É o que dizemos quando estamos perante uma daqueles problemas complicados de resolver: o difícil é saber como começar.

Deixemo-nos do politicamente correto.

A época do FC Porto é miserável, em cima de duas outras temporadas miseráveis.

Não ganha nada há três anos, podia ser pior?

Neste período acabou com a máxima popular – exagerada sim, mas com alguma ponta de verdade – qualquer treinador no FC Porto é campeão, que simbolizava a força que a estrutura tinha perante as rivais. Era o clube mais profissional de todos, beneficiava de um certo amadorismo na Luz e em Alvalade, e qualquer técnico ganhava com essa vantagem.

O declínio não virá de há três anos, mas sim talvez já do pós-Villas-Boas, quando Vítor Pereira conseguiu apanhar o Benfica de Jorge Jesus duas vezes isolado na frente e disfarçou em campo algo que já era notório: o apagar de referências no plantel, e que contribuiria também para o atual estado da nação portista.

Não há modelo que dure para sempre. E, sobretudo, todos precisam de adaptar-se. Hoje, as estruturas dos rivais são completamente diferentes, sobretudo a do Benfica, cada vez mais competente.

A fé que os adeptos portistas mantêm em Pinto da Costa e na sua estrutura é muito resistente, mas terá tido já este ano sofrido as primeiras brechas.

A responsabilidade, mais do que dos treinadores que não conseguiu fazer com que tivessem sucesso – Paulo Fonseca, Luís Castro, Julen Lopetegui e José Peseiro – é, para mim é bem claro, da estrutura.

Mas, voltemos à pergunta: por onde começar?

José Peseiro teria condições para continuar depois de ganhar a Taça? Desconfio que poucas. Agora, terá zero. No entanto, já achava isso de Lopetegui e o espanhol continuou. Mesmo aquelas que parecem serem decisões lógicas, sendo que poderiam eventualmente implicar o quebrar de compromissos assumidos anteriormente, não são linearmente seguidas pela SAD portista. Com mais uma época de custos.

A escolha de José Peseiro, que já de si foi estranha, falhou. Fez ainda pior que Lopetegui e nem a final que teve para conquistar ganhou. A saída parece inevitável.

Depois, olha-se para o plantel e há quase tudo por fazer. Provavelmente, obrigará a uma grande necessidade de investimento.

Helton comprometeu no Jamor, e aproximar-se-á o regresso ao Brasil e o final de carreira. Casillas, que salvou alguns pontos mas esteve longe de ser San Iker à exceção do jogo da Luz, já disse que fica. Há José Sá e também Gudiño, que não teve um final de temporada feliz no União.

A defesa, nesta altura, resume-se a dois laterais de qualidade, que são Maxi Pereira e Layún. Foram eles os principais desequilibradores da equipa e isso é dizer quase tudo. Chidozie, a julgar pela amostra, terá muitas dificuldades para afirmar-se como central numa equipa que lute pelos primeiros lugares, Indi e Marcano acumularam erros a mais. O nível de exigência do FC Porto terá de ser sempre mais alto do que o atual. Ou seja, há todo um setor para reconstruir.

No meio-campo, estarão as referências que restam, criadas um pouco à-pressão esta temporada. André André e Danilo, no seu primeiro ano de Dragão, terão a próxima equipa construída à sua volta, com o apoio dos miúdos Rúben Neves e Sérgio Oliveira. Herrera, que nunca foi o Herrera do Mundial, estará no limbo. Numa equipa consolidada poderá funcionar, mas a próxima talvez exija mais do mexicano do que ele tenha para dar. As lesões não têm ajudado Evandro e Bueno também passou ao lado do Dragão. Voltarão Josué para ajudar, e Otavinho para acrescentar criatividade, de acordo com Pinto da Costa.

Brahimi, que seria a grande referência ofensiva da equipa, está muito longe do que mostrou na primeira metade da época de estreia. Corona entrou forte e foi-se apagando. Marega não existiu. Suk apenas resistiu mais um pouco que o ex-Marítimo. Varela tem 31 anos e já não apresenta a explosão de antes. Aboubakar, que desbloqueou jogos complicados no início e é esforçado, dificilmente voltará a ser opção inicial.

Há, sobretudo, André Silva, que chegou tarde de mais do que merecia ao 11, e que agora finalmente parece ganhar confiança para ser o 9 de futuro. O pivot que a equipa precisa. Se não o traírem, no defeso.

Zé Manel, do Boavista, virá a caminho, com um grande ponto de interrogação sobre si.

O FC Porto tem muito pela frente para evitar uma quarta temporada no deserto. Vai ser preciso dinheiro para rescindir e contratar. Vai ser preciso escolher criteriosamente e, se possível, recuperar referências.

Os dragões precisam bem mais do Maregas e Suks – que têm obviamente qualidade, mas precisariam de um contexto diferente ou mesmo de uma equipa diferente, mais consolidada, que ajudasse a mostrá-la – para se levantarem outra vez.

O mais difícil, repito, é saber por onde começar.

LUÍS MATEUS é subdiretor do Maisfutebol e pode segui-lo no TWITTER. Além do espaço «Sobe e Desce», é ainda responsável pelas crónicas «Era Capaz de Viver na Bombonera» e «Não crucifiquem mais o Barbosa» e pela rubrica «Anatomia de um Jogo».