Agora que o título captou a sua atenção, informo-o de que se falará sobre futebol, clubes e jornalismo

Por razões que não vêm ao caso, esta semana misturou-se, nas mesmas frases, futebol, adeptos, clubes, profissionalismo, jornalismo e independência.

Não pouca gente junta tudo isto e por isso é natural que acabe baralhada e, com alguma probabilidade, baralhe os outros.

Para mim as coisas são relativamente simples.

A probabilidade de um jornalista que escreve sobre futebol gostar de futebol é elevada. Acho até que mais do que elevada, deve ser desejável. Assim tende a trabalhar quando se diverte e a divertir-se quando trabalha. Fica ele mais feliz e quem o lê também.

A confusão, para muitos, instala-se depois deste momento.

Se um jornalista gosta de futebol, pensam, então tem de ter um clube.

Errado.

A diferença entre gostar de futebol e gostar de um clube pode ser muito grande, enorme, se pensarmos bem. E uma coisa não tem de levar à outra.

Um tipo sabe que gosta de futebol quando se emociona com uma grande jogada de um defesa direito da Papua Nova Guiné, no minuto 90 de um poderoso derby local. Se já lhe aconteceu, percebe. Também sabe que gosta de futebol quando dá por ele horas a fio a ver vídeos de mundiais, europeus e coisas do género, interessado em tudo, da cor das botas ao feitio das camisolas e ao nome do meio do selecionador da Guatemala.

Uma pessoa gosta de um clube quando compra o jornal do dito ou vai ao site oficial e se interessa pelos resultados dos iniciados do pingue pongue que naquele dia tinham um jogo decisivo. Sabe que já não é apenas gosto, passou a ser amor, quando o clube lança uma marca de preservativos e lhe passa pela cabeça que um dia será assim que gritará golo.

Gostar de futebol ou gostar de um clube são coisas diferentes, mas nenhuma delas incompatível com a missão de informar com distanciamento.

Acontece que existe uma terceira categoria, essa sim perigosa: os que não gostam assim tanto de futebol, nem assim tanto de um clube, mas gostam mesmo muito daquela relação especial com o dirigente, o treinador ou o jogador, e, em simultâneo, odeiam mesmo muito o outro clube, o outro dirigente, o outro treinador e o outro jogador. Esses sim são os que comportam perigo, se misturados com o jornalismo.

Um bom jornalista saberá separar o amor ao jogo, e até o amor ao clube, da caneta. Um mau jornalista, fundamentalista e engajado, não. Merece ser tratado como um tipo perigoso. Para o futebol, para os clubes, mas sobretudo para o jornalismo, que de tudo isto é o que realmente me interessa. E o leitor, como fica no meio disto? Tem de fazer o seu trabalho e aprender a distinguir o que vê e lê. Ninguém disse que o amor era fácil.