A presença, e a participação, do País de Gales no Euro 2016 estão a fazer-se sob uma forma dupla: pelo inédito dos factos e pela memória de Gary Speed, o jogador e selecionador que se tornou uma lenda para o futebol galês.

Enquanto jogador, Gary Speed tornou-se figura na seleção galesa com um recorde de 44 jogos como capitão nas suas 85 internacionalizações. Com apenas quatro meses de experiência como treinador, tornou-se selecionador do País de Gales.

A história da seleção de futebol galesa começou a mudar, até ao que é hoje: semifinalista de um Campeonato da Europa – o melhor registo de sempre batendo os longínquos quartos de final do Mundial 1958.

A lenda de Gary Speed começou a formar-se menos de um ano depois de o selecionador ter assumido o cargo, com a sua morte. Gary Speed suicidou-se em novembro de 2011, aos 42 anos. O País de Gales e o futebol ficaram em estado de choque.

Apenas a depressão conseguiu dar alguma explicação para o suicídio de um homem que deixou a mulher e dois filhos, exemplo para muitos, lembrado por imensos.

Gary Speed tornou-se selecionador do País de Gales em dezembro de 2010. Em onze meses, orientou 10 jogos tendo ganho metade – o que para a modesta seleção britânica era digno de nota. Vários jogadores que agora brilham no Euro 2016 foram lançados por ele.

Speed pegou na seleção de Gales fora do top 100 da FIFA (116º) e levou-a para 48ª do ranking. A lenda estava a ganhar forma. Chris Coleman chegou ao Euro 2016 em 26º lugar. Os galeses chegaram a estar em nono do ranking, um lugar à frente da vizinha Inglaterra.

Coleman entrou para o lugar de selecionador do País de Gales em janeiro de 2012 e começou mal, com seis derrotas na qualificação para o Mundial 2014 – os galeses terminaram em quinto de seis. O atual selecionador galês entrou para uma missão difícil: conseguir dar continuação ao trabalho de Speed. E mais. Coleman sucedia àquele que era seu amigo de infância num cargo que tinha ficado vago pelas razões que se recordou.

A federação galesa manteve a confiança. E a qualificação para o Euro 2016 já foi diferente, com o segundo lugar de apuramento direto e um empate e uma vitória sobre a líder do agrupamento Bélgica, que agora voltou a ser ultrapassada nos quartos de final do Europeu de França.

O que tem vindo a acontecer é inédito na história do futebol galês. O sonho está em curso. A lenda está em campo. «O Gary Speed era uma figura que inspirava. Foi meu capitão dez anos, era um jogador fantástico e um homem maravilhoso», afirmou à «BBC» John Hartson antigo avançado galês: «Ele começou isto. Ele fez estrear uma série destes jogadores e estava a fazer muitas coisas boas.»

«Os jogadores juntam-se no meio do campo antes do começo do jogo e tenho a certeza de que o nome do Gary Speed é dito na altura. Todos eles adoravam o Gary e o admiravam e o respeitam», afirmou o antigo colega de equipa.

O pai de Gary Speed garante o que filho «está a olhar por eles». «Os rapazes sabem de alguma forma porque jogam assim», disse Roger Speed, de 73 anos, ao «Mirror» lembrando que «os adeptos continuam a cantar o nome de Gary». «É fantástico. Eles nunca se esquecem dele. Deixa-nos orgulhosos.»

É verdade. «There’s only one Speedo» é um cântico de eleição dos adeptos do País de Gales, que se tem ouvido nos estádios franceses quando joga o País de Gales.

Os galeses jogam com a lenda Gary Speed no espírito e com o patriotismo na vontade. Esta paixão pela nacionalidade que coloca em campo a alma galesa foi descrita à «WBS-TV» por um adepto. «O hino nacional traz-nos lágrimas aos olhos e põe-nos o cabelo em pé quando é cantado num estádio de futebol ou de râguebi», contou James Owen.

O orgulho galês verifica-se quer na homenagem aos seus jogadores pela população quer na partilha dos jogadores com os compatriotas dessa mesma alma quando levam os filhos para dentro de campo na festa depois da vitória.

«Nunca esquecemos a nossa identidade», assumiu Chris Coleman depois do triunfo sobre a Bélgica. E dela, nesta seleção, faz parte também a memória de Gary Speed.