Há três coisas que o futebol deve agradecer depois do Benfica-Sporting deste sábado:

- A qualidade do jogo. "Intenso" e "táctico" têm sido adjectivos encontrados, nos largos últimos anos, para disfarçar a fraca qualidade técnica da generalidade destes grandes jogos em Portugal. Na Luz, os mesmos adjectivos são válidos e não constituem qualquer favor. Ao contrário de opiniões que escutei no rescaldo, espalhadas pelas várias televisões, acho que o derby foi um jogo de muito boa qualidade, espelhada com nitidez no considerável número de oportunidades de golo criadas.

- O talento. Aimar, velho conhecido, e Carrillo, revelação em marcha, exemplificam bem o que gostamos de ver nos estádios de futebol. Houve muito mais jogadores em bom plano, estes servem apenas para mostrar que em Portugal ainda sobra qualidade. Da solidez dos guarda-redes (mesmo com o brinde de Artur que Elias não aproveitou) ao labor do meio-campo, jogou-se futebol na Luz. E isso, jogar futebol, é coisa que se faz muito melhor quando os jogadores são bons.

- O discurso de Domingos. O Benfica é uma equipa em velocidade de cruzeiro, da qual já sabemos no essencial o que esperar a cada momento. Residia no Sporting a grande incógnita, depois de um período feliz ao qual faltava um teste de fogo. É verdade que não o passou do ponto de vista do resultado, que ainda é o mais importante, mas é consensual que esteve em campo uma candidato ao título, mesmo que numa fase de crescimento muito mais prematura e permeável ao erro nos momentos decisivos. Domingos percebe e transmite esta ideia com clareza. Mas mais do que isso: depois de perder na casa do maior rival, é capaz de começar uma entrevista com elogios às três equipas em campo. Não é para todos.

Mas também há, na ressaca do derby da Luz, registo de três coisas que o futebol dispensa:

- Arruaceiros. Relacionar jaulas, gaiolas e opressão com fogo posto é querer justificar o injustificável. Com ou sem caixas de segurança (pronto, também é escusado chamar "zona de conforto"...), com ou sem fossos, com mais ou menos policiamento e maior ou menor incontinência verbal dos dirigentes, a verdade é que há quase sempre uma dúzia de pessoas que não entende o que é viver em sociedade. Isto ultrapassa o futebol nas causas, mas traz-lhe consequências muito desagradáveis. Ao pé disto, os lasers são um mal menor. Mas também revelador de uma certa dificuldade em viver com os outros à volta. Quando houver coragem política, nos clubes e no Parlamento, talvez se resolva o problema.

- Dirigentes irresponsáveis. São um dos males mais antigos do futebol e não dão sinais de querer desaparecer, venham eles de calças de ganga ou enfiados em fatos à medida, tenham a quarta classe ou diplomas universitários, raiz popular ou sangue azul. Depois de três semanas a discutir jaulas e bilhetes e após 90 minutos de um bom jogo, Paulo Pereira Cristóvão chamou pré-histórica a uma estrutura moderna, João Gabriel glosou com o fosso de Alvalade de uma forma tão baixa e irresponsável como uma rubrica do canal Q fizera logo após o incidente que feriu dois adeptos do Sporting. Temos de saber viver com isto, não é? Mas não podemos ao menos ligar-lhes menos?

- Expulsão de Cardozo. Já sei que nos livros vem tudo escrito e que João Capela agiu em conformidade. Mas tenho um respeito profundo pela chamada 18.ª lei, a do bom senso, e acho que sobretudo nestes jogos é preciso saber aplicá-la. Não há necessidade de mudar a história de um jogo por causa de um protesto a quente, até porque os ímpetos estavam controlados e não parecia haver risco de descarrilamento.

*Editor TVI

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