«Se um presidente despede um treinador que nomeou, também ele devia sair», Brian Clough, treinador inglês bicampeão europeu pelo Nottingham Forest

Brian Clough durou 44 dias no Leeds United, quando chegou ao clube de Yorkshire em 1974. Bem menos do que os 111 de Paulo César Gusmão à frente do Marítimo, em 2016, por exemplo.

O treinador brasileiro foi o primeiro a deixar um clube da Liga e entre aquele 19 de setembro em que foi despedido e esta quarta-feira, em que o Sp. Braga dispensou os serviços de José Peseiro, houve mais sete colegas a rescindirem com emblemas do campeonato principal: num intervalo de 87 dias, foram despedidos oito técnicos, tantos como em toda a temporada passada!

Com a entrada na jornada 14 da Liga, alguém novo vai estar no banco do Sp. Braga em Alvalade e vai haver uma estreia no Estoril-Benfica. Aliás, como curiosidade, das oito vezes em que «estalou o chicote», em três o jogo seguinte para o campeonato foi, precisamente, com o tricampeão (Belenenses, Moreirense e agora Estoril).

Os resultados são sempre o lado pelo qual os técnicos são avaliados. Mas como sublinha o presidente da Associação Nacional de Treinadores de Futebol ao Maisfutebol, «se houvesse 18 Mourinhos na Liga, dois desciam de divisão».

Caso a caso

O Maisfutebol fez o levantamento dos dados para perceber o que esteve na génese da decisão das direções. A ANTF também tem opinião sobre as razões, mas se os resultados são, normalmente, o argumento, vamos a eles.

Marítimo

PC Gusmão saiu à 5ª jornada. Era 17º classificado, com um triunfo e quatro derrotas na Liga. A gota de água surgiu no dérbi com o Nacional. Perdeu e saiu. O Marítimo estava melhor na época passada, mas não muito. À 5ª ronda era 15º e tinha cinco pontos. Gusmão saiu com três. Refira-se que o Marítimo foi uma das oito equipas que na época passada também trocou de técnico.

Belenenses

Outra equipa que na época passada mudou de treinador, de Sá Pinto para Júlio Velazquez. Agora, o espanhol saiu na jornada 7, no oitavo lugar. Duas vitórias, três empates e duas derrotas valiam nove pontos ao clube do Restelo. À sétima ronda na época passada, o Belenenses era 13º e tinha menos pontos do que esta época. Ou seja, Velazquez é um dos treinadores que tinha melhorado o registo anterior.

Boavista

No Bessa houve outra vez um treinador a sair como em 2015/16. Erwin Sanchez deixou o clube após um encontro de Taça da Liga (derrota com o Belenenses) e ainda que as justificações estivessem para lá dos resultados, cá ficam os números do boliviano nesta temporada: 12º lugar à jornada 7 (2v,2e e 3d) e oito pontos; na época passada, o Boavista tinha a mesma pontuação e era 11º. Seguiu-se Miguel Leal, que conseguiu um triunfo no campeonato (mais dois empates e três derrotas).

Rio Ave

A maior diferença pontual homóloga. Capucho saiu no 12º lugar, com 11 pontos em 10 partidas de Liga. Na época anterior, o Rio Ave tinha 18 pontos e era quinto na tabela. Com Capucho, a equipa foi também eliminada na Taça de Portugal, na primeira eliminatória que disputou, depois de ter sido semifinalista em 2015/16.

Moreirense

Pepa durou dez encontros, que resultaram em duas vitórias, dois empates e cinco derrotas. Saiu no 16º posto. Na época passada, o Moreirense manteve Miguel Leal até ao fim e na jornada 10 era 15º. Pepa tinha um ponto a mais que o antecessor, mas saiu quando estava um lugar abaixo. O Moreirense cnaiu da Taça de Portugal com o Vizela, ao primeiro jogo, tal como na época anterior.

P. Ferreira

Tal como o Rio Ave, o Paços tem uma diferença pontual de sete, em relação à época passada. Carlos Pinto saiu com 11 jogos e o 15º lugar. Fez 10 pontos. Jorge Simão tinha 17 quando estava na Mata Real e era sexto. Ainda com Carlos Pinto, caiu em Vila Franca de Xira, ao segundo jogo disputado na Taça de Portugal. Em 2015/16 saíra na mesma etapa, mas eliminado por um clube de I Liga: o Rio Ave.

Estoril

Desde que voltou à Liga, é a segunda vez que o Estoril troca de treinador a meio da época. Fabiano Soares saiu com 13 rondas, no 11º posto e com 15 pontos. Por esta altura, na temporada passada o Estoril tinha 16 pontos e ocupava a mesma posição.

Sp. Braga

Paulo Fonseca tinha ganho a Taça de Portugal, José Peseiro saiu depois de ter sido eliminado na prova. Uma diferença substancial. Na Liga Europa, o clube chegou aos quartos de final em 2015/16 e esta temporada não passou a fase de grupos. No campeonato melhorou. O 4º lugar é o mesmo, mas Peseiro fez 26 pontos e Fonseca 24. A distância para os três grandes diminuiu também consideravelmente. Na época passada era de 11 para o líder e de quatro pontos para o terceiro. Esta época é de um ponto para o terceiro, dois para o segundo e seis para o líder.

O perfil do despedido

Com os dados em cima da mesa, o presidente da ANTF, José Pereira, tem algumas ideias sobre porque é que os despedimentos na Liga aumentaram. Uma das que regista tem a ver com este facto: os quatro técnicos estrangeiros já saíram, os três que se estrearam na Liga também.

«Atrevo-me a dizer que a explicação é a habitual, a falta de bom senso de quem está a dirigir o nosso futebol», declarou José Pereira ao Maisfutebol.

«Provavelmente, quem dirige não teve em consideração, nas escolhas que fez, relativamente àquilo que pretendia para o clube, quais eram as suas ambições», continuou o presidente da ANTF.

O dirigente apontou «ao perfil do treinador» pelo qual se optou nalguns casos: «O grande número dos despedimentos situa-se numa faixa de treinadores que não são nacionais, que desconhecem o nosso futebol, e outros com pouca experiência. Não podem ser julgados.»

Numa era em que a informação corre facilmente, José Pereira considerou também que tal facto não é suficiente para ser acertar na escolha técnica.

«Direi que é preciso algum talento, para que percebamos o que é o treinador, que jogadores vai treinar, o tipo de equipa. Tem de ser uma análise feita com algum cuidado. Alguns treinadores aqui e acolá não têm o enquadramento que as pessoas pretendem.»

O dinheiro pode ser outra razão. Os novos acordos de TV trouxeram algum fundo de maneio e José Pereira apontou que «a fartura, nestas situações, não tem sido bem aproveitada».

O dirigente acrescentou: «Muitas vezes nem ajuda. As pessoas não têm cuidado, gostam de esbanjar nestas situações.»

Um dos principais problemas é a falta de estabilidade. «Temos de entender que um treinador tem de a ter para trabalhar, como qualquer profissional. Já sabe que não tem tanta como outros, mas tem de ter a suficiente», realçou.

De resto, o presidente da ANTF argumentou que é preciso mudar um pouco a mentalidade vigente e não fazer o «chicote estalar» do nada.

«Aconteça o que acontecer, há sempre duas equipas que vão descer de divisão. Costumo dizer que se houvesse 18 Mourinhos a treinar na Liga, dois desciam de divisão.»

José Pereira concluiu que «não têm sido ponderadas todas as situações» na avaliação do trabalho dos técnicos.