Transportes parados, estradas cortadas, lojas e serviços públicos encerrados, manifestações de muitos milhares de pessoas por toda a região… À greve desta terça-feira na Catalunha, convocada por duas centrais sindicais, juntaram-se até os clubes de futebol, com o Barcelona à cabeça.

O protesto contra a atuação violenta da Polícia Nacional e da Guarda Civil espanhola no último domingo, no sentido de impedir a realização de um referendo sobre a independência da região, parou também o desporto.

Exemplo disso mesmo é o Reus, clube da cidade de 100 mil habitantes a 100 quilómetros de distância de Barcelona, que milita na II Divisão Espanhola e onde atuam os portugueses Vítor Silva, Ricardo Vaz, Raphael Guzzo e Luís Gustavo, que por estes dias vivem no olho do furacão do conflito entre Madrid e Barcelona.

«O treino estava agendado, mas a direção do Reus decidiu também aderir à greve, à semelhança do que aconteceu com todos os outros clubes da Catalunha. As instalações estão encerradas, tal como acontece com estabelecimentos comerciais e várias empresas. Parece um domingo ou feriado», disse na tarde de terça-feira ao MAISFUTEBOL Vítor Silva, médio de 33 anos que em 2014 trocou o Sporting pelo clube catalão.

Vítor Silva em representação do Reus

O avançado Ricardo Vaz [o primeiro a contar da esquerda, na fila de baixo, na foto principal do artigo], destaca o dia de protestos: «Houve uma grande manifestação ao meio-dia e outra às 18 horas, aqui no centro de Reus, tal como por toda a Catalunha. Existe aqui uma revolta muito grande pela atitude exagerada das forças policiais no dia do referendo. Domingo, quando voltávamos de Sevilha (onde defrontaram a equipa B dos andaluzes), já caminho de Reus, fomos informados pela direção de que ia haver greve e que o clube se ia associar. Ainda bem que jogámos fora, porque o clima aqui era muito tenso, mas no jogo em casa no próximo sábado certamente que no nosso estádio vai-se sentir este clima de protesto e indignação.»

«O Barça sair da Liga seria um escândalo»

Vítor Silva, que não joga por estar a debelar uma lesão no joelho, recorda que no último jogo em casa do Reus a claque do clube já havia manifestado o seu apoio à causa independentista: «Estenderam na bancada uma bandeira gigante da Catalunha, ainda antes do referendo, mostrando o seu apoio ao “sim”.»

O médio português escusa-se a ter uma posição definitiva sobre o tema em concreto, mas salienta a divisão até dentro do plantel.

«Mesmo na equipa há quem tenha diferentes perspetivas. Uns defendem a independência, outros não, sobretudo por razões familiares. Alguns porque são catalães de nascimento, mas os pais não, por exemplo», diz o jogador, destacando algumas particularidades da sua vivência na Catalunha: «Apesar de haver algumas diferenças culturais relativamente ao resto de Espanha, a principal é a língua. Tenho duas filhas. A mais velha, que tem 5 anos, já fala catalão e castelhano. Aliás, na escola a primeira língua é catalão.»

Por sua vez, Ricardo Vaz diz entender a sensibilidade de boa parte dos seus amigos catalães, que defendem a independência.

«Respeito a opinião daqueles que querem a independência, embora ache que a solução terá de ser negociada», refere o avançado de 22 anos, ex-Estoril, que se pronuncia também sobre uma questão paralela que atravessa a discussão: num cenário de separação, em que campeonato jogaria o Barcelona?

«Se o Barça saísse da Liga Espanhola seria um escândalo. Seria péssimo para o clube, mas para Espanha também. Teria de chegar-se a algum acordo. Afinal, há clubes de Andorra a jogarem nas divisões inferiores do futebol espanhol. Teria de se encontrar uma solução parecida à do Mónaco, que joga na Liga Francesa.»