Clemente é um daqueles jogadores-sombra que abundam na II Liga. Goleador nato, fez da Taça de Portugal uma espécie de refúgio para mostrar que pode fazer estragos diante de qualquer adversário, mesmo de escalão superior. Até os atuais bicampeões nacionais já sofreram um golo do açoriano.
«Ao Beira Mar, Académica, Olhanense, ao F.C. Porto, no Jamor, pelo Desp. Chaves, e agora ao Rio Ave», enumera, orgulhoso, ainda na ressaca da eliminação dos vila-condenses. «Tenho sido feliz e, como é a única oportunidade que tenho para jogar com equipas da Liga, não me faço rogado», afiança ao Maisfutebol.
No clube, até já há quem queira obrigar o treinador a fazê-lo jogar sempre, mas Vítor Oliveira tem aqui uma bela dor de cabeça: então e o que fazer com Joeano, simplesmente o melhor marcador da II Liga? «Os meus colegas, na brincadeira, dizem que entramos logo a ganhar na Taça, porque eu marco sempre», graceja.
Recorde a proeza de Clemente e colegas frente ao Rio Ave.
Aos 29 anos, o «artilheiro» continua a alimentar o sonho que o levou a deixar São Miguel há sete anos. «Não perco a esperança. Se não me vierem buscar esta época, espero que o Arouca suba. Acredito no meu valor e sei que tenho condições. Há quem venha da Liga e depois não jogue na II, mas eu jogo», atira.
«Este ano vai ser fundamental para mim. Se não for para a I Divisão, devo enveredar pelo estrangeiro. Já tive propostas do Chipre, por exemplo, mas tenho andado a adiar. Agora, com esta idade, terei de tomar uma decisão», assevera, sem se deter nas críticas a quem tema em ignorar o pedigree do avançado português:
«Somos bons, temos qualidade, falta apenas quem tenha coragem de apostar em nós. No estrangeiro, quem vem de fora, tem de provar, tem de fazer a diferença. Aqui não. Todo o estrangeiro chega logo rotulado de craque, mas depois vai-se embora e nem demos por ele.»
Bordéus e o adeus súbito a um amigo
Nos Açores, Clemente jogou no Operário, onde se cruzou com aquele que viria a tornar-se no seu ídolo de sempre: Pauleta. «Eu jogava nas camadas jovens e ele nos seniores. Já se destacava bastante e manteve-se sempre humilde. Foi de quem eu mais gostei no futebol», desvenda, não escondendo uma certa identificação:
«Tivemos um percurso parecido, claro que o dele foi muito mais importante. Mas viemos do mesmo sítio, viemos do nada, saiu-nos tudo do corpo. Eu nunca tive ninguém para me ajudar, empresários ou algo do género. Só os treinadores. O que consegui foi tudo fruto do meu trabalho.»
As coincidências com o antigo internacional português não se ficaram por aqui. Quando estava no último ano de júnior, por exemplo, foi parar a Bordéus. «O Pauleta também lá estava e eu fui treinar à experiência. Assinei por três épocas, mas, depois, houve uma confusão com o empresário que nunca percebi», conta.
Acabou por voltar aos Açores sem jogar pelos girondinos. Nesta aventura teve a companhia de Fábio Pires, um amigo que faleceu recentemente num caso semelhante ao de Miki Fehér. «Jogámos muito anos juntos. A vida é assim, às vezes prega-nos umas partidas», recorda, com pesar.