A ’Euro 2016 Network’ reúne órgãos de comunicação social de vários pontos da Europa para lhe apresentar a melhor informação sobre as 24 seleções que vão disputar o Europeu de França. O Maisfutebol representa Portugal nesta iniciativa do prestigiado jornal Guardian. Leia os perfis completos das seleções que participarão no torneio:

Textos por Aleksandar Holiga

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«Análise tática e questões chave»

Quase todos no onze ideal da Croácia são bem conhecidos, mas a propensão do selecionador para alternar extensivamente de uma estratégia para outra oferece pouca garantia de que ele sabe o que está a fazer.

Ante Cacic herdou do seu antecessor, Niko Kovac, a formação 4-2-3-1 e o 4-4-2 em losango como plano B. No entanto, Cacic tem disposto um 4-4-2 clássico, bem como como o 3-5-2. Com o início do torneio a aproximar-se, ainda temos muito poucas ideias de qual será a sua primeira escolha.

A coisa sensata a fazer seria construir uma equipa em torno dos craques de classe mundial do Real Madrid, Luka Modric, e do Barcelona, Ivan Rakitic, dando a estes dois certas liberdades, mas Cacic não tem um médio de contenção genuíno para fornecer o equilíbrio defensivo e uma rede de segurança para aqueles.

Marcelo Brozović (do Inter) – um médio dinâmico box-to-box com os pulmões de aço, mas não um típico recuperador de bolas agressivo – deve ser utilizado para complementá-los se o selecionador optar por um triângulo no meio. Isso significará um papel mais avançado para Modric, que é conhecido por organizar o jogo desde os limites da grade área da Croácia, mas também o banco de suplentes para o companheiro de equipa no Real Madrid, Mateo Kovacic.

O guarda-redes do Monaco Danijel Subasic é intocável na baliza. Uma linha de três defesas à sua frente não faria muito sentido dado o pessoal existente, embora isso não signifique necessariamente que Cacic não vai experimentá-lo – presumindo que não, Vedran Ćorluka (Lokomotiv Moscovo) e Domagoj Vida (Dínamo Kiev) devem fazer a dupla inicial de centrais, especialmente depois Cacic se ter desentendido com Dejan Lovren e tê-lo deixado do Euro.

Daqueles dois, Corluka é melhor e mais técnico, enquanto Vida é mais agressivo e dinâmico. O capitão, Darijo Srna, do Shakhtar Donetsk, está definido para iniciar na direita, apesar de que Sime Vrsaljko (do Sassuolo) seria uma escolha melhor. Ivan Strinic não joga muito pelo Nápoles, mas é o único lateral esquerdo de raiz na equipa.

Se o selecionador optar pelo 4-2-3-1, Ivan Perisic (do Inter) e Marko Pjaca (do Dínamo Zagreb) são titulares certos à direita e à esquerda, respetivamente. O primeiro tem sido o melhor jogador da Croácia desde o Mundial 2014, enquanto o último é uma nova força: ambos são rápidos, habilidosos e podem fazer a diferença em situações de um para um.

Na frente, o mouro de trabalho da Juventus Mario Mandzukic ainda é a primeira escolha, apesar de ter marcado apenas um dos 20 golos da Croácia na qualificação e apesar de o seu estilo não ser assim tão apropriado ao resto da equipa. As alternativas são Nikola Kalinić (da Fiorentina) e Andrej Kramaric (do Leicester City), que passou a segunda metade da última temporada emprestado ao Hoffenheim.

Se, porventura, Cacic decidir pelo 4-4-2 ou mesmo pelo 3-5-2, as mudanças que fará são uma incógnita para qualquer um.

Onze provável (4-2-3-1): Subasic; Srna, Corluka, Vida e Vrsaljko; Modric e Brozovic; Perisic, Rakitic e Pjaca; Mandzukic.

Que jogador vai surpreender no Euro 2016?

Marko Pjaca. Como o único provável titular ainda a jogar na liga croata, o extremo do Dínamo Zagreb, de 21 anos, é um jogador desconhecido para a maioria dos adeptos de futebol. Esta deve ser a sua revelação na cena internacional antes de vê-lo a mostrar o que vale num dos grandes clubes europeus. Direto, rápido e forte, ele é tudo o que se quer de um ala moderno e está carregado de confiança para provar isso.

Que jogador poderá ser uma deceção?

Aos 34 anos, o capitão próximo da reforma Darijo Srna não é o jogador que era, quando cavalgava pela lateral direita como se não houvesse amanhã e ainda conseguia fechar brechas na defesa. Ele já não faz qualquer delas bem e manteve o estatuto de titular apenas devido à reputação. As debilidades crescentes de Srna irão ficar expostas em< França.

Até que ponto chegará a Croácia e porquê?

Estou muito pessimista e temo que os «Vatreni» («Labaredas») podem não passar a fase de grupos, o que seria um desastre para uma equipa com tanto talento individual. O selecionador pode estar fora de pé e tem feito muito pouco até agora para provar o contrário. Ele também não parece ter a confiança dos jogadores, por isso as coisas podem ficar feias se perdermos o jogo de abertura contra a Turquia.

«Segredos por detrás dos jogadores»

Entre as muitas tatuagens de Mario Mandzukic, há uma na parte inferior das costas atrai uma atenção especial. Era suposto ler-se «O que nos mata torna-nos mais fortes» - uma paráfrase popular da citação de Friedrich Nietzsche – escrito em hebraico, por algum motivo peculiar. Mas não é o que diz. Talvez o tatuador tenha usado o «Google Translate» porque a tradução literal de seu trabalho seria: «Se não é para me matar, vai fazer-me mais forte». Mas isso não é tudo – para tornar as coisas ainda mais hilariantes, a mensagem é escrita da esquerda para a direita (e não ao contrário, que é como o hebraico é escrito).Por isso, o que realmente diz é «Regnorts em ekam lliw ti, em llik ot ton s'ti fi ".

Os pais geralmente querem certificar-se de que os seus filhos futebolista adquirem educação no caso de não chegarem a profissionais, mas o pai de Marcelo Brozović não foi nada disso. Talhante de profissão, ele aconselhou o filho a abandonar a escola, porque «o futebol e a escola não combinam». Na época, Marcelo tinha 16 anos vindo da formação do Hrvatski Dragovoljac, um clube da segunda divisão croata. Felizmente, para ele correu bem. Antes da sua transferência para o estrangeiro, do Dínamo Zagreb para o Inter de Milão, também foi revelado que ele se recrutou Nives Celzijus – uma cantora pop e socialite conhecida por usar a sua sexualidade para promover a sua personagem de palco (a versão croata para Katie Price) –como treinadora da sua vida pessoal.

No início deste ano, as imagens de vídeo de alguns miúdos a mudarem manualmente os dígitos de um grande marcador improvisado, feito de madeira, tornou-se viral. Talvez acabe por não ser tão invulgar se se souber que o referido painel de avaliação pertencia ao Radnik Bijeljina, que compete na primeira divisão da Bósnia e Herzegovina. Depois de ter visto o vídeo, Ivan Rakitic decidiu ajudar. «Falámos ao telefone e ele disse Rapazes, eu vou comprar-vos um novo marcador. Tão simples como isto», disse o presidente do Radnik, Mladen Krstajić, um antigo internacional sérvio companheiro de equipa de Rakitic nos seus dias Schalke. Rakitic manteve a promessa e em breve um novo placar digital de marca foi entregue e instalado em Bijeljina.

Na década de 1980, o selecionador da Croácia, Ante Cacic, trabalhava a reparar televisões e aparelhos de rádio. Ele era dono de uma pequena loja no centro de Zagreb. Recentemente, um jornalista perguntou-lhe se agora poderia reparar uma televisão moderna, de ecrã plano. «Eu não saberia por onde começar, para ser honesto», respondeu Cacic. Os cínicos diriam que também é verdadeiro para o seu trabalho atual.

No final de 2014, Darijo Srna comprou 20 toneladas de tangerinas das plantações perto de sua cidade natal de Metkovic. Ele pagou para serem serem enviadas para escolas de ensino básico na região devastada pela guerra de Donbass, onde mais de 23.000 crianças as receberam juntamente com cartões postais especiais com as suas fotografias. Srna, que é o capitão da Croácia e do Shakhtar Donetsk, é muito humanitário e tem muitas vezes ajudado de várias maneiras crianças carentes.

Enquanto estava no Tottenham, Vedran Ćorluka ofereceu um relógio no valor de 36 libras (quase 47 mil euros) a um empregado de restaurante que nunca tinha visto antes. O defesa estava a jantar em Mayfair com alguns amigos e o empregado elogiou o seu Hublot com diamantes incrustados. Corluka tirou-o e disse ao homem para lhe dar o seu Seiko em troca – e ele assim o fez. Que gorjeta.

A figura Ivan Perisic

Quando Ivan Perisic estava a crescer, os amigos costumavam chamar-lhe «Koka» («Galinha») porque ele costumava ajudar na quinta seu pai nos arredores da sua cidade natal de Omis, na costa croata. Ele não se importava com o apelido que, felizmente, não o seguiu Split, onde ele jogava nas equipas de base do Hajduk – o clube que os Perisic, assim como praticamente todos na sua comunidade local, orgulhosamente apoiam.

E foi o negócio da família a definir o rumo para a carreira de Ivan desde cedo – embora só o fôssemos descobrir anos mais tarde.

Este verão marca uma década desde que deixou o Hajduk Split, sem ter feito um jogo oficial no clube pelo qual tinha sonhado jogar desde miúdo. «Quando ficar no banco eu estou a morrer», disse uma vez Perisic. Não jogar sempre sempre foi sentido como um castigo, mas ele teve que aprender as formas do profissionalismo da maneira mais difícil e foi preciso algum crescimento mental para se tornar o jogador que é agora.

Nesse verão de 2006, os jornais falavam de um jovem de cabelos encaracolados que impressionou o treinador do Hajduk, Zoran Vulic, durante o estágio de pré-temporada na Eslovénia. Eles discutiam se ele seria um substituto para a maior estrela da equipa, Niko Kranjcar, ou se podia jogar a titular ao lado dele.

Houve também relatos sobre vários clubes europeus que estavam a segui-lo, mas isso era normal para qualquer grande talento no momento e ninguém pensou muito nisso. O que as notícias não mencionaram foi que Perisic ainda estava para assinar o seu primeiro contrato profissional.

Então, um desses pretendentes, o Sochaux, enviou um jato particular para a Eslovénia e levou Perisic. No Hajduk não estavam dispostos a deixá-lo ir, mas ele recusou-se a assinar um contrato com e já se tinha mudado para França com a mãe e a irmã. No final, os dois clubes chegaram a acordo e o Hajduk recebeu 360 mil euros pelo jovem de 17 anos de idade. Foi menos do que receberam neste verão a partir do «fundo de solidariedade» quando Perisic foi do Wolfsburgo para o Inter num negócio de 20 milhões de euros.

Foi há apenas dois anos, no rescaldo do maravilhoso golo à Gareth Bale aos Camarões no Mundial (Ivan correu a partir da linha de meio campo com a bola antes de fazer golo), que o seu pai, Ante Perisic, fez uma revelação. Foi tudo culpa dele, contou - ele se deparou com dificuldades financeiras e o negócio de frangos estava à beira da falência. Ele precisava muito do dinheiro e então disse ao filho para aceitar a oferta e para o resto da família ir com ele. Entretanto, ele ficou e tentou salvar o negócio.

«Sair para o Sochaux era o melhor para a família no momento», confessou Ante Perisic numa entrevista para o jornal «Slobodna Dalmacija»: «Eu queria que eles se afastassem de mim e do meu sofrimento.»

Mas Ivan também não jogou pelo Sochaux. Em três temporadas só atuou pela equipa B e foi emprestado ao Roeselare, uma modesta equipa belga, no inverno de 2009. No verão seguinte, mudou-se para o Club Brugge e, em 2011, foi distinguido como melhor marcador e jogador do ano da Jupiler League. Foi então que também se estreou pela Croácia com Slaven Bilic. «Se for necessário, vou recolher as bolas perdidas durante os treinos só para ter a oportunidade de jogar com Luka Modric e Niko Kranjcar», disse Perisic.

Foi para o Borussia Dortmund, onde teve alguns desempenhos realmente memoráveis e marcou alguns grandes golos, mas também se desentendeu com Jürgen Klopp, especialmente depois de Marco Reus ter regressado. Perisic queixou à imprensa-se por não jogar com frequência e o treinador respondeu: «Choradeiras públicas pertencem ao jardim de infância não ao mundo dos adultos. Se não jogar, um profissional de futebol fecha a boca, trabalha duro e faz o treinador escolhê-lo – não se queixa aos jornalistas.»

Talvez Klopp estivesse certo, porque, depois de ter sido vendido para o Wolfsburgo em 2013 – e, dois anos mais tarde, para o Inter – já não se ouve Perisic queixar-se do que quer que seja. Mas, também, ele começou a jogar muito regularmente e tornou-se o membro mais confiável da equipa nacional croata – antes, tinha sido criticado por falta de agressividade ou esforço para defender. Mas desde o Mundial 2014 que tem sido constantemente o seu melhor jogador. O seu papel será crucial para as chances da Croácia em França.

Dez anos depois de sua fuga da quinta de galinhas, Perisic regressa a França, onde a sua dura educação no profissionalismo começou. Ele não pode guardar memórias particularmente agradáveis desse tempo, mas ele já não é o rufia de cabelos encaracolados que saiu daquele jato: este Perisic 2.0 é algo mais sério e muito mais mortal.