Diego Costa falhou o jogo no Dragão mas pode ser um pesadelo para o FC Porto no Vicente Calderón. A formação portista receia encontrar pelo caminho um talento que cobiçou em 2006, antes da investida frenética do Atlético de Madrid.

Aos 25 anos, o hispano-brasileiro mantém as caraterísticas que faziam dele um adversário temível nos treinos do Penafiel. Sim, nos treinos. «Normalmente, são os centrais a dar nos avançados. Com o Diego era o contrário, ele é que batia», recorda à
Maisfutebol Total o guarda-redes Avelino, seu companheiro de equipa na época 2006/07.

Avelino e Clayton receberam o avançado no clube duriense. Dois antigos dragões a acompanhar um prodígio que pode confirmar a despedida do FC Porto na Liga dos Campeões. «Era mesmo assim, nos treinos os centrais até preferiram nem o defrontar. Ele dava, mandava vir, metia o pé, era incrível», confirma o antigo extremo brasileiro.

O futebol era tudo para Diego Costa, o jovem que a Gestifute de Jorge Mendes descobriu no Brasil e levou para o Sp. Braga. Cedido ao Penafiel, habituou-se a uma rotina modesta e à dureza da Segunda Liga. O habitat perfeito para um animal competitivo.

«Pô, mister, não enche o saco»

«Não tinha nenhuma alcunha especial, mas por vezes brincávamos com ele, chamávamos de bicho, de fera, porque tinha uma força incrível e não facilitiva, nem sequer nos treinos», explica Avelino.

Clayton acrescenta pormenores deliciosos. Foi ele quem acompanhou Diego de perto em Penafiel. «Era um miúdo, chegou ainda com 17 anos e só pensava em treinar, em crescer. O treino acabava e ele continuava a correr, ou a rematar, ou a pedir-me para lhe fazer cruzamentos para ele finalizar. Tinha energia a mais.»

Rui Bento, o treinador, queria moldar o talento. Difícil. «Dizia-lhe para parar e descansar. O Diego respondia: ‘pô mister, não enche o saco’. Depois, vinha pedir-me para falar com o Rui Bento, com quem joguei no Sporting, para o deixar treinar à vontade.»

Diego Costa parecia correr contra o tempo. Queria conquistar a Europa num segundo. Não chegou a tanto mas o salto foi impressionante. E Rui Bento teve um papel decisivo, como poderá ler mais à frente. «O Rui andava louco com ele, vinha ali um portento».


Os jantares e a playstation em casa de Clayton

O jovem brasileiro vivia em Penafiel com outros dois brasileiros, Vinícius e Fernando. «Viviam num apartamento que o clube arranjou, mas muito modesto. Saiam de casa, iam a pé para os treinos, comiam qualquer coisa pelo caminho. Era uma vida dura, a pensar no sucesso. Ele era um miúdo e senti que o tinha de ajudar», conta Clayton.

«Muitas vezes, levava-o para casa, ficava a jogar connosco e passava horas a jogar Playstation com o meu filho (Clayton Júnior), que agora está na formação do Atlético Mineiro. O Jorge Mendes também me pediu para olhar por ele, acreditava muito no seu potencial.»

Em seis meses, Diego Costa conquistou tudo e todos. «Já decidia jogos, levava tudo à frente. Era capaz de vir buscar a bola à defesa e correr todo o campo. Tinha um grande físico mas muita qualidade técnica. Basta ver o seguinte: até ele sair, o Penafiel ia nos primeiros lugares. Depois voltou ao Braga e a equipa caiu na classificação», frisa Avelino.

Assim foi. Fez o seu último jogo na Segunda Liga a 17 de dezembro de 2008. O Penafiel ocupava o quarto lugar. Terminou a época em oitavo. «E nessa altura, jogava muitas vezes atrás do avançado», acrescenta o guarda-redes.

A conversa que cativou o Atlético de Madrid

Javier Hernández, antigo olheiro do Atlético de Madrid, contou a história recentemente em Espanha. «Estava em Braga a ver um jogo e estavam lá o Nuno Patrão (empresário) e o Rui Bento. Este disse que tinha com ele um miúdo com 1,90 metros e muito talento com a bola. Contei isso a um responsável do Atlético e este decidiu que eu ficaria mais um dia em Portugal para o ver.»

«No dia seguinte, fui de carro a Chaves. Era um jogo de segunda, horrível. A segunda lá seria a terceira aqui. Vi gente veterana e um miúdo grande, descoordenado, que se metia com todos. Tinha muito mais nível que os restantes, mas precisava de se formar. Dei um parecer positivo e o Atlético mexeu-se rapidamente. Falou com o Braga, com Jorge Mendes e contratou um talento», acrescentou Javier Hernández, à imprensa do país vizinho.

O FC Porto ficava para trás. «Sinceramente, não sei por que falhou mas o interesse do Porto era real. Ainda por cima, o Diego dizia que preferia ficar em Portugal. Mas depois pensou bem e assinou pelo Atlético», recorda Clayton, secundado por Avelino: «Na altura achávamos que ia para o FC Porto. Foi uma surpresa quando soubemos que afinal era para o At. Madrid.»


Diego como Ronaldo e o carinho pelo FC Porto

Diego Costa regressou ao Sp. Braga em janeiro de 2007. Pelos arsenalistas, defrontou uma vez o FC Porto mas ficou em branco. Não conseguiu bater uma equipa onde estavam (e estão) Hélton e Lucho González. 0-1 no Minho.

O futuro estava traçado e passava por Espanha. Aos 25, é a referência atacante do Atlético de Madrid e disputa o título de Pichichi com Cristiano Ronaldo. «E a Bota de Outo!» Clayton não esconde a sua alegria. «Tive a felicidade de apanhar o Ronaldo no Sporting, com 17 anos, e depois o Diego no Penafiel com a mesma idade.»

«É essa a beleza do futebol. Meninos que tinham pouco e agora estão onde estão. O Ronaldo é outra fera para treinar, como o Diego. Lembro-me de ele chegar todo contente aos treinos, com Carlos Martins, Lourenço, etc., vinha com umas camisas da Dolce Gabbana, dizia que tinham encontrado mais barato na feira. Tudo material falso, claro. Mas veja onde estão hoje», recorda o esquerdino, emocionado.

Ronaldo representa a seleção portuguesa, Diego Costa escolheu Espanha. O compatriota não o critica. «A escolha é dele. Nunca falei com ele sobre isso, mas no Brasil nem sempre os melhores chegam à seleção. Não basta ter qualidade, infelizmente.»

Clayton, agora afastado do futebol, não vai torcer pelo amigo de longa data na Liga dos Campeões. O FC Porto tem a prioridade. «Acompanho sempre. Lembro-me que os encontrei no Chipre, fizeram-me uma festa enorme. O Porto marcou a minha carreira», frisa, em entrevista à Maisfutebol Total.

Quanto a Diego Costa, continuará a incomodar os adversários com a camisola do Atlético de Madrid nos maiores palcos. Tal como fazia com 17 anos, na Segunda Liga portuguesa, em Penafiel.