Um livre que surpreendeu quase toda a gente, um golo que deixava o Benfica na certeza da liderança do campeonato e que depois de domingo acabou por manter a distância de três pontos para o FC Porto. O livre certeiro de Victor Nilsson Lindelof pode ter consequências enormes no campeonato português e tornou o sueco na figura da jornada para a redação do Maisfutebol.

Lindelof marcou num Sporting-Benfica importantíssimo para os encarnados. Ele que numa daquelas ironias da vida até cresceu a jogar com as cores do rival…num clube fundado em 1904. O emblema do Vasteras foi o primeiro que usou ao peito e, conta ao Maisfutebol quem viu, que foi lá, na Suécia, que começou a praticar um remate que deu frutos no sábado. Tinha 16 anos e até uma aposta ganhou!

Foto: Vasteras SK | Lindelof no clube sueco

Vieira mandou observá-lo

No dia em que se despediu do Vasteras em campo, Lindelof lá estava de camisola às listas verdes e brancas. Recebeu um ramo de flores e uma moldura com uma fotografia. Era ele próprio em campo pelo emblema da terra natal.

A partir desse momento, tudo na vida de Victor foi encarnado. Na realidade, já era, pois já tinha assinado pelo Benfica, em dezembro de 2011.

Sugerido ao presidente das águias, Luís Filipe Vieira deu ordem ao olheiro máximo do clube: ir até à Suécia observar o tal rapaz loiro de que lhe falaram.

Uma análise positiva e o jovem de 17 anos mudava-se para o Seixal. Era ali que ia crescer, tornar-se sénior e evoluir como futebolista. O livre apontado no José Alvalade foi, apenas, o último ponto desse constante desenvolvimento, dos juniores à equipa principal.

Surpreendeu pela novidade pública, mas no Seixal já não era notícia para ninguém. São as palavras do próprio treinador que o indicam: «Ninguém bate só porque tem fé.» É preciso trabalho, também. 

E ele começou bem cedo, lá em Vasteras [a pronúncia sueca é incrivelmente parecida com a de um continente na série Guerra dos Tronos, Westeros], «uma cidade pequena, bonita, mas em que neva muito», conforme nos refere Rodrigo Dantas.

O antigo médio de Belenenses, Varzim e Fátima rumou até ao São Bento. Disputou o campeonato Paulista, mas as saudades de Portugal, confessa, são bastantes e suficientes para querer voltar. Para ajudar um pouco, viu o Sporting-Benfica. E viu, claro, o ex-colega de equipa a fazer o empate. 

Rodrigo Dantas nos tempos do Belenenses

«Quando o conheci, ele era um miúdo ainda, mas muito dedicado. Sempre a empenhar-se nos treinos. Pensava que ele ia ser jogador numa das grandes equipas da Suécia, não pensei que ele acabasse com num clube de nível mundial como o Benfica», comentou Dantas ao Maisfutebol.

«Treinava comigo livres e penáltis»

O médio brasileiro chegou ao Vasteras em 2011, ainda a tempo de conhecer o adolescente Victor Nilsson Lindelof. «Era um rapaz muito tranquilo. Quando cheguei do Brasil, ele ajudou-me imenso, até para falar sueco. Na altura ele ainda estudava. Era tímido, mas como jogador tinha grande potencial», revelou Rodrigo Dantas.

A vida futebolística de Lindelof na Suécia é quase desconhecida. Mas Dantas estava lá com ele e agora explica em que é que o 14 da Luz era diferente dos demais...e apenas com 16 anos.

«Ele gostava muito de trabalhar. Curiosamente, trabalhei sempre com ele. Praticávamos muito depois dos treinos. Ele como era lateral-direito ficava a fazer muitos cruzamentos, mas depois fazia também finalização. Remates de cabeça e livres. Sempre se destacou dos demais por esse extra. Treinava comigo livres e penáltis no final. Mas como era muito miúdo, não tinha grandes hipóteses [de marcar nos jogos]. Olhe, recordo-me muito bem que depois de um treino ficámos a fazer finalização. Eu, ele e mais dois. Apostámos e tudo. E o miúdo é que ganhou!»

«Uma das minhas forças é carregar responsabilidade»

Lindelof chegou como lateral-direito, foi também médio-defensivo na B encarnada e afirmou-se como central na equipa principal. Renovou contrato com as águias e até foi isso que esteve na origem da polémica entre encarnados e Vasteras.

Porém, em dezembro de 2014, ainda jogava nas reservas encarnadas quando foi entrevistado por um jornalista freelancer sueco, Dan W Boter, no centro de estágios encarnado.

Lindelof fora capitão da seleção sub-21 tempo antes, por isso, a pergunta impôs-se: o jovem de Vasteras é um líder?

«Não tenho problemas em levantar a voz e liderar os meus colegas. Mesmo que tenha alguns problemas em estar aqui a dizer que sou um líder.  Mas uma das minhas forças é conseguir carregar responsabilidade nos meus ombros. Fico contente por acharem que tenho perfil de capitão.»

A família, Maja e Lisboa

Nas várias vezes que surgiu na TV sueca e no canal do clube, Victor Nilsson Lindelof reforçou sempre o que para ele é mais importante: a família. Tem dois irmãos mais velhos e um mais novo, Zacharias, que apareceu emocionado, na bancada, quando Victor foi campeão europeu de sub-21, frente a Portugal.

Naquela mesma entrevista em 2014, falava das diferenças entre dois povos. «Sou mais como os portugueses», disse, para sublinhar que também vê coisas em comum entre nós e os suecos.

Considera-se uma pessoa calma e relaxada e é fácil encontrá-lo a aproveitar Lisboa com a namorada, Maja. «Quanto tenho cá amigos, levá-los a estádios não é a primeiro coisa que penso fazer em Lisboa. Prefiro dar um toque pessoal daquilo que considero o melhor da cidade», contou há dois anos e meio, uma altura em que já sentia «Lisboa como casa».

Isto anda tudo ligado

O futuro de Victor Nilsson Lindelof não se sabe. Mas o passado do sueco é conhecido. E ao que parece, Lisboa é tão especial para ele que não só virou figura no mais importante dérbi da capital, como o primeiro golo que apontou na carreira foi noutro jogo com um emblema lisboeta.

Primeiro os números. Os registos dizem que Lindelof não marcou pelo Vasteras. Portanto, só o fez de encarnado. E amarelo, porque tem um golo pela Suécia, em outubro de 2016, no jogo de qualificação para o Mundial 2018, frente à Bulgária: apontou o último de um triunfo por 3-0.

O golo ao Sporting foi o quinto pelo clube da Luz e o segundo pela formação principal. Tinha marcado na época passada ao Paços de Ferreira.

Antes disso, fizera um golo ao Desp. Chaves, na II Liga em 2014/15 e em 2013/14 cometeu a ousadia de fazer dois numa só época! Um golo ao União da Madeira, outro ao Atlético, o primeiro da carreira.

Um jogador que iniciou a carreira num clube cujo equipamento é verde e branco, fundado em 1904…marcou o primeiro golo da carreira num dérbi lisboeta.

Pois, não foi com o Sporting. Nem foi de livre direto. Foi indireto. Parece rebuscado, não é? Até pode ser, admitimos, mas agora veja lá como se inaugurou o marcador no jogo em que Lindelof fez o primeiro golo da carreira… e depois não diga que isto não anda tudo ligado.