DESTINO: 80's é uma rubrica do Maisfutebol: recupera personagens e memórias dessa década marcante do futebol. Viagens carregadas de nostalgia e saudosismo, sempre com bom humor e imagens inesquecíveis. DESTINO: 80's.

MANGONGA: P. Ferreira (1988/89); Gil Vicente (1989 a 1995); Tirsense (1995/96); Beira-Mar (1996 a 1998); Ac. Viseu (1998/99);

Makpoloka Mangonga. Bem, deixemo-nos de formalismos. Mangonga, como vai caro Mangonga?

«Vivo e trabalho em St. Denis, perto de Paris. Não quero nada com o futebol. Estou na área da construção civil e especializei-me na montagem de estruturas em ferro».

Aos 46 anos, quase 20 depois de fazer o último jogo na I Liga, Mangonga continua igual. Vertical nas respostas, mortífero na gargalhada, humilde no comportamento. É mesmo o inesquecível avançado que encheu o velhinho Adelino Ribeiro Novo, em Barcelos, entre 1989 e 1995.

Nunca foi o melhor marcador do campeonato, nunca jogou nas provas europeias, jamais vestiu a camisola dos maiores clubes portugueses e, porém, todos os amantes do futebol nas décadas de 80 e 90 guardam de Mangonga as melhores recordações. E ele sabe.

«Eu era bom. E era honesto, nunca tive maldade no meu jogo. Aliás, no meu tempo do Gil Vicente, melhor do que eu só o Drulovic», diz ao Maisfutebol, num português perfeito, a partir de França.

MANGONGA: «Matei o Benfica sem saber bem como»

Pensar em Mangonga é pensar nos primeiros passos do Gil Vicente no escalão máximo. É pensar nas bancadas cheias do Adelino Ribeiro Novo – nome de um guarda-redes que levou uma bolada na barriga e morreu -, na familiaridade entre povo e atletas.

«A minha família vive em Barcelos e não é por acaso. Quero que os meus filhos cresçam na cidade que eu mais amo e não nos subúrbios de Paris».

Números de Mangonga em Portugal

. 1988/89 (P. Ferreira, II Liga): 23 jogos/4 golos
. 1989/90 (Gil Vicente, II Liga): 28 jogos/5 golos
. 1990/91 (Gil Vicente): 34 jogos/5 golos (13º lugar)
. 1991/92 (Gil Vicente): 33 jogos/5 golos (13º lugar)
. 1992/93 (Gil Vicente): 14 jogos/3 golos (9º lugar)
. 1993/94 (Gil Vicente): 26 jogos/7 golos (12º lugar)
. 1994/95 (Gil Vicente): 25 jogos/7 golos (13º lugar)
. 1995/96 (Tirsense): 17 jogos/2 golos (18º lugar)
. 1996/97 (Beira-Mar, II Liga): 31 jogos/6 golos
. 1997/98 (Beira-Mar, II Liga): 25 jogos/2 golos
. 1998/99 (Ac. Viseu, II B): 29 jogos/6 golos

Mangonga larga Kinshasa e desembarca na Bélgica em 1986. Problemas burocráticos inviabilizam a inscrição e ruma a França. É lá que começa a dar nas vistas.

«Joguei no Biziers, da III Divisão. O Bordéus e o Montpellier quiseram-me contratar e acabei em Portugal. Porquê? Confusões atrás de confusões, empresários atrás de empresários, é complicado explicar»
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O veloz atacante acaba por representar o Paços Ferreira, mas só depois de passar por testes no Sp. Braga e no Varzim.

«No final da época, o Rodolfo Reis levou-me a treinar ao FC Porto. Estive lá um mês, fiquei doido com o que vi o Madjer a fazer com a bola, mas o Rodolfo acabou por ser convidado para treinador do Gil Vicente e levou-me com ele».
 

Gil Vicente, 1990/91: Mangonga é o primeiro da direita, em baixo

Começa aí, no verão de 1989, uma relação de seis anos.

«Era feliz, falava com os adeptos, jogava à bola com os miúdos num jardim da cidade. Mas ganhei pouco dinheiro», atira Mangonga, antes de mais uma gargalhada gutural. E convites para sair?

«A direção pedia sempre quantias impensáveis por mim. Eu via outros a sair, bem piores do que eu, e eu continuava no Gil. Atenção, aprendi a amar o clube, mas no início tinha o sonho de chegar a um grande. Eu não era o Maradona, mas fazia os meus golinhos [32 em seis anos]».

Um desses golos deu uma vitória sobre o Sporting. Adelino Ribeiro Novo, lembram-se? Pequeno, sufocante, encravado entre uma serralharia, um cemitério, uma fábrica têxtil e duas casas. Agora, imaginem este cenário num dia de chuva, muita chuva.

«Começámos a perder [golo de Fernando Gomes] e demos a volta [Folha e Mangonga]. Aquilo era só raça (mais risos). Curiosamente, eu nem devia ter sido titular, porque o mister Rodolfo dizia que nos jogos com chuva eu só entrava quando os adversários estivessem cansados. Para dar cabo deles com os meus piques».    

O golo de Mangonga ao Sporting (1m30s):


 

E terá sido esse o melhor jogo de Mangonga no Gil Vicente?

«Nem pensar. O melhor foi o jogo da subida à I Liga, na Póvoa. Nunca fui tão feliz num campo de futebol como nessa tarde».

Mangonga gosta de conversar e deixa ideias soltas, as perguntas são desnecessárias. Recorda «a melhor dupla de centrais» formada por Valdir e Zé Carlos, confessa as muitas saudades de Rui Filipe e N´Kongolo, ambos falecidos na flor da idade – N´Kongolo nunca jogou no Gil, mas era amigo próximo – e elogia a tática «única e infalível» de Rodolfo Reis.

«Era sempre igual, não havia mais nenhuma: Folha na esquerda, eu na direita, o meio-campo recebia a bola e lançava em profundidade, para o espaço vazio. Eu - ou o Folha – sprintava e cruzava para a área. E no Adelino ganhávamos quase sempre».

No Gil Vicente, Mangonga foi treinado por Rodolfo Reis, Vitor Oliveira e António Oliveira. E faz questão de deixar ao nosso jornal elogios a todos eles.

«O Rodolfo foi o técnico mais justo que apanhei na vida. Dizia sempre o que pensava, olhos nos olhos. Tinha caráter e passava isso à equipa. Alguns não gostavam dele, eu adorava. Não me esqueço uma frase que repetiu vezes sem conta: ‘faz a tua parte e jogas para a semana outra vez’».

«Nunca me esquecerei que o Vitor Oliveira me deu a oportunidade de jogar no Paços e depois no Gil. Deu-me muitas lições táticas, falava imenso comigo. É um senhor, um cavalheiro».

«O António Oliveira formou a equipa mais competitiva que tive no Gil Vicente. Com ele jogávamos bom futebol, bola no pé e ataque. Conhecia toda a gente no futebol, era incrível»
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