Quatro jogadores levantam os braços, mas só três celebram efusivamente. O outro até marcou o golo, mas é esse mesmo que não extravasa a euforia de meter a bola na baliza. Também não parece que seja um pedido de perdão. Até porque não é a primeira vez que acontece. É mais um ato de respeito.

O Sp. Braga subiu ao terceiro lugar do pódio, com Wilson Eduardo a marcar. O golo do jogador formado no Sporting, o quinto na carreira ao clube de Alvalade, deixou os minhotos no terceiro lugar e o leão a oito pontos da liderança. Por tudo que o aquele pontapé aos 69m44s implicou e pela história que trouxe com ele, o camisola 7 do Sp. Braga é a figura da jornada (ainda que os critérios para aferir o onze ideal não o coloquem lá), aqui visto pelos olhos de um «irmão» que poucos sabem que tem.

Isto começa tudo em Olhão

Na verdade, e como o Maisfutebol já relatou, a história futebolística de Wilson Eduardo começou no Porto. Passou depois pelo Sporting, Real (Massamá), Portimonense e Beira Mar. E volta ao Algarve, onde Wilson conhece Paulo, o outro irmão que tem para além do campeão europeu João Mário e o mais novo Hugo.

«Conhecemo-nos no meu primeiro ano no Olhanense. Começámos a jogar juntos e tivemos uma ligação forte, porque viajávamos muitas vezes juntos, íamos e vínhamos os dois de Lisboa para o Algarve. Nessa altura, os nossos pais quase não nos viam, porque estávamos sempre em casa um do outro.»

Estávamos em 2011/12 e foi aí a primeira vez que Wilson Eduardo marcou um golo ao Sporting, num empate (1-1)… em Alvalade. Na altura, o mesmo gesto de respeito, ainda que tenha avisado que queria marcar. Mais do que isso até, explicou porque o queria fazer.  

«Quando esse ano acabou no Olhanense, ele foi para a Académica, eu para a Naval. Continuou tudo igual, portanto, ele em Coimbra eu na Figueira da Foz e a viajar para Lisboa.»

Nessa altura também, Wilson Eduardo fez outro golo ao Sporting, desta vez de penálti. Já pedira uma oportunidade em Alvalade há algum tempo e à 22ª jornada da Liga 2012/13 quis voltar a dizer que devia estar do lado contrário.

Um ano depois, era lá que estava. Em Alvalade, enquanto Paulo Regula voltava ao Olhanense, no qual se conheceram e se tornaram família. Wilson Eduardo vestia por fim a camisola do Sporting na I Liga e fê-lo com impacto grande, apenas ofuscado porque Fredy Montero fez quatro golos ao Arouca (5-1, com Wilson a faturar e a fazer uma assistência).

Porém, na única época que fez de leão ao peito transformou-se num «patinho feio», conforme referiu alguém que viveu o período de perto e que o acompanhou no último episódio da história.

Paulo Regula conheceu Wilson Eduardo quando ambos jogavam no Olhanense

Paulo Regula é mais do que amigo de Wilson Eduardo. É ele próprio que o diz, porque sabe que não é exagero.

«Hoje em dia não é uma amizade simples. Somos família. Eu sou o outro irmão dele. Ele é tio da minha filha. E eu sou como um filho para os pais dele e ele para os meus. Tanto assim é que hoje passei o dia com os pais dele.»

Wilson Eduardo não é propriamente um desconhecido no futebol português. Pelo contrário, é alguém cujo passado já foi contado, até porque tem um irmão famoso.

Já o irmão que poucos sabem que tem desvenda um pouco sobre o 7 que meteu o Sp. Braga no pódio.

«É uma pessoa que não se dá a conhecer a toda a gente. Não por achar que é mais do que os outros, mas porque é reservado», garante Regula ao Maisfutebol.

«Ele teve de crescer rápido, desde pequeno, com dois irmãos mais novos. Foi ele que ajudou a família. Agora, para quem o conhece, tem dele tudo. Se eu lhe ligar agora a dizer que preciso dele cá, ele vem», assegurou o jogador do Atlético. Como quem se sente irmão faz, claro.

Regula é amigo, irmão e confidente. «Até por saberem dessa personalidade dele, os pais começaram a ver-me como outro filho.» Mas quer separar águas quando fala do futebolista Wilson Eduardo. É difícil, claro, mas o médio tem bem presente números para sustentar ideias e concordar com Abel Ferreira: era uma espécie de patinho-feio em Alvalade.

«O Wilson na minha opinião não teve as oportunidades que merecia. Não digo sorte, digo oportunidades. Melhor, reconhecimento. Não existiram muitos extremos portugueses nos últimos anos com os números dele na Liga. A fazer golos, a assistir, em várias épocas consecutivas. Desde o Olhanense que faz vários golos.»

Se juntarmos aqueles que apontou pelo Beira-Mar (no vídeo, o primeiro que fez no principal escalão), são 42 na liga portuguesa em 178 jogos no campeonato principal. E mais uns poucos na Holanda e Croácia, já agora, onde Wilson esteve cedido a Dínamo Zagreb e ADO Den Haag.

Regula não se fica pelos golos, porém. «Mesmo no Sporting, com os minutos que tinha, fez bons números. Já tive centenas de colegas e não me recordo de muitos que tivessem os pormenores que vi nele. Com oportunidades e o reconhecimento merecido, não sei como teria sido. Mas ele ainda vai a tempo. O que está a acontecer em Braga já é reconhecimento. O Braga tem cerca de 40 golos, ele está em quase metade entre golos, assistências e penáltis. É uma opinião, claro, mas creio que se o Sporting tivesse tido mais calma, ele estaria a fazer isto no Sporting.»

Confiança a topo

O Sp. Braga acolheu Wilson Eduardo em 2015/16 e a tradição de marcar ao Sporting manteve-se. Fez um golo no triunfo por 4-3, na Taça de Portugal, fez outro na derrota por 3-2 na Liga e neste domingo o quinto no total aos leões. Um golo que abalou o universo leonino, mas que levantou o Sp. Braga e colocou os holofotes no camisola 7 dos minhotos.

«A nossa família está contente. Os pais e o João Mário também, pelo irmão. Todos nós sabemos que o Wilson merece isto há muito tempo.»

Apesar de, claro, o golo de Wilson ter sido a quem o formou e acolheu em 2004, após a mudança da família para Lisboa.

«Marcar ao Sporting é sempre um pau de dois bicos. Tem um carinho especial pelo clube que o formou e pelos adeptos. Mas em campo tem de fazer pela equipa em que joga. Ele não pode estar a pensar no Sporting, tem de pensar nele e no Sp. Braga.»

Wilson tem feito isso mesmo. Com oito golos na época, esta é já uma das mais produtivas da carreira nesse aspeto (na Académica marcou 11). Pedro Santos tinha sido o elemento de maior notoriedade na equipa minhota no início da época, mas com o abrandar do esquerdino, Wilson chegou-se à frente. Ele sempre esteve lá, na verdade, porque com o golo em Alvalade tornou-se no melhor marcador da equipa: quer no campeonato, quer na temporada.

«Eu atribuiria a esta época o momento-chave, em termos de mostrar ao mundo as coisas que faz há muitos anos. Porque como está o Sp. Braga, que luta com os três grandes, será mais falado», admitiu Regula.

Para além disso, Wilson Eduardo «está com muita autoestima» e isso transparece. Quando falamos pelo telefone, vejo logo nas primeiras palavras como ele está. É imediato, conheço-o muito bem. E sinto-o muito, muito confiante.» Palavra de irmão.