DESTINO: 90's é uma rubrica do Maisfutebol: recupera personagens e memórias dessa década marcante do futebol. Viagens carregadas de nostalgia e saudosismo, sempre com bom humor e imagens inesquecíveis. DESTINO: 90's.

ION TIMOFTE: FC Porto (1991 a 1994) e Boavista (1994 a 2000)

Este é um DESTINO: 90s muito especial. Pelo convidado, naturalmente, mas sobretudo por celebrar a recordação de uma das mais entusiasmantes seleções dos últimos 30 anos: a Roménia do Campeonato do Mundo de 1994.

O Maradona dos Cárpatos, Gheorghe Hagi, era o general de um pelotão de talento explosivo. Na baliza, o enorme Bogdan Stelea, atrás do pequeno Dan Petrescu e do xerife Gheorghe Popescu. Homens de uma fiabilidade comovente.

Do meio-campo para a frente, só craques. Munteanu, Galca, o inesquecível Dumitrescu, até Raducioiu ou o nosso bem conhecido Nica Panduru, também já convidado nestes DESTINOS.

Neste elenco, porém, faltava o pé esquerdo de Ion Timofte. Tinha de faltar. Depois de ter estado na maioria dos jogos da fase de qualificação, Timofte foi riscado por Angel Iordanescu da convocatória final. Isto após uma época brilhante no FC Porto, com 32 jogos oficiais e 9 golos.

24 anos depois da «maior desilusão» da carreira, Ion Timofte atende o Maisfutebol em Timisoara, fala da «melhor Roménia de sempre» e recorda a «maravilhosa década de 90» no futebol português.

Um romeno genial, mas sem lugar no Mundial de 94. Um DESTINO: 90s especial.

Não se esqueça de ler a Parte 2: «O Jaime Pacheco tinha 50 anos e corria mais do que eu»

Maisfutebol – A Roménia volta a falhar um Campeonato do Mundo. Nestas alturas é obrigatório lembrar aquela equipa do Mundial de 1994.
Ion Timofte – Um Mundial onde eu devia ter estado. Merecia ter estado.

MF – Tinha lugar naquela lista de 22?
IT – Claramente. Mas vamos com calma. Tenho de ser honesto e dizer que a Roménia tinha uma grandíssima equipa. Todos os convocados tinham uma qualidade tremenda. Não digo que seria titular indiscutível, mas vinha de três temporadas de muito bom nível no FC Porto [87 jogos, 36 golos] e merecia indiscutivelmente pelo menos estar nos convocados. Fiquei uma semana muito aborrecido, admito, mas não valia a pena chorar. E decidi vibrar com a minha Roménia, por fora.

MF – E vibrou até aqueles inesquecíveis quartos-de-final contra a Suécia?
IT – Não perdi um jogo. Viciei-me naquela equipa. E só caímos nos penáltis. A Roménia era muito forte. Lembro-me que a minha ausência levantou uma enorme onda de polémica no meu país. Eu e o Craioveanu, que nessa época foi o melhor marcador da liga romena, ficámos de fora quando ninguém esperava. Não sei se se recordam dele, depois jogou na Real Sociedad. O que lá vai, lá vai (risos).

MF – Havia algum pé esquerdo melhor do que o do Timofte nessa Roménia?
IT – Eu acho que não. Nem o do Hagi (risos). Atenção, ele foi um fora de série a todos os níveis, era mais completo do que eu, mas o pé esquerdo… ficava com o meu.

MF – O selecionador Iordanescu deu-lhe alguma explicação para deixá-lo de fora?
IT – Não. Apenas soube que não ia ao Mundial quando a lista de convocados foi tornada pública. E aceitei, que remédio. Não tive problemas com o senhor Iordanescu. Aliás, depois do Mundial ainda fui chamado para três mais jogos e acho que só não fui ao Euro96 porque parti a perna num Boavista-Campomaiorense, poucos meses antes. A minha carreira internacional morreu aí.

MF – E a Roménia só disputou mais um Mundial. Em 1998, na França.
IT – É verdade, andamos há 20 anos a ver outros países nos Mundiais. Há muitos problemas na Roménia. Os clubes não investem na formação. A exceção é a academia de futebol do Hagi. O dinheiro não abunda na Roménia, não há uma estratégia clara, não há bons campos de treino, os estádios são quase todos antigos, os treinadores estão genericamente mal preparados… De vez em quando há um ou outro bom talento, mas nos últimos seis/sete anos o jogador romeno deixou de interessar aos clubes das melhores ligas europeias.

ION TIMOFTE NO CAMPEONATO PORTUGUÊS:

. 1991/92. FC Porto, 25 jogos/9 golos (1º lugar)
. 1992/93. FC Porto, 23 jogos/11 golos (1º lugar)
. 1993/94. FC Porto, 21 jogos/4 golos (2º lugar)
. 1994/95. Boavista, 24 jogos/4 golos (10º lugar)
. 1995/96. Boavista. 24 jogos/7 golos (4º lugar)
. 1996/97. Boavista, 19 jogos/1 golo (7º lugar)
. 1997/98. Boavista, 31 jogos/10 golos (6º lugar)
. 1998/99. Boavista, 32 jogos/15 golos (2º lugar)
. 1999/00. Boavista, 16 jogos/0 golos (4º lugar)

TOTAL: 215 jogos/61 golos
TÍTULOS: 2 Campeonatos Nacionais, 2 Taças de Portugal e 3 Supertaças.

MF – O jogador romeno era muito elogiado pela capacidade técnica. Esse ADN desapareceu?
IT – A habilidade existe, há muito futebol de rua na Roménia, mas isso não basta. Depois falta caráter, ambição, profissionalismo.

MF – Há algum jogador romeno atual que o entusiasme?
IT – Não, nada que se pareça. Não posso dizer ‘está aqui um novo Hagi’ porque não existe.

MF – Sem a Roménia no Mundial, o Timofte vai gritar por Portugal?
IT – Portugal sim, claro, mas eu quero acima de tudo é ver futebol de ataque e muitos golos. E aposto nos favoritos do costume: Brasil, Alemanha e Espanha à frente de todas as outras. É um bocado como na Liga dos Campeões. Há o Real Madrid, Barcelona e o Bayern Munique, e depois um grupo de cinco/seis candidatos mais atrás. No Mundial esses candidatos de segunda linha são Portugal, Argentina, Bélgica, França…

MF – Na seleção de Portugal há algum jogador que agrade ao Timofte?
IT – O Ronaldo não conta, claro (risos). Adoro o Bernardo Silva e começo a gostar muito do Bruno Fernandes. Amadureceu bastante e tem capacidade para jogar num dos grandes do futebol europeu. Sempre gostei dele. Ah, e gosto do Manuel Fernandes. Merecia mais atenção na seleção ao longo dos anos.

MF – Falemos do FC Porto. Como é que o Timofte chega ao clube em 1991?
IT – Por empréstimo (risos). Aliás, no FC Porto joguei sempre emprestado pelo Poli Timisoara. Eu não era muito conhecido, o Porto não quis arriscar um investimento definitivo e o Timisoara preferiu esperar sempre pelo Mundial 1994 para fazer dinheiro comigo. O meu contrato acabou e eu não fui ao Mundial.

MF – O que conhecia de Portugal ao chegar nesse verão de 91?
IT – Pouco, muito pouco. Na época anterior tinha jogado contra o Sporting e levei sete em Alvalade. Não fiquei com boa imagem de Portugal (risos). Na Taça UEFA, se não me engano. Depois ganhámos 2-0 na Roménia. Esse Sporting era muito forte. Ivkovic, Luisinho, Balakov, Figo, Gomes. Grande equipa.

MF – O Timofte fez três anos muito bons no FC Porto e saiu para o Boavista. Foi dispensado pelo senhor Bobby Robson?
IT – A época no FC Porto acabou, eu fui de férias e havia negociações para eu continuar nas Antas. Esperei uns dias e disseram-me que as coisas estavam ‘emperradas’. Adorei trabalhar com o Bobby Robson, tive muita estima por ele. Mas, pronto, a verdade é que o negócio não foi fechado e ainda hoje não sei porquê. Só sei que o senhor Robson me disse que estava farto de esperar por mim e ia avançar para outras contratações. É nessa altura que eu saio e entram o Walter Paz e o Mogrovejo, dois argentinos que nunca jogaram no Porto.

MF – Mas como é que um titular do FC Porto acaba por ir diretamente para o Boavista?
IT – Sei que a esta distância parece estranho. Eu tinha estatísticas ótimas no FC Porto e podia ter ido se calhar para um clube maior. O Boavista era um bom clube, mas de dimensão mais pequena. Gostei de estar no FC Porto e gostei muito de estar no Boavista. Não é à toa que voltei recentemente ao Bessa para ajudar seis meses o clube.

MF – Ora explique-nos em detalhe essa opção pelo Boavista.
IT – É fácil. Acabou a época no FC Porto e voltei à Roménia, convencido de que ia voltar às Antas. As semanas passaram e percebi que isso não ia acontecer, por isso voltei ao Porto para ir buscar as minhas roupas, as malas todas. Já me estava a preparar para jogar num clube em França. Entretanto, por coincidência, o meu melhor amigo fora do futebol cruzou-se com o treinador Manuel José e disse-lhe que eu ia sair do FC Porto. E que era um jogador livre (risos).

MF – O Manuel José já não o largou.
IT – Meia-hora depois, o major Valentim telefonou-me e marcou uma reunião comigo. Numa vivenda no Mindelo. Estava lá ele, o João Loureiro e o engenheiro Sebastião Fernandes. Cheguei, o major quase não me deixou falar, chegámos facilmente a acordo, tirei uma foto e assinei pelo Boavista. Simples, não? No fundo, o Boavista teve mais vontade do que o FC Porto em ter-me.

MF – E ficou seis anos no Bessa.
IT – Gostei muito da abordagem do major e adorei jogar no Boavista. Eu não conheço ninguém que não goste de viver em Portugal. A não ser alguns portugueses (risos).

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