Brasil e Portugal estreitaram laços desportivos nas últimas décadas, com o fluxo migratório a conduzir bons talentos do futebol «canarinho» para o nosso país. A selecção lusa foi orientada por Otto Gloria e Luiz Felipe Scolari, recebeu jogadores naturalizados como Deco ou Pepe, mas o intercâmbio fez-se nos dois sentidos: o Maisfutebol conta-lhe a história de um português que, nos anos 40, orientou a selecção do Brasil!


Jorge Gomes de Lima nasceu em Lisboa, em 1904, mas fez toda a carreira do outro lado do Atlântico. Joreca, como era conhecido no mundo do futebol, está nos almanaques do São Paulo como um treinador de sucesso, fruto de três campeonatos paulistas conquistados na década de 40. Foi técnico, funcionário da Federação paulista, jornalista, árbitro e até «boxeur», com duas vitórias em igual número de combates. Registo imaculado, portanto.


Joreca, bem falante, grande contador de histórias e adepto incontornável de bons charutos cubanos, chegou a fazer parte de uma comissão técnica que, em 1944, orientou a selecção do Brasil em dois jogos frente ao Uruguai. O português levara o São Paulo à conquista do título, no ano anterior, e juntou-se ao carioca Flávio Costa no banco da «canarinha». A 14 de Maio, o Brasil venceu por 6-1, no Rio de Janeiro. Três dias depois, novo desaire uruguaio (4-1), desta vez em São Paulo. Flávio Costa garantiu a exclusividade do cargo após esse duplo confronto, orientando a selecção até o Mundial de 1950. Também passou pelo F.C. Porto, por duas vezes.


Brilho de Leônidas e cabeça de Baltazar


Jorge Gomes de Lima era conhecido como o «português» nos corredores do São Paulo. Como árbitro, esteve na estreia de Lêonidas da Silva pelo clube. O avançado, proclamado como inventor da «bicicleta», foi pago a peso de ouro em 1942, levando os adeptos da equipa ao delírio. No ano seguinte, face aos maus resultados no arranque do campeonato, o «português» foi convidado a treinar o São Paulo.


Joreca comandou o «Mais querido» durante 166 jogos, vencendo mais de uma centena. Conquistou o Campeonato Paulista em 1943, 1945 e 1946. «O primeiro campeonato do Joreca ficou conhecido como o título da moeda em pé. Palmeiras e Corinthians diziam que iam decidir o título lançando a moeda ao ar. Se caísse de pé, era para o São Paulo. E foi mesmo. Dos textos que li, o Joreca foi uma personagem interessante e importante na década de 40, o primeiro treinador campeão com o Leónidas. Mas não sei o resto da história», explica Renato de Santis, enciclopédia viva do São Paulo, em breve conversa com o Maisfutebol.


Vicente Feola, treinador campeão do Mundo pelo Brasil em 1958, chegou a colaborar com o português Joreca e foi o sucessor deste no final do seu percurso no São Paulo. Seguir-se-ia o Corinthians, durante um único ano, em 1949. Joreca foi o primeiro treinador de Baltazar e ajudou a criar a figura de «cabecinha de ouro», obrigando o avançado a melhorar o jogo aéreo. Baltazar marcou 71 golos de cabeça, foi o segundo maior goleador da história do clube, enquanto o português faleceu no final desse ano, vítima de um ataque cardíaco. Já deixara a sua marca.