Meio artista, meio feiticeiro e a bailar como nenhum outro na bandeirola de canto. Definimos assim Roger Milla, num artigo publicado durante o último Campeonato do Mundo. E a saudade atingiu-nos em cheio.

O que falta em rigor ao falar de Milla, sobra em fantasia. O ponta-de-lança foi a personagem que todo o adolescente sonhou imitar em 1990 e 1994. Com 38 anos marcou quatro golos pela seleção dos Camarões no Mundial de Itália, aos 42 fez mais um nos EUA.

Perante o emergir de Vincent Aboubakar no ataque do FC Porto - dois golos nos últimos dois jogos -, o Maisfutebol ouviu em exclusivo as palavras do mago camaronês.

PLAY: Roger Milla, o feiticeiro faz falta à Copa

O que espera o mítico Milla do compatriota? Como tem assistido a esta explosão impulsionada pela lesão de Jackson?

Ao quarto número de telefone tentado, bingo! Avisam-nos, desde logo, que Milla não fala com jornalistas camaroneses. E que todas as chamadas são atendidas pelo assistente pessoal. Sem problemas, vamos em frente.

«Sobre o Aboubakar? Claro que falo. Estou muito orgulhoso dele», diz logo Roger Milla, num francês gingão e descontraído, como se tivesse uma bandeirola de canto à sua frente. «O golo que fez contra o Basileia é típico dele. De frente, com espaço, é muito forte».

«Estou orgulhoso do Vincent», continua Milla, a meio de uma reunião. «Só lhe falta dançar como eu (risos). Digo isto porque ele tem de ser mais alegre em campo, às vezes é demasiado tímido. Mas o futebol está todo lá, tem um potencial incrível».

«O Aboubakar tem mais dois ou três Mundiais pela frente»

102 internacionalizações, 28 golos ao serviço dos Leões Indomáveis. O registo de Roger Milla é invejável. Em 2007, aliás, o atacante foi nomeado pela Confederação Africana de Futebol o melhor futebolista desse continente nos últimos 50 anos.

Daí que a nossa questão seguinte nos tenha soado… mal.

O Aboubakar já é melhor do que o Roger Milla? O antigo internacional não desfez a simpatia. «Isso não sei (risos). Eu acho que ele tem um longo caminho pela frente. Está num grande clube, a jogar a Liga dos Campeões e é novo. Pode melhorar muito ainda».
 

Roger Milla no Inglaterra-Camarões do Itália90

Além de Roger Milla, há mais dois pontas-de-lança históricos nos Camarões. François Omam-Biyik e o nosso bem conhecido Samuel Eto’o.

Para chegar ao nível deles, Roger Milla pede «mais tempo» para Aboubakar.

«Como dizia, a qualidade está lá. É rápido, forte, remata bem, faz golos. Se nada de estranho se passar, o Aboubakar terá mais dois ou três Mundiais pela frente».

A ligação, longe de ser perfeita, cai. Antes ainda se escutam vozes agitadas, a chamar por Milla. O velho ponta-de-lança é atualmente embaixador do futebol camaronês, depois de ter trabalhado no Montpellier e no Tonerre, um emblema dos Camarões.

Já não há tempo, por exemplo, para falar de uma boa coincidência. O primeiro clube de Roger Milla na Europa foi o Valenciennes, de França, onde esteve entre 1977 e 1979.

31 anos depois, Vincent Aboubakar chegou ao mesmo clube. O Valenciennes foi a porta de entrada na Europa para o agora jogador do FC Porto. Foram três anos, 71 jogos e nove golos.

No FC Porto, os números revelam a tal relação de harmonia com a baliza: 14 jogos, 544 minutos, seis golos. O que dá um golo a cada 90 minutos. Que tal, monsieur Milla?