João Virgínia trocou o Benfica pelo Arsenal depois de receber uma exposição do treinador de guarda-redes do clube londrino: seis meses depois, e em entrevista ao Maisfutebol, o jovem guardião faz um balanço de meio ano em Inglaterra.

A conversa veio a propósito da Future Cup, uma competição na qual o português brilhou ao defender os penaltis que valeram a eliminação do Barcelona, primeiro, e a conquista do troféu, depois, frente ao Anderlecht. A partir daí falou-se de quase tudo.

João Virgínia falou do projeto que o Arsenal tem para ele, falou da dificuldade que foi deixar o Benfica, falou de Petr Cech e Arsène Wenger, mas também do que é um dia normal em Londres e dos sonhos que tem para o futuro. Venha daí e entre na conversa.

A avaliar pelas notícias, a adaptação ao Arsenal está a correr bem...?

Sim, adaptei-me muito bem. O Arsenal é um clube acolhedor e por isso sinto-me como fazendo parte duma família.

Não estranhou a mudança para Inglaterra?

Não, não, também correu bem. Nos primeiros tempos foi difícil compreender o inglês de alguns colegas que falam muito rápido. O meu inglês sempre foi bom, mas faltava-me treino de ouvido. Agora que estou em Inglaterra há algum tempo está quase perfeito.

Antes de assinar pelo Arsenal, foi cobiçado pelo Manchester United: nesta altura sente que fez a escolha certa?

Absolutamente. Estou muito contente com a minha decisão. O Arsenal apresentou-me um projeto que me fascinou e no qual acredito, por isso tomei a decisão certa.

Que projeto foi esse?

O treinador de guarda-redes fez-me uma apresentação sobre a formação do clube e quais os seus métodos de preparação dos guarda-redes. Identificou as minhas características, analisou em que fase de desenvolvimento eu estava e explicou-me porque é que o Arsenal seria o melhor clube para completar a minha formação, sendo o objetivo final dar-me a oportunidade de jogar pela primeira equipa. A apresentação foi espetacular. Fiquei impressionado com o trabalho de observação que tinham realizado sobre mim.

E para além disso, o que mais o tem impressionado no Arsenal?

A organização e os funcionários do clube. Aqui tudo é muito profissional. Existe respeito por toda a gente e as pessoas estão à vontade umas com as outras, é como se fossemos uma família. Como eu costumo dizer, não existem passaportes.

O que é que isso quer dizer?

Quer dizer que, independentemente do país ou da idade, o jogador é avaliado unicamente pelo talento, pela vontade e pelo trabalho. Um jogador jovem pode jogar e treinar tanto nos sub-18, como nos sub-21 ou até mesmo na primeira equipa.

Por falar nisso, o João já treinou algumas vezes na equipa principal...

Um dia cheguei ao centro de treinos de manhã, bastante cansado depois de um estágio da seleção, pensando que ia ter um dia relaxado, de recuperação física, e disseram-me que ia treinar com a primeira equipa. As minhas energias voltaram logo. É ótimo treinar com Ozil, Sanchez, Walcott, Giroud... Obrigam-te a pensar mais rápido e a evoluir muito. 

E por que é que o chamaram a si?

Não sei. Quando a primeira equipa precisa de um guarda-redes para o treino, tanto específico, como integrado com a equipa, é chamado um dos guarda-redes da academia, normalmente dos sub-21. Eu sou o mais novo da academia, mas já fui chamado algumas vezes. Para mim isso é ótimo.

Teve oportunidade de falar com algum desses grandes jogadores?

Falei com o Ospina e o Cech durante o treino. Na primeira vez ficaram surpreendidos com a minha idade. Fizeram-me perguntas e o Cech até sabe coisas de Portugal.

Ah é? Que coisas?

Ele no Chelsea teve muitos colegas portugueses, daí ser normal que saiba coisas sobre Portugal. Também tenta falar em português comigo, sabe algumas palavras.

O Petr Cech e o Buffon são os seus ídolos: disse ao Cech que era fã dele?

Não lhe disse que era fã. Ele é um grande profissional, dá-me imensos conselhos. É um excelente colega de trabalho.

E já agora, o que falou com Arsène Wenger quando se cruzaram? 

Apenas nos cumprimentámos.

Há um grande respeito da parte de toda a gente no Arsenal por ele?

Completamente. É um senhor no clube, há um grande respeito pelo Boss. Sei que observa e acompanha permanentemente a evolução dos jogadores mais jovens no Training Center e isso é uma motivação para nós.

Como é um dia normal do João em Inglaterra?

Acordo pelas sete horas, tomo o pequeno-almoço em casa, vou para o Training Center, realizo exercícios de prevenção no ginásio e sigo para o treino. Almoço por volta do meio dia e meia hora. Á  tarde tenho ginásio e escola, e por volta das 17 horas volto para casa. Quando não dou uma volta com os meus colegas ainda durmo uma pequena sesta.  Janto em casa, vejo um pouco de TV e vou dormir. 

Também ficou numa família de acolhimento como costuma acontecer aos jovens em Inglaterra?

Sim, estou a viver numa família de acolhimento.

Não é estranho?

No início é um pouco estranho estar a viver na casa de pessoas que não se conhece. Felizmente tive sorte na família e adaptei-me bem, gosto muito deles.

Com quem costuma passar mais tempo em Londres?

Com o Eddie Nketiah, meu colega de equipa, que também vive comigo na casa da família de acolhimento.  

Custou-lhe deixar o Benfica?

Estive quatro anos em Lisboa, criei muitos laços depois de tanto tempo no clube e é sempre difícil deixar os colegas e amigos, mas senti que era o momento certo para sair.

Porquê?

Vi no Arsenal a melhor estrutura de formação para dar continuidade  ao meu desenvolvimento enquanto guarda-redes e atleta profissional. Depois estando aqui estou mais perto de um dia cumprir o sonho de jogar na Premier League.

É um sonho muito forte esse?

A Premier League? É o meu sonho. É um dos melhores campeonatos do mundo, com grande competição, com uma intensidade brutal, muitas oportunidades de golo, com muito trabalho para os guarda-redes, estádios sempre cheios, excelentes adeptos e com ambientes fantásticos. Acho que é o sonho de qualquer jogador.

Aos 16 anos tem a certeza absoluta que vai ser guarda-redes?

Se não tivesse a certeza penso que não fazia sentido estar longe da família e amigos e abdicar de boa parte da vida de adolescente.  Pergunta-me se é o que eu quero, eu respondo: é tudo o que eu quero.

Então e onde chegam os seus sonhos?

Tenho apenas 16 anos, ainda tenho muito pela frente. Mas sou ambicioso e penso que, se continuar a dar o meu melhor todos os dias, um dia estarei a jogar num dos melhores clubes europeus. De preferência no Arsenal. Jogar pela selecção nacional em Europeus e Mundais é também um sonho muito grande que tenho.