Estórias Made In é uma rubrica do Maisfutebol que aborda o percurso de jogadores e treinadores portugueses no estrangeiro. Há um português a jogar em cada canto do mundo. Este é o espaço em que relatamos as suas vivências.

Neste caso, não é um, são seis. Janio Bikel no NEC, primeiro classificado da Jupiler League e Miguel Santos, Mica Pinto, André Vidigal, Lisandro Semedo, mais o treinador Cláudio Braga no Fortuna Sittard, terceiro classificado. Nos juniores ainda há outro português, Alex Petrice.

Um número pouco usual de portugueses na luta pela subida à Eredivisie. O Maisfutebol foi conhecer os jogadores que representam a nossa nação no país das tulipas.

Lisandro Semedo é uma das estrelas do escalão. Leva 13 golos marcados no campeonato, e foi autor de um «hat-trick» na última jornada frente ao Cambuur. O avançado, titular indiscutível de Cláudio Braga na frente de ataque do Fortuna, acredita que a equipa está a superar as expectativas:

«Tem estado tudo a correr muito bem, bem acima das expectativas. Podemos lutar para ser campeões e pela subida direta. Mas comparando ao ano passado, é uma época magnífica.»

O avançado, formado no Sporting, acredita que é bom ter compatriotas na equipa, e não conta, para já, voltar a Portugal: «É muito bom ter portugueses, é um entendimento completamente diferente. Temos outra ligação, até pela língua. Ajudamo-nos muito e por agora não conto em voltar a Portugal, mas depende sempre do projeto.»

Semedo, uma das estrelas do plantel, esteve perto de não ficar a jogar pelo clube da cidade de Sittard: «Vim fazer testes em maio, mas não se decidiram. Voltei em setembro, fiquei, e agora sou dos melhores jogadores da equipa. Os meus colegas perguntam-me como é possível ter vindo só para fazer testes, quando agora sou muito importante no plantel», contou, entre risos. 

Miguel Santos, guarda-redes da equipa de Cláudio Braga, foi o primeiro português a representar as cores do clube, e elogiou a chegada do treinador: «Veio com uma ideia muito certa do que queria fazer com a equipa, melhorámos o nosso futebol e isso vê-se nos últimos jogos. Tem muita maturidade.» 

Comparando o futebol português com o holandês, o jovem guarda-redes elogiou a tolerância dos adeptos: «A Holanda surpreendeu-me. As pessoas são simpáticas e ajudam. Os adeptos são muito bons, todas as equipas no segundo escalão têm muitos adeptos. Nos jogos fora temos sempre 300 ou 400 adeptos, e em casa, oito mil. Mesmo quando jogamos mal, às vezes pode haver um assobio aqui ou ali, mas estão sempre connosco. Em Portugal, se fizeres um passe errado passas de bestial a besta num instante. Aqui reconhecem que somos humanos e podemos errar.»

Mesmo jogando no segundo escalão, Miguel é conhecido na pequena cidade no extremo sul do país: «A primeira vez que fui ao cabeleireiro aqui na Holanda, estragaram-me o cabelo. Nem dava para fazer nada com aquilo. Na segunda, já tive de ir à procura com mais cuidado. O rapaz que me cortou o cabelo disse que gostava de Sittard porque toda a gente o conhecia, mas não me reconheceu.  Depois entrou o dono da loja, ficou parado a olhar para mim e reconheceu-me. Tiramos uma foto todo juntos, foi engraçado.»

Se o guarda-redes é o português mais experiente em Sittard, Mica Pinto é exatamente o oposto. Chegou à Holanda em janeiro, mas destacou a rápida adaptação: «Estou aqui há pouco tempo mas estou a gostar muito do país. As pessoas foram muito simpáticas. Sermos muitos portugueses tornou muito fácil a integração no clube. Isso facilitou a minha escolha também. Estamos sempre juntos, nem que seja para jogar à sueca durante a tarde».

Para o central, o objetivo é claro: «Queremos ser campeões, o objetivo agora é esse. Ainda este fim-de-semana ganhamos terreno ao NEC, e queremos muito alcançar esse feito. Subir e ficar no Fortuna seria espetacular.»

O defesa, ex-Belenenses destacou as diferenças entre o futebol português e holandês: «Em Portugal não há dúvida que é um futebol de altíssima qualidade, mas aqui não há as «guerrinhas» entre clubes que se vê aí. Sentia isso até quando estive no Belenenses.»

André Vidigal é o ponta-de-lança com mais golos na liga como substituto. Ao longo da temporada, já marcou sete, quatro deles a sair do banco. Para o avançado de 19 anos, a época «está a ser muito positiva. A nível individual estou com um bom registo. No coletivo, melhor ainda, estamos a fazer uma boa temporada e queremos acabar bem, que é a subir.»

Ainda assim, Vidigal admite que a subida à Eredivisie não era um objetivo inicial: «Subir não foi um objetivo que traçámos no início, mas como as coisas estão a correr, temos que acreditar agora. Estamos sempre juntos os portugueses, nós os quatro e o Petrice que é dos juniores».

Apesar de não ter iniciado a temporada como treinador principal, Cláudio é um dos obreiros do ataque à subida, e contou a caminhada até à equipa principal: «Entrei no Fortuna em julho para diretor da formação, e as pessoas estavam a gostar do meu trabalho e já sabiam por onde passei, e os meus resultados. Passado uns meses, o Oliseh entrou em conflito com a direção e eu assumi o comando do clube como interino. Eu e o Kevin Hofland, basicamente temos uma função a meias.»

«O Fortuna tem um passado muito rico no futebol holandês. Já jogou competições europeias e esteve muitos anos na primeira, mas tem ultrapassado momentos difíceis e esteve mesmo para fechar portas. Com o novo dono temos melhorado, etapa por etapa. Estamos no mês de abril a dois pontos do primeiro lugar, e não passa pela cabeça dos jogadores nem na nossa não jogar para subir. Tenho algumas dúvidas que o clube esteja preparado para subir, mas vamos dar o tudo por tudo e temos competência para isso», contou o treinador português ao Maisfutebol

Cláudio elogiou todos os jogadores portugueses que tem ao dispor: «São todos jovens de grande potencial. O Miguel dá uma grande segurança na baliza. O Mica chegou à pouco mas está a adaptar-se muito bem a jogar à esquerda, é muito forte tecnicamente. O Lisandro nota-se perfeitamente que a segunda divisão sabe a pouco, é mesmo jogador de primeira, tem um grande rendimento a marcar golos e assistências, e tem um nível de treino e jogo brutal. Vai mesmo chegar longe. Por último, temos o André Vidigal, que é um jovem que tem tido um bom campeonato e para nós é um talento enorme. A última etapa dele não vai ser o Fortuna.»

O treinador português, que viveu praticamente toda a vida na Holanda, falou sobre a forte presença lusa no balneário com um grande orgulho: «Desde que assumi temos sete jogos, quatro vitórias e três empates, e os portugueses deixaram a marca em todas as vitórias, e isso é que é importante. Fui para a Holanda com 4 anos e tenho quase toda a minha vida aqui, mas tenho noção que ser português é algo muito especial. Dentro do nosso balneário quando ouço holandeses a falar palavras em português é uma coisa brutal, a língua portuguesa está bem presente no balneário e isso tem um certo valor para mim.»

Bem no coração da Holanda, há outro português a representar o primeiro classificado da Jupiler League, Janio Bikel, que falou sobre a temporada do NEC:

«Estamos muito bem, a equipa está a jogar bem e queremos ser campeões também. Já ouvi falar dos portugueses no Fortuna mas não os conheço muito bem, só os vi quando fomos lá jogar», contou ao Maisfutebol.

Sobre o seu futuro, Janio foi bem claro que não passará pela cidade de Nijmengen: «Seria ótimo jogar em Portugal, mas nunca se sabe. Trabalho aqui no estrangeiro e estou a avaliar as possibilidades de outros clubes, mas não vou ficar no NEC.»

A luta pelo título do segundo escalão holandês vai ser disputada até à negra. É difícil prever quem conseguirá a subida direta e quem terá de disputar o play-off, mas em breve, provavelmente poderemos ver alguns destes portugueses a pisar o relvado de estádios históricos do futebol europeu como o De Kuip ou do Philips Stadion.