O FC Porto tem uma palavra a dizer na luta pelo título 2015/16. Não aquela que, certamente, estaria nos planos da equipa no início da temporada, mas, ainda assim, uma palavra. Este sábado, a equipa de José Peseiro recebe o Sporting. Já está afasta do título, já sabe que não irá além do terceiro lugar. Mas o resultado do Clássico do Dragão pode dizer algo sobre o que será este campeonato. 

Um triunfo portista, sobretudo se o Benfica bater o V. Guimarães já esta sexta-feira, deixa o título praticamente entregue aos encarnados que, assim, chegariam ao tricampeonato. Mesmo o empate deixa os leões longe de um troféu que escapa desde 2002. Portanto, ao Sporting só a vitória interessa. 

Aos portistas resta defender o escudo e o orgulho azul e branco. Como noutras vezes. Não muitas, contudo. Aliás, nos últimos 40 anos, esta será apenas a segunda vez em que o calendário associado a uma má temporada obriga a intervir na luta pelo título do lado de fora. 

A última foi em 2010, ano em que Jorge Jesus chegou ao Benfica. Nesse ano, o FC Porto de Jesualdo Ferreira defendeu o orgulho e adiou a festa encarnada. Agora, como será? Tirará, de vez, a esperança aos leões?

O Maisfutebol reuniu outros casos em que o FC Porto se viu, indiretamente, envolvido numa disputa pelo título, para tentar responder a uma dúvida: quando isso acontece, os dragões são figurantes ou protagonistas?

Época 1936/37: Belenenses queria ajuda, FC Porto foi goleado

A primeira vez em que o FC Porto surge indiretamente numa batalha pelo título aconteceu na temporada 1936/37, a terceira edição de sempre da Liga de Portugal. A disputa foi até à última jornada, entre dois clubes de Lisboa: Benfica e Belenenses.

Na penúltima jornada, os de Belém venceram o Benfica em casa por 1-0 e encurtaram a diferença para um ponto, apenas. Era necessário um tropeção encarnado na derradeira ronda. Aí, o adversário do Benfica era o FC Porto, que vencera o primeiro campeonato de sempre e perdera o segundo, precisamente, para os encarnados.

Ora, os dragões já sabiam que não iriam além do quarto lugar, atrás ainda do Sporting, depois de uma época desoladora, com tantas derrotas como vitórias (6) e ainda com os mesmos golos marcados e sofridos (31).

Mas a esperança do Belenenses, onde pontificavam Mariano Amaro e Artur Quaresma, tio-avô de Ricardo Quaresma, estava totalmente depositada nos portistas. O Belenenses fez a sua parte e goleou o V. Setúbal por 5-0. Mas do Benfica-FC Porto as notícias não ajudaram à festa azul: outra goleada, ainda mais expressiva, por 6-0.

Na primeira vez em que se viu envolvido na luta de outros por um título nacional, o FC Porto não conseguiu ser mais do que figurante.

VEREDITO: FIGURANTE

FICHA DE JOGO

Benfica: Tavares, Vieira, Gustavo, Raul Baptista, Albino, Gaspar Pinto, Domingos Lopes, Rogério, Espírito Santo, Xavier e Valadas. Treinador: Lipo Herczkza

FC Porto: Romão, Ernesto, Vianinha, Carlos Pereira, Nova, Francisco Ferreira, Lopes Carneiro, Reboredo, António Santos, Gomes da Costa e Carlos Nunes. Treinador: François Gutkas

Golos: Ernesto Santos, pb (1’); Valadas (25’); Espírito Santo (26’); Xavier; Rogério (84’) e Nova, pb (88’)

Espírito Santo, figura do Benfica dos anos 30

Época 1945/46: agora sim o Belenenses festeja, passando na Constituição

Nove anos depois de não ter ajudado a dar o primeiro título ao Belenenses, o FC Porto viu-se envolvido em mais uma reta final com disputa entre Benfica e o emblema do Restelo. Desta feita, pela primeira e única vez na história, foram os homens da Cruz de Cristo a sorrir no final.

Num campeonato com 12 equipas e 22 jornadas, o Benfica, líder do campeonato com um ponto a mais do que o Belenenses, deslocou-se ao campo do rival na ronda 19 e um golo de Manuel Andrade inverteu a lógica que vigorava até então: o Belenenses era líder a três jornadas do fim.

Na semana seguinte, residia aquela que era vista como a mais difícil tarefa dos azuis de Belém: passar o FC Porto, que seria sexto nesse ano, no Campo da Constituição. Mas um golo de Artur Quaresma já perto do intervalo, deu nova vitória ao Belenenses e manteve tudo na mesma. E foi assim até ao final: os dois candidatos venceram os dois jogos que faltavam e o Belenenses ganhou o campeonato.

VEREDITO: FIGURANTE

FICHA DE JOGO

FC Porto: Barrigana, Alfredo Pais, Guilhar, Romão, Pocas, Freitas, Joaquim Machado, Camilo, Araújo, Lourenço e Correia Dias. Treinador: Joseph Szabo

Belenenses: Capela, Serafim Neves, Feliciano, Vasco Oliveira, Mariano Amaro, Francisco Gomes, Armando, José Pedro, Rafael Correia, Artur Quaresma e Manuel Andrade. Treinador: Augusto Silva

Golo: Artur Quaresma (41’)

Joseph Szabo, treinador do FC Porto, não evitou o título do Belenenses

Época 1951/52: sem força para o Benfica, mas Sporting leva o título

Num dos campeonatos mais disputados de sempre, a quatro jornadas do fim, os três grandes estão na frente com 33 pontos, depois de o Sporting bater o Benfica em casa por 3-2. E o Belenenses é quarto classificado com apenas menos um ponto do que o trio que lidera.

Na ronda seguinte, Benfica e FC Porto empatam fora, respetivamente com Estoril e Académica, e o Sporting isola-se. Novas igualdades com Sp. Covilhã e Atlético tiram o FC Poto de Passarin da corrida e, na última jornada, há um ponto a separar o líder Sporting do perseguidor Benfica.

Ora, essa última jornada incluía, precisamente, um Benfica-FC Porto pelo que, aos leões, bastava uma ajuda portista no Estádio Nacional, palco do jogo, para festejar o título, independentemente do que fizessem no Barreiro, frente à equipa local.

A ajuda não veio, porém. Num jogo arbitrado por um tal de Inocêncio Calabote que entraria na história sete anos mais tarde por um polémico Benfica-CUF, os encarnados venceram por 2-0, com bis de Águas na segunda parte, e o Sporting teve mesmo de fazer a sua parte para ser campeão. Ganhou 2-1 ao Barreirense, num resultado feito, por completo, na primeira meia hora do jogo. Sagrou-se assim bicampeão, a caminho do primeiro tetracampeonato do futebol português

VEREDITO: FIGURANTE

FICHA DE JOGO

Benfica: Bastos, Artur Santos, Joaquim Fernandes, Moreira, Félix Antunes, Francisco Ferreira, Batalha, Arsénio, José Águas, Rosário e Rogério Pipi. Treinador: Ted Smith

FC Porto: Barrigana, Virgílio, Carvalho, Joaquim, Alfredo, Pinto Vieira, Vital, Monteiro da Costa, Hernâni, Quim e José Maria. Treinador: Luis Casas Passarin

Golos: José Águas (52’ e 65’)

José Águas bisou contra o FC Porto mas o Sporting foi campeão

Época 1960/61: festa encarnada só longe das Antas

O Benfica dominou por completo esta temporada, mas o Sporting tinha ainda, a cinco rondas do fim, de receber o rival. Porém, perdeu com o Barreirense na ronda anterior o que tirou picante do dérbi de Lisboa, que terminaria 1-1.

Feitas as contas, à entrada para as últimas quatro jornadas, a diferença era de cinco pontos. Numa altura em que o confronto direto ainda não era o primeiro fator de desempate, na jornada 24, a antepenúltima, há um FC Porto-Benfica, em que um triunfo encarnado valeria o título.

O FC Porto esteve até a perder por 2-0, com bis de Mendes aos 22 minutos, mas puxou dos galões e deu a volta ao jogo, numa reviravolta consumada por Hernâni, depois de bis de Noé.

Na semana seguinte, dada a vantagem larga, o Benfica foi campeão. Mas não nas Antas.

VEREDITO: PROTAGONISTA

FICHA DE JOGO

FC Porto: Acúrsio, Virgílio, Arcanjo, Barbosa, Ivan, Paula, Carlos Duarte, Hernâni, Noé, Perdigão e Teixeira. Treinador: Francisco Reboredo

Benfica: Costa Pereira, Serra, Artur Santos, Sidónio, Saraiva, Cruz, Moreira, Jorge, Mendes, Peres e Inácio. Treinador: Bela Guttmann

Golos: Mendes (12’ e 22’); Noé (32’ e 50’) e Hernâni (75’)

Época 1967/68: Benfica volta a falhar título em casa do FC Porto

Em mais uma temporada disputada ao sprint por Benfica e Sporting, o FC Porto voltou a ver de fora a luta, embora tenha tido, novamente, um papel importante na reta final do campeonato.

Na antepenúltima ronda, o Benfica venceu o Sporting por 1-0, com golo de Eusébio, e saltou para a liderança do campeonato, com mais um ponto do que o rival de Lisboa. Na ronda seguinte, a penúltima, os encarnados jogavam nas Antas e o Sporting recebia o V. Setúbal, quarto classificado, atrás do FC Porto.

Para ser campeão, o Benfica precisava vencer os portistas e esperar por um deslize leonino, que até aconteceu. Os sadinos foram a Alvalade ganhar 1-0.

Mas o FC Porto de José Maria Pedroto adiou a festa do Benfica ao empatar 1-1 com o rival, num jogo que teve ambos os golos na reta final. Marcou Djalma (conhece a figura?) para os portistas e Eusébio para o Benfica, que foi campeão, sim, mas só na última jornada.

VEREDITO: PROTAGONISTA

FICHA DE JOGO

FC Porto: Américo, Bernardo da Velha, Valdemar, Sucena, Atraca, Pavão, Vítor Gomes, Jaime, Custódio Pinto, Djalma e Nóbrega. Treinador: José Maria Pedroto

Benfica: José Henrique, Adolfo, Humberto Coelho, Raul, Cruz, Jacinto, Coluna, José Augusto, Torres, Eusébio e Simões. Treinador: Otto Gloria

Golos: Djalma (84’) e Eusébio (86’)

Djalma, figura peculiar do FC Porto

Época 1970/71: uma rasteira ao Sporting e título voa para a Luz

Este é o cenário mais parecido com o atual. Na antepenúltima jornada da temporada 1970/71, o Sporting foi jogar às Antas envolvido na luta pelo título com o Benfica, ao passo que o FC Porto jogava pela honra.

Na altura, o Sporting era campeão em título e entrava nessa reta final em igualdade pontual com o Benfica, pelo que qualquer deslize poderia ser fatal. Aconteceu no Porto.

A equipa comanda por António Teixeira tombou o Sporting (2-1) e, assim, entregou o título ao Benfica, que não vacilou, venceu todos os jogos que lhe faltavam e terminou a temporada com mais três pontos do que o Sporting.

VEREDITO: PROTAGONISTA

FICHA DE JOGO

FC Porto: Armando, Gualter, Manhiça, Rolando, Valdemar, Pavão, Custódio Pinto (Manuel Duarte, 73’), Bené, Joaquinzinho, Abel e Nóbrega (Ricardo, 73’). Treinador: António Teixeira

Sporting: Damas, Caló, José Carlos, Tomé (Pedro Gomes, 45’), Hilário, Nelson, Marinho (Manaca, 74’), Peres, Chico, Lourenço e Dinis. Treinador: Fernando Vaz

Golos: Joaquinzinho (41’), Abel (75’) e Dinis (82’)

O FC Porto dos anos 70

Época 2009/10: com menos um mas com raça de dragão

Depois de um longo interregno, provocado não só pelo calendário mas, sobretudo, pela presença cada vez mais assídua nas discussões dos campeonatos, o FC Porto volta a ser envolvido indiretamente na luta pelo título nacional no final da primeira década do século XXI.

Já afastado do segundo pentacampeonato da sua história, o FC Porto tinha ainda hipóteses matemáticas de chegar ao segundo lugar que valia apuramento para a Liga dos Campeões e estava na posse do Sp. Braga. Mas, para isso, precisava que os bracarenses não vencessem o Paços de Ferreira. Contudo, se isso acontecesse, o Benfica faria a festa do título no Dragão, fosse qual fosse o resultado.

Portanto, para evitar algo que nunca tinha acontecido (festa encarnada em casa do FC Porto), a equipa de Jesualdo Ferreira tinha de «abdicar» do segundo lugar, torcendo por um triunfo bracarense. Ao mesmo tempo tinha de fazer a sua parte e evitar que o Benfica pontuasse: um empate bastava para dar o título às águias.

Num jogo elétrico, o Benfica chegou a ter o título na mão quando Luisão anulou o golo inaugural de Bruno Alves e fez o empate a um na segunda metade. Mas o FC Porto, que jogava com menos um jogador desde o minuto 50, por expulsão de Fucile, fez da honra coragem, partiu para cima do Benfica e ganhou o jogo, com golos de Farías e Fernando Belluschi. A festa encarnada só se fez na jornada seguinte.

Desse duelo, há seis anos, para o que sábado se vai jogar no Dragão, há apenas duas peças que se mantêm, mas noutras posições: Maxi Pereira, que foi titular no Benfica e deve ser, agora, no FC Porto; e…Jorge Jesus, agora treinador do Sporting.

VEREDITO: PROTAGONISTA

FICHA DE JOGO

FC Porto: Beto, Fucile, Bruno Alves, Rolando, Álvaro Pereira, Fernando, Raul Meireles (Miguel Lopes, 53’), Fredy Guarín, Fernando Belluschi (Tomás Costa, 92’), Farías (Cristian Rodríguez, 61’) e Hulk. Treinador: Jesualdo Ferreira

Benfica: Quim, Maxi Pereira, Luisão, David Luiz, Fábio Coentrão, Javi Garcia (Aimar, 63’), Ramires, Carlos Martins (Alan Kardec, 75’), Di María, Cardozo e Saviola (Weldon, 66’). Treinador: Jorge Jesus

Golos: Bruno Alves (42’), Luisão (56’), Farías (59’) e Belluschi (82’)