Dezassete anos e quatro dias. Foi este o período exato do «reinado» de Joseph Blatter, um economista suíço, na FIFA, o órgão que tutela o futebol mundial. Muitos anos e muitas polémicas também pelo meio.
 
É verdade que o escrutínio sobre alguém que exerce um cargo tão mediático é feroz, mas Joseph Blatter, atualmente com 79 anos, foi passando entre as gotas da chuva. Até esta terça-feira.
 
O último escândalo de corrupção, que levou à detenção de sete membros da FIFA, abanou de vez com a estrutura. Blatter ainda teve fôlego para ganhar as eleições da última sexta-feira, mas demite-se agora, quatro dias depois.
 
É o fim de uma era iniciada em 1998, quando Blatter sucedeu ao brasileiro João Havelange, mais tarde também envolvido numa polémica de suborno. Aliás, Havelange foi mesmo destituído de presidente honorário da FIFA aquando desse caso.
 
Blatter, esse, nunca sofreu qualquer acusação. Nem agora, aliás. Mas nunca se livrou de suspeitas. De início a fim.
 
Aquando da sua eleição, de resto, foi sugerido que teria pago 50 mil dólares a delegados africanos para garantir o seu voto. Nunca nada foi provado. África e Ásia, de resto, sempre foram os principais apoios de Blatter a cada reeleição.  «Não vou abrir um inquérito a mim próprio...O processo eleitoral está terminado», limitou-se a dizer, na altura, perante o tema.

Mundiais sempre foram tema sensível
 
O aumento do número de vagas do Mundial de futebol, decidido quando Blatter era secretário-geral da FIFA, cargo que ocupou antes de ser presidente, deu, também, muito dinheiro aos países, até então, periféricos no futebol. Os Mundiais, cada vez mais lucrativos, passaram todos a muito custo pelo crivo social, no que à sua atribuição diz respeito.
 
Em 2006, por exemplo, a Alemanha ganhou a organização à favorita África do Sul quando um delegado da Oceânia desapareceu misteriosamente na última volta. Quatro anos depois, a prova foi mesmo em solo sul-africano, mas também aí surgiram suspeitas de pagamentos para garantir votos, algo que aliás ainda está a ser investigado.
 
Contudo, foram sobre os Mundiais de 2018, atribuído à Rússia, e 2022, ao inóspito Qatar, que recaíram as maiores suspeitas de sempre. A tal ponto que a FIFA criou uma Comissão de Ética, independente, liderada por Michael Garcia para investigar as votações. O relatório apresentado admitiu «movimentos estranhos» mas ilibou toda a gente. Michael Garcia garantiu que a versão apresentada publicamente foi adulterada e demasiado sintética. Pediu para ser publicada a versão integral, o que a FIFA negou. Demitiu-se.

Antes de Figo, Mourinho e Ronaldo

 
Mas as suspeitas ficaram. Como ficaram quando José Mourinho, em 2013, denunciou que «duas ou três pessoas» lhe garantiram terem votado nele na eleição de melhor treinador do mundo e o sentido de voto foi misteriosamente alterado. Goran Pandev foi um dos que assumiu ter votado em Mourinho o que levou a Federação da Macedónia a pedir desculpas por um erro técnico que mudou o voto.
 
Por fim, mediática e decisiva, até, na forma como é ainda hoje visto por grande parte dos portugueses foi a forma como manifestou a sua preferência por Lionel Messi face a Cristiano Ronaldo, aproveitando para ironizar com a postura em campo do português.

 
Outro português a enfrentar Blatter foi Luis Figo, que se candidatou às últimas eleições mas desistiu dias antes alegando que o que se iria passar em Zurique não seria «um ato eleitoral normal».
 
Mesmo com Michael Platini, presidente da UEFA, a pedir a sua demissão, Blatter avançou para as urnas ( «Agora é muito tarde», justificou), indiferente, e bateu a concorrência do príncipe jordano Ali bin al Hussein.
 
Parecia que ia ficar tudo na mesma. Quatro dias depois, contudo, chegou o fim.