrado campeão nacional da 2.ª divisão de juniores pelo emblema da Tapadinha em 12/13. Agora, aponta a novas conquistas.

«Sim, sem dúvida que este ano é para subir, desde o início que isso é falado no balneário, foi essa a mensagem passada para o grupo, a equipa tem respondido bem, temos um grupo super humilde, que abraçou o projeto com tudo e está a correr bem.»

«Estamos em primeiro, neste momento se calhar o objetivo não é só a subida, é ser campeão nacional, mas pronto, uma coisa de cada vez, mas a subida vamos conseguir de certeza», garante.

«Agora quando jogamos na Tapadinha sentimos a exigência dos adeptos»

E como é liderar um grupo tão jovem? «Apesar de sermos jovens, é fácil. Caminhando para o mesmo lado é sempre mais fácil, às vezes um ou outro [jogador] não está tão focado no objetivo, não somos profissionais e há outras coisas na vida. Por vezes os mais velhos têm outras preocupações e não estão tão focados no objetivo, mas nós como somos jovens ainda temos a ambição de chegarmos mais longe e isso leva-nos a estar mais focados e unidos.»

Fábio Oliveira, capitão do Atlético CP (foto: facebook Atlético CP)

Como já foi referido, Fábio representa o Atlético pela segunda vez na carreira e depois de algumas passagens por outros clubes, assume que jogar no emblema de Alcântara é especial.

«Pessoalmente para mim representar o Atlético é diferente dos outros clubes, joguei no Atlético na formação, foram os dois anos mais felizes da minha vida, onde fui campeão nacional», diz.

«Na altura senti a mística do clube, mas não dos adeptos, mas agora quando jogamos na Tapadinha sentimos a exigência dos adeptos, jogar naquele estádio é sempre um prazer porque foi ali feita história, o Atlético é um clube histórico», atira.

Bem juntinho à Ponte 25 de Abril, o Atlético CP tenta reescrever a história com linhas de juventude e voltar às tardes de glória na mítica Tapadinha, que tanto fez sorrir os adeptos alcantarenses.