Estórias Made In é uma rubrica do Maisfutebol que aborda o percurso de jogadores e treinadores portugueses no estrangeiro. Há um português a jogar em cada canto do mundo. Este é o espaço em que relatamos as suas vivências.

Após desvincular-se do FC Porto, chegou ao Sporting na temporada 2012/2013 e nunca alcançou o estatuto de indiscutível. De cedência em cedência, e depois de representar emblemas como o Lyon ou o Granada, Miguel Lopes parece ter encontrado definitivamente a regularidade que ambicionava em território turco, bem distante do clube do coração.

Em 2013/2014, ao serviço dos «les gones», onde partilhou o balneário com o internacional português Anthony Lopes, disputou 31 encontros e acabou, na época seguinte, por regressar a Alvalade, na era Marco Silva, para festejar a conquista da Taça de Portugal.

«Foi fantástico. É o clube do meu coração. Acompanho o Sporting desde pequeno e a minha família é quase toda sportinguista. Regressar e vencer a Taça de Portugal era um sonho e foi concretizado», começa por contar.

Numa procura incessante pela obtenção de mais minutos no interior das quatro linhas, o Granada afigurou-se como a melhor alternativa para a prossecução do objetivo.

«O meu empresário apresentou-me a proposta, analisamos o projeto e apresentamo-lo ao Sporting, que me deixou ir. O Granada tinha um grande projeto e estava a construir um novo centro de estágio, com condições maravilhosas. Achei que seria bom para mim e não me arrependo, porque estive num excelente clube e reencontrei bastantes amigos, também.»

Terminada a temporada, uma nova cedência, desta feita ao Akhisar, clube que milita no primeiro escalão da Turquia. A adaptação a uma distinta realidade nunca chegou a ser problemática e, desportivamente, a passagem correu de feição, em termos individuais e coletivos.

«Adaptei-me muito bem ao futebol e ao povo turco. É um povo dado, que vive bastante o futebol. Resido numa cidade fantástica e quase não houve atentados terroristas aqui. Depois de terminar o empréstimo, o meu foco esteve sempre em regressar à Turquia. Tive várias propostas, mas a melhor foi a do Akhisar e tudo acabou por correr bem. Ficámos em sétimo lugar no ano passado e fui considerado o melhor lateral direito da Turquia, com três golos e quatro assistências. Nenhum lateral tinha feito isso no ano passado. Este ano estamos também numa boa posição, em nono», afirmou.

«Se fosse estrangeiro, talvez me fossem dadas oportunidades»

A derradeira machadada nas inseguranças decorrentes de uma constante deambulação por empréstimos foi dada precisamente esta época, goradas as expectativas de conseguir uma vaga no plantel de Jorge Jesus.

«Quando fui para o Sporting pensei, sinceramente, que me iriam dar uma oportunidade e tal não aconteceu. Queriam que renovasse contrato, mas a proposta não igualou a do Akhisar e, por isso, decidimos rescindir o contrato. Se fosse estrangeiro, talvez me fossem dadas oportunidades. Como sou português… Em Portugal, muito dificilmente dão oportunidades aos jogadores nacionais com qualidade», prosseguiu.

O Akhisar reúne todas as condições necessárias para fruir daquilo de que mais gosta, com qualidade de vida. «É um clube familiar e modesto. Vai construir um estádio e um centro de estágio novos. É também muito ligado aos jogadores e não deixa que lhes falte nada. Treinas, jogas e estás sempre contente. Além disso, paga a horas e oferece excelentes prémios. A cidade é fantástica. Tem vários centros comerciais, existem diversos restaurantes debaixo da minha casa, farmácias, tudo.»

«De manhã, saio para o treino, regresso a casa, reúno a família e levo-a até a um centro comercial ou um parque infantil. Depois, almoço ou janto fora. Tento também estar com amigos. Tenho aqui o Hélder [Barbosa] e convivemos bastante. É uma coisa nossa, bem portuguesa. Aos domingos, por exemplo, na maior parte das vezes, fazemos um almocinho ou jantarzinho. É bom, é bom», acrescentou ainda.

Os fervorosos adeptos turcos fornecem aos jogadores uma injeção adicional de motivação, que é complementada com recintos recorrentemente lotados.

«É algo que me agrada bastante. A maioria dos estádios está sempre cheia, o que é fantástico. Quando vemos um estádio assim, dá-nos ainda mais motivação para jogar e mostrar a nossa qualidade», admite.

A envolvência e a proximidade relacional com os fãs do desporto-rei são outras das particularidades de que mais aprecia.

 «Jogámos frente ao Galatasaray neste fim-de-semana. Estávamos no aeroporto e os seus adeptos pediram para tirar fotos, sem qualquer problema. A rivalidade só existe verdadeiramente entre os grandes clubes. De resto, isso não acontece: querem apenas estar com os jogadores. É a demonstração da paixão que têm pelo futebol.»

A Turquia é, presentemente, um destino relativamente comum para atletas de nacionalidade portuguesa. O defesa direito aponta a capacidade financeira e a paixão dos adeptos como fatores dominantes de atração.

«Economicamente, é bastante superior. Os clubes pequenos pagam como um grande em Portugal. Depois, é a paixão que os adeptos têm. Sentimos muito isso. Deu-me logo um bichinho para vir para cá», conta.

Para o internacional português, as principais dissemelhanças competitivas entre os campeonatos português e turco residem, fundamentalmente, no entusiasmo e na agressividade.

«É um futebol mais agressivo, com mais paixão e sem muito ‘stress’. Entramos sempre com o mesmo foco para as partidas. No caso do Akshisar, se perdermos, as pessoas dizem de imediato: ‘É só um jogo. Vamos para a frente, que é esse o caminho’. Em Portugal, pelo contrário, começam a gerar alguma pressão, que acaba por ser negativa. Aqui não existe pressão, quer percamos ou não. Recentemente, por exemplo, perdemos com o Galatasaray por 4-2 e ficámos tristes, mas levantámos a cabeça e seguimos em frente.»

Os objetivos traçados pelo clube orientado por Okan Buruk para a presente temporada passam por almejar a melhor classificação interna possível e criar os alicerces indispensáveis para, a curto ou médio prazo, disputar as competições europeias.

«Há dois anos ficámos em oitavo, no ano passado em sétimo e queremos ir por aí. Creio que, no futuro, podemos, certamente, pensar num Akhisar capaz de competir nas provas europeias. Sempre esteve próximo disso e, este ano, queremos fazer um bocadinho melhor. Quero que, um dia, o Akhisar sinta esse ambiente, tal como eu próprio já senti. Seria a primeira vez que estaria na UEFA e as pessoas merecem, porque vivem para isto».

«O meu futuro passa pela Turquia, porque estou num clube em que me sinto bem. Estou feliz, respeitam-me e dão-me o valor que mereço. Para mim, isso é o que chega para querer ficar aqui.»

«A seleção nacional já é uma miragem»

O jogador de 30 anos descarta um eventual regresso à formação das «quinas», devido às múltiplas soluções que se encontram, presentemente, à disposição do selecionador Fernando Santos.

«A seleção nacional já é uma miragem. Está repleta de excelentes laterais direitos. Se for considerado o melhor lateral direito da Turquia durante os três anos de contrato que tenho aqui, nunca irei à seleção nacional. Há jogadores que jogam no Barcelona [Nelson Semedo], no Southampton [Cédric Soares] e no FC Porto [Ricardo Pereira], que oferecem ótimas soluções para a posição. Vejo Portugal na televisão. Não faz parte da minha lista de objetivos», reconhece.

Miguel Lopes continua a acompanhar atentamente o campeonato português e considera que FC Porto e Sporting são os favoritos na corrida pelo título de campeão nacional.

«Estão empatados pontualmente e ambos têm capacidade para vencer qualquer jogo, neste momento. Vejo o FC Porto ligeiramente mais forte, mas, como sportinguista, espero, sinceramente, que o Sporting seja campeão. O Benfica tem peças fundamentais que não estão tão bem. Na minha modesta opinião, com o Pizzi da época passada, o Benfica cresceria muito mais este ano, seguramente. São fases dos jogadores e, com a qualidade que tem, vai conseguir passar por cima e a equipa vai carburar na segunda volta, com certeza», remata.