PLAY: o amor ao futebol nas notas de Sob Evariste Dibo

PLAY é um espaço semanal de partilha, sugestão e crítica. O futebol espelhado no cinema, na música, na literatura. Outros mundos, o mesmo ponto de partida. Ideias soltas, filmes e livros que foram perdendo a vez na fila de espera. PLAY.

SOUNDCHECK:

«SOB EVARISTE DIBO» - Sensible Soccers.
Um Dó e a bola severa já é serena. No Ré nasce a ginga, a fuga demencial para a esquerda, a travagem, o nó que cega até ao transe. E vai pela direita, claro. Mi e Dibo é uma tormenta. Ri e transtorna, peito para fora, pernas altivas e bamboleantes.

Vem o Fá e a indolência é imparável. Pozinhos de perlimpimpim, Sob Evariste Dibo e os seus pés de mágico. Pânico na defesa oposta, red alert, o Sol encandeia no drible derradeiro, o apogeu adivinha-se.

Lá na área das decisões, Dibo é um facínora desalmado, um fariseu do golo. Cai o guarda-redes para um lado, o mago marfinense decepa a propaganda anti-espetáculo. Baila comigo, connosco e Si é o epílogo perfeito.

Sob Evariste Dibo, o tributo dos geniais Sensible Soccers a uma personagem ideológica do futebol português nos anos 90. Senhor de uma técnica individual soberba, exalou perfume no Rio Ave entre 1996 e 1998 (47 jogos, 8 golos), fez uma perninha no Sp. Braga em 1999/00 e desapareceu do nosso radar.

A banda portuguesa, apaixonada por futebol e com ligações fortes a Vila do Conde, faz-lhe esta homenagem extraordinário no novo álbum, 8. Eu, como fã de Dibo, agradeço.

É a segunda vez que passam pelo Play. Depois de Missé-Missé, Dibo. Tenho a certeza que vão voltar.



PS: «So long, see you tomorrow» - Bombay Bicycle Club.
O novo disco destes senhores de Londres saltou diretamente para número um nas tabelas de vendas do Reino Unido. Um dos singles chama-se Luna e expurga todos os males da estupidez contemporânea num refrão inundado de luz.

Ao quarto trabalho de estúdio, o projeto de Jack Steadman rouba protagonismo às guitarras e entrega-o à eletrónica e aos samples. O mundo dos Bombay Bicycle Club continua fiel ao indie mas cada vez mais se enleia na world music. E não há mal nenhum nisso.



SLOW MOTION:

«NEXT GOAL WINS» – de Mike Brett e Steve Jamison.
A seleção de futebol da Samoa Americana já teve direito a reportagem especial no Maisfutebol. Falámos, até, com uma das suas estrelas. Johny Saelua, o primeiro transexual a figurar num jogo sob a égide da FIFA.

Este documentário invade a privacidade da auto-intitulada pior seleção do mundo, disseca os problemas insolucionáveis do selecionador Thomas Rongen e segue, sempre com bom humor, os preparativos do dia mais importante para os futebolistas da Samoa Americana.

O dia da primeira vitória de sempre num jogo oficial. 2-1 à rival de Tonga, na corrida para o Mundial2014. Saelua pintou os lábios, prendeu o cabelo e foi um herói na defesa. Ramin Ott marcou o primeiro golo, Rongen não acreditava no que os seus olhos viam.

O documentário tem estreia mundial em abril.



PS: «Her» - de Spike Jonze.
14 anos depois do inspiradíssimo Being John Malkovich, Spike Jonze confirma ser um dos realizadores mais criativos e imprevisíveis da sua geração.

Num futuro próximo, Theodore (Joaquin Phoenix) luta contra a depressão de um divórcio mal resolvido e uma vida profissional incomum: escrever cartas de amor para outras pessoas. E de repente surge Scarlett Johansson. Em bom rigor, a voz de Scarlett Johansson. E Theodore apaixona-se por um… sistema operativo.

Os diálogos são fortíssimos, a banda sonora é digna de vénia. A cena em que Phoenix e Johansson nos embalam com «The Moon Song» não me saem da cabeça.



VIRAR A PÁGINA:

« AJAX, THE DUTCH, THE WAR » - de Simon Kuper.
O futebol na Holanda durante a II Grande Guerra Mundial, a influência dos judeus na elevação do Ajax, o surgimento de Johann Cruyff, a influência decisiva do Holocausto na definição do desporto-rei num dos seus países mais fieis.

A obra é triunfal e confirma o talento incomum de Kuper, ele próprio filho de judeus sul-africanos. A polémica não podia faltar. O autor defende que a Holanda tinha o segundo maior movimento nazi nas décadas de 30 e 40.

Política, futebol, traições, guerra e sobrevivência. Um grande, grande livro.

«PLAY» é um espaço de opinião/sugestão do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Pode indicar-lhe outros filmes, músicas, livros e/ou peças de teatro através do e-mail pcunha@mediacapital.pt. Siga-o no Twitter.