*Enviado-especial ao Brasil

Se a medida do sucesso de uma equipa é a forma como e despedida pelos seus, então o adeus da seleção portuguesa a Campinas foi o retrato exato da sua passagem pelo Mundial: rápida, discreta e sem deixar memórias, nos poucos que o foram testemunhar.

O contraste com a receção apoteótica na chegada, a 11 de junho, não podia ser mais acentuado. Agora, apenas 16 dias mais tarde, é a Nigéria que continua a manter Campinas ligada ao Mundial, pelo menos até ao jogo com a França, nesta segunda-feira. Para os portugueses, e os seus apoiantes, a recordação daqueles dias eufóricos, antes da viagem para Salvador, parecia mais distante do que nunca, quando o autocarro deixou o complexo The Palms.

Bem menos do que os jornalistas, polícias e militares que atestavam a solenidade do momento, os cerca de quarenta adeptos que esperaram a passagem do autocarro, sob um forte sol de inverno, praticamente não se manifestaram de forma audível quando o momento chegou. Uns acenos tímidos, timidamente correspondidos de dentro do autocarro, marcaram o cair do pano sobre uma história de amor que acabou mal - passe a redundância.

Era dia de trabalho, em plena hora de almoço, as pessoas têm vida para lá do Mundial. Mas, para sermos inteiramente justos houve, pelo menos, uma exceção de vulto. Tinha chegado quase uma hora antes. Mal saiu do carro, auxiliado pela mulher, tirou o boné e vestiu a camisola vermelha, de contrafação, com os símbolos da FPF. Cumprimentou, um por um, jornalistas e seguranças, com um cavalheirismo de outros tempos. E não demorou a exibir o cartaz tosco, escrito à mão com caneta de feltro, com um «Até à próxima Portugal», sem enfeites nem pontuação.

Mário de Oliveira Pereira, oriundo de Ourém, mas residente em Campinas há 53 anos, esteve em todas: na chegada, na receção à equipa e nos dois treinos abertos, no estádio Moisés Lucarelli. Ele e a esposa, Rosa, cuja família é de Monção, foram os únicos representantes da comunidade portuguesa a fechar o capítulo, sem um lamento nem uma recriminação.

«Foi impossível ter contacto com eles além dos dois treinos abertos. Campinas organizou uma segurança espantosa, e está de parabéns de parabéns por isso. Estar com eles de perto não interessa. Muitos jovens ficaram frustrados, mas eu não, porque sei que isso não os ajuda em nada», afirmou, pouco depois da passagem do autocarro.

O senhor Mário admite que a despedida veio mais cedo do que esperava, mas não se lhe ouve uma palavra amarga: «Fizeram tudo o que puderam. Gostei muito, eles vão agora, mas o meu coração vai com eles. E digo-lhes até à próxima, porque o Euro 2016 começa já daqui a dois meses, não é?» Ao lado, dona Rosa acentua: «Tenho o coração pesado, sabe? Nunca falei com eles, nunca cheguei a conhecer ninguém da equipa, mas é como se estivesse a despedir-me da família», diz.

Os últimos polícias dispersam, a entrada do The Palms despe-se do aparato das últimas semanas. Atendendo ao que foram os seus três jogos, é difícil defender que Portugal vá fazer falta a este Mundial. Mas vai fazer muita, mesmo muita falta, ao senhor Mário. 

Quando acenaram para os jogadores, Cristiano Ronaldo acenou-lhes de volta. Talvez Rosa e o senhor Mário não tenham reparado, mas a janela ocupada pelo capitão era contígua àquela onde estava escrita, nos vidros do autocarro, a primeira parte do lema da comitiva: «O passado é história». A segunda («o futuro é a vitória») ficou fora do enquadramento, por esta vez. Mas à família perdoa-se quase tudo.