DESTINO: 90's é uma rubrica do Maisfutebol: recupera personagens e memórias dessa década marcante do futebol. Viagens carregadas de nostalgia e saudosismo, sempre com bom humor e imagens inesquecíveis. DESTINO: 90's.

SCOTT MINTO: Benfica (1997 a 1999)

O British Benfica tem prazo de validade limitado. 97-99, duas épocas de muitas promessas e ainda mais insucessos. Na primeira, ainda antes do treinador Graeme Souness, chegam Scott Minto e Brian Deane.

Na segunda, a colónia britânica descontrola-se. Não há mecanismos de controlo populacional, aterram na Luz mais cinco nomes. Ora anote: Gary Charles, Steve Harkness, Michael Thomas, Mark Pembridge e Dean Saunders.

Parte II: «Souness disse-me: 'ataca, vai para cima do lateral do Sporting'»

Minto, Scott, é um lateral esquerdo com boa escola. Chega do Chelsea, gosta de atacar, tem 26 anos e sabe o que faz em campo. Fica um ano e meio no Benfica mas, se fosse hoje, era rapaz para envelhecer em Cascais.

«O problema é que na altura eu não era casado. Chegava do treino à uma e pouco, aquecia o almoço no micro-ondas e passava o resto do dia sozinho em casa. No início é bom, mas depois um tipo farta-se.»

Scott Minto atende o Maisfutebol com a simpatia de quem está bem na vida. Casado com uma colombiana, pai de três filhos (dois gémeos), comentador da Sky Sports. Vive em Kent, a uma hora de Londres, e continua «apaixonado pelo Benfica».

Em 45 jogos oficiais, Minto deixa «a pele em campo», mas troféus… nem vê-los. Então, de onde vem esse amor eterno pelo «gigante adormecido no manicómio»? Scott tem bons argumentos para a sua causa.

«Fui escolhido pelo senhor Toni no verão de 1997. Jogava no Chelsea e o Newcastle, do Kenny Dalglish, andava atrás de mim. Depois surgiu o West Ham e hesitei. Quando o Toni me desafiou para o Benfica não pensei duas vezes. Lembrei-me do Eusébio e de um clube… gigante.»

Manuel José é o treinador – duraria pouco tempo – e Scott Minto agarra o lado esquerdo da defesa. «Fui o primeiro inglês a vestir a camisola sagrada do Benfica. É um orgulho poder dizê-lo aos meus filhos.»

SCOTT MINTO NA LIGA PORTUGUESA

. 1997/98. Benfica, 21 jogos/0 golos (2º lugar)

. 1998/99: Benfica, 10 jogos/0 golos (3º lugar)

TOTAL: 45 jogos oficiais/0 golos

TÍTULOS: nada a registar em Portugal

Benfica 97/98:
Pringle, Ronaldo, P. Madeira, N. Gomes, PreudHomme e M. Thomas (cima)
Calado, Poborsky, Scott Minto, Pembridge e Sousa (baixo)

No primeiro treino, Scott Minto entra no relvado e não quer acreditar. «Estavam cinco mil adeptos! Cinco mil! E nos jogos em casa cheguei a ver 80 mil pessoas. Não há muitos clubes do mundo assim.»

Minto conhece dois presidentes. Manuel Damásio e João Vale e Azevedo. O primeiro, «muito discreto», aparece poucas vezes no balneário. Scott lembra-se melhor da primeira-dama, Margarida Prieto.

«Muito simpática. Organizava vários eventos com as namoradas e mulheres dos jogadores. Cheguei a ter uma namorada australiana em Lisboa e lembro-me de a levar a esses convívios. Para quem está sozinho num país diferente, essas iniciativas são marcantes», elogia Scott Minto.

E o polémico Vale e Azevedo? «Era completamente diferente. Emocional. Eu não tenho nada a apontar-lhe, cumpriu sempre comigo, mas sei que o Graeme [Souness] teve muitos problemas com ele. Enfim, o futebol às vezes é assim.»

Scott Minto nas Antas (boa jogada aos 3m20s), Paulinho e JVP expulsos:

Scott faz a lista do que adora em Portugal: comida, clima, amigos, Benfica, praia, descontração, Eusébio.

Sim, Minto é «o maior fã» de Eusébio em Terras de Sua Majestade.

«No meu tempo, Eusébio era o treinador dos avançados. Ficava com eles a treinar movimentos e remates. O Eusébio não falava inglês, eu falava pouco português, mas a simples presença dele no balneário… era uma estátua viva, ali ao nosso lado.»

Eusébio, sim senhor, e quem mais? Quem são os melhores amigos e os melhores jogadores do famoso British Benfica?

«João Vieira Pinto. Que craque! Havia tanta pressão sobre ele, todos nós lhe queríamos passar a bola. Todos sabíamos que o João fazia tudo bem. Nice guy, indeed.»

«O plantel tinha excelentes jogadores. Na minha primeira época, aliás, o Calado foi o mais regular, sempre a jogar bem. Era o meu colega de quarto nos estágios, falava bem inglês. Excelente rapaz, o que é feito dele? Comentador televisivo? Isso é uma surpresa.»

«Tenho de elogiar também o Nuno Gomes, o Karel Poborsky – era o meu rival mais difícil nos treinos! –, o Hugo Leal e o Paulo Madeira. Ah, e o grande Michel PreudHomme! Quando saí do Benfica, em janeiro de 1999, pensei que íamos chegar ao título. O FC Porto não deixou.»

Benfica-Campomaiorense, 4-0: jogo de estreia de Minto:

FC Porto, sempre o FC Porto à frente do Benfica de Scott Minto. Os dragões completam nesse período o inédito pentacampeonato. O que separa, então, os dois monstros do futebol português?

«A qualidade era parecida. Quando jogávamos contra eles, as diferenças eram mínimas. Com o Souness estivemos muito perto do FC Porto no primeiro ano (nove pontos no final do campeonato). No segundo, quando saí, estávamos a três pontos. A experiência deles deve ter sido decisiva.»

E a culpa desse deserto de troféus é de quem? De Souness? Dos britânicos? Da direção?

«A ideia de juntar o estilo britânico ao latino não resultou. Tivemos boas fases, excelentes ciclos de resultados, mas não chegou. E depois… bem, o Benfica, um clube enormeeeee, não tinha a organização que tinha hoje em dia. Em alguns dias, o clube parecia um manicómio. Mas é o que digo sempre: foi a melhor experiência da minha carreira, nunca esquecerei o Benfica.»

Scott Minto num PSV-Benfica (Liga dos Campeões)

Minto cruza-se com Souness «de longe a longe» e mantém «muito respeito» pelo antigo treinador. E os outros britânicos?

«Agora fico sobretudo em casa. Trabalho e casa, casa e trabalho. Vivo para a minha família. Sei que o Gary Charles teve problemas pessoais, o Michael Thomas creio que vive em Liverpool. É um tipo incrível. O Mark Pembridge trabalha na formação do Fulham…»

Há saudade, muita saudade, nas palavras de Scott Minto. Recolhido num ambiente familiar, o antigo defesa, agora com 45 anos, não esquece os dias em que pegava no telefone para «fazer inveja» aos pais.

«Janeiro, marginal Lisboa-Cascais. Nunca usava casaco. Chegava a casa e telefonava para Inglaterra. ‘Então, tudo bem? Chuva, neve? Bem, eu estou na minha varanda a apanhar sol’ (risos). Nunca usei luvas para treinar, muito menos fato-de-treino. Para um inglês isto é o maior tesouro.»

«Bem, a minha esposa está a chamar-me para jantar. Hoje prometo beber um ‘Port Wine’. Abraço a todos em Portugal. Amo o Benfica!»

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