O Sporting entrava numa fase decisiva de um jogo de nervos diante do Tondela, quando aos 74 minutos, após uma recuperação de bola da sua equipa, Jhon Murillo, que oito minutos antes já havia ameaçado na área, abriu na direita para Jailson, que cruzou rasteiro para o próprio Murillo finalizar de primeira. O golo tondelense gelou os mais de 43 mil adeptos em Alvalade e a hecatombe não foi maior porque ao sexto minuto de compensação Campbell evitou a derrota.

Tal como na época passada (2-2), a formação beirã sairia do recinto leonino com um empate a uma bola. Cabe portanto a Murillo o papel de figura da jornada; por ter sido protagonista na surpresa e também pela curiosidade de um jogador cedido pelo Benfica ter roubado pontos ao Sporting.

Em declarações ao Maisfutebol, o avançado venezuelano de 21 anos explica que isso nem lhe passou pela cabeça na hora de celebrar em Alvalade um golo que lhe valeu muitas felicitações.

«Quando entrei em campo não estava a pensar que poderia ajudar o Benfica. É claro que o golo que marquei acaba por ajudá-los na classificação mas o que queria mesmo era ajudar o Tondela a ter um bom resultado e foi isso que conseguimos», explica Murillo numa declaração escrita, acrescentando que o dia seguinte foi de felicitações: «Senti o apoio das pessoas e depois do jogo recebi muitas mensagens de familiares e amigos do futebol. Nas ruas, aqui em Tondela, tenho sentido muito o carinho das pessoas que me incentivam muito e pedem para continuar assim e ajudar o clube.»

Entre as muitas felicitações, houve uma especial: a de Emilce Romana Asprilla, mãe de Jhon, que o criou sozinha, tal como aos irmãos, desde que se separou do marido.

Sonho encarnado e vinotinto

«Os meus pais separaram-se tinha eu cinco anos e fiquei a viver sempre com a minha mãe, que me apoiou muito para concretizar este sonho. Ainda ontem me ligou a felicitar-me pela exibição e pelo golo. Estamos sempre em contacto. Tenho cinco irmãos e também deles tenho apoio constante», conta Murillo, que cresceu a jogar futebol nas ruas e com os amigos, até despontar mais a sério no Zamora FC, clube da cidade de Bariñas, que é dirigido por Adelis Chávez, irmão do malogrado presidente da Venezuela Hugo Chávez.

O estado homónimo, na zona centro-oeste do país, é a região da qual é natural a família Chávez e a relação entre o Zamora FC e o poder consubstancia-se não apenas na ligação familiar, mas também no patrocínio da poderosa empresa de petróleos estatal PDVSA. Esta conexão ajudou à projeção desportiva deste clube fundado apenas em 2002 e que nas últimas três temporadas foi duas vezes campeão nacional e tem participado com regularidade nas competições continentais, como a Taça Libertadores e a Copa Sul-Americana.

Murillo foi campeão venezuelano em 2012/13 e 2013/14 e guarda boas recordações do clube que o catapultou para o futebol português.

«Cheguei ao Zamora com 16 anos e pouco a pouco o mister deu-me oportunidades. Tive muito carinho dos adeptos e do próprio presidente, que foi sempre muito correto comigo. Os hinchas do Zamora continuam a acompanhar-me nas redes sociais e dão sempre muito apoio sempre que jogo e sobretudo quando as coisas correm bem. Eles vêem-me na televisão», conta Murillo, que marcou um golo na sua estreia pela seleção principal, em fevereiro de 2015, mas desde então teve apenas mais duas internacionalizações: «É um orgulho tremendo vestir a camisola vinotinto. Tenho tido a felicidade de ser sempre convocado, mas não tenho jogado muito e gostaria que isso acontecesse mais nos próximos jogos.»

Murillo na seleção da Venezuela 

Esse é um dos grandes objetivos a médio prazo a par de poder vir a ter uma oportunidade no Benfica, apesar de Murillo estar de momento concentrado em «ajudar o Tondela a conseguir a manutenção»: «Se o conseguir, estarei sempre mais perto de poder ter a oportunidade que gostaria no Benfica, que, sim, seria muito importante para o meu crescimento enquanto jogador.» E a verdade é que na segunda época de cedência ao Tondela, Murillo parece estar no bom caminho para despertar a atenção do clube encarnado, com quem tem contrato até junho de 2020.

Além de um golo na Taça de Portugal (na goleada, por 0-4, frente ao Sertanense), em oito jornadas da Liga o venezuelano marcou três golos, tantos quantos em toda a época passada, que foram decisivos para a conquista de quatro dos seis pontos que a equipa orientada por Petit soma no campeonato.

Cumprida a primeira época de adaptação ao clube e ao futebol português, o entrosamento e a confiança são maiores e isso explica o maior sucesso nesta segunda época, sustenta Murillo ao Maisfutebol:

«Sinto-me bastante confiante e conheço melhor a Liga, porque já é o meu segundo ano e é importante ter essa experiência. O ano passado foi muito duro para mim porque saí da Venezuela pela primeira vez e tive de me adaptar à vida aqui e ao próprio futebol português. Deixar o teu país e a tua família aos 19 anos para te aventurares sozinho não é fácil. Agora sim, estou muito mais à vontade, confiante, pronto para uma época mais positiva para mim e para o Tondela.»