Próxima paragem, Salgueiros...

Quem pisa a calçada à saída da estação de metro depara-se com um portão, um barracão, uma bancada…um vazio.

Pisar aquelas pedras é pisar um pouco de passado, de história, não apenas da cidade do Porto mas também do futebol português.

O antigo Estádio Vidal Pinheiro ali permanece, totalmente desfigurado, como um jazigo que só traz recordações, amargas por sinal. Do antigo campo do Sport Comércio e Salgueiros só restam de facto as memórias e parte daquela que já foi a sua casa.

Mas, tal como a fénix que ostentavam nas camisolas, o futebol da instituição ressuscitou das cinzas.

Em 2008 renasceu, nos anos seguintes foi ensaiando os primeiros voos e agora quer voar novamente.

Na época passada falhou por muito pouco um lugar no playoff de subida à II Liga, contentando-se com a liderança na fase de manutenção.

De volta à estaca zero, o Sport Comércio e Salgueiros decidiu apostar num homem da casa para comandar o sonho. Rui Amorim tem apenas 39 anos mas carrega consigo a responsabilidade de recolocar o clube no topo.

Rui Amorim (terceiro a contar da esquerda) assumiu o comando da equipa no início da época

Para já, ao cabo de quatro jornadas, o Velho Salgueiral mantém-se invicto: quatro vitórias em quatro jogos na Série C do campeonato. Uma prestação quase perfeita, não fosse a eliminação prematura da Taça de Portugal.

«É verdade que até aqui as coisas têm corrido de forma positiva, estamos todos contentes mas ainda é cedo. Vamos defrontar bastantes dificuldades. Temos a missão de passar à fase de subida e depois, a partir daí, pensar em algo mais. Neste momento estamos focados apenas em chegar ao final da primeira fase num dos dois primeiros lugares, que dão acesso à fase de subida», começou por referir o treinador ao Maisfutebol.

No currículo, Rui Amorim soma já duas experiências de quase subida, uma no Mirandela, a última no Benfica de Castelo Branco. Faltou em ambas um último esforço, um último passo que agora procura dar no clube da sua cidade.

«O plantel sofreu uma grande remodelação. Só cinco elementos é que renovaram contrato, o resto é feito de jogadores estreantes. Ainda estamos numa fase de crescimento, à procura de estabilidade e organização»

«Está a ser um desafio desafiante (risos). Aqui posso estar em casa, com a minha família, na minha cidade. Isso é importante para a minha estabilidade emocional, isso e defender um clube pelo qual já passei enquanto jogador. Encontrei dirigentes sérios e dedicados» vincou, sublinhando contudo outro aspeto: «temos bastantes dificuldades no dia-a-dia».

«Pedimos ajuda e justiça, um pouco de dignidade»

Apesar de os resultados no campo refletirem um cenário bastante animador, fora de campo a conversa é outra.

«Não temos instalações próprias. Temos jogado no estádio da Maia, que é relvado, mas treinamos durante a semana num sintético. Agradecemos, obviamente, esta parceira com a Câmara da Maia, mas numa equipa profissional cuja ambição é lutar pelos primeiros lugares, não é de todo vantajoso jogar em relva e treinar em sintético», avisou.

O sonho de competir pelo topo complica-se a cada dia, motivo pelo qual Rui Amorim apela à ajuda das entidades competentes.

Gostava que a Câmara do Porto olhasse para este clube com carinho, porque é um clube que movimentou e continua a movimentar centenas de jovens. É um clube com história e as pessoas sentem um carinho especial em todo o país. Só precisamos de ajuda, que nos ajudem a ter um pouco mais de dignidade, e que se faça justiça. A cidade do Porto e mesmo o futebol nacional mereciam ter um Salgueiros de novo no mapa»

«Quem veste a camisola já sente a mística»

Rui Amorim recorda os tempos em que vestir a camisola dos Salgueiros dava comichão, mas não era do tecido. Chamavam-lhe peso, mas era na realidade algo maior, era mística.

Trocaram de nome (entretanto, já voltou a ser Sport Comércio e Salgueiros), de emblema, até de estatutos, mas mantiveram a mesma mística, a tal que se fazia sentir nos grandes palcos que pisaram.

«Só quem passou pelo Salgueiros consegue perceber a tal mística que tanto se fala. Com tantas transformações que o clube tem sofrido nos últimos anos, a tendência era essa mística perder-se. Mas tantos os dirigentes como os adeptos não deixam que isso se quebre. Eles acompanham-nos para todo o lado, são cada vez mais, e isso é um motivo de orgulho», afirmou.

E não há como escapar, nem mesmo com a revolução levada a cabo esta época.

Desde o primeiro dia que fazemos questão de transmitir isso aos novos elementos. Posso dizer com toda a certeza: quem veste esta camisola ou representa o clube já sente esta mística de um clube que é bairrista, mas também um dos mais apaixonantes do Porto e do futebol português»

O velho que é o novo, só mudou no papel. O Salgueiros quer voar novamente, reescrever uma história que ficou por contar.