Foi como campeão da Europa e do Mundo que Ricardinho anunciou a retirada da seleção nacional. O Mundial da Lituânia, seis meses depois da recuperação a uma rotura num tendão foi, por assim dizer, a última dança do craque português com as quinas ao peito. 

Ricardo Filipe da Silva Duarte Braga cresceu em Gondomar, numa família humilde na qual nem sempre havia comida na mesa. Ao contrário dos seus amigos, que caíram na tentação da droga e do crime, Ricardinho driblou o destino e foi eleito por seis vezes o melhor futsalista do mundo.

Aos 13 anos, o capitão da seleção nacional viu um incêndio levar-lhe os seus pertences e obrigou-o, juntamente com a sua família, a mudar-se para um bairro social de Valbom. Apesar dos infortúnios, Ricardinho agarrou-se à bola. A guardiã de todos os seus sonhos. 

Perdeu-se, porventura, um bom jogador de futebol - foi recusado nas captações do FC Porto devido à altura -, mas ganhou-se um tremendo jogador de futsal. O melhor português de sempre, aliás. 

Após o luto pelo sonho frustrado de ser futebolista, o miúdo que dava toques com a fruta trazida pelo pai do trabalho chamou a atenção da técnica do Gramidense, Carolina Silva. Assim começou a carreira de Ricardinho no futsal e, volvidos três anos, juntou-se ao Miramar, clube pelo qual se sagrou campeão nacional de juniores e se estreou como sénior.

A ascensão de Ricardinho foi proporcional ao seu talento. Corria o ano de 2003, quando o Benfica lhe ofereceu um contrato de 2.250 euros. Com a ajuda de André Lima e de Arnaldo, o esquerdino adaptou-se à vida lisboeta apesar de viver apenas com 250 euros do vencimento, enviando o restante para Valbom. 

Depois de quatro campeonatos, três Taças de Portugal e quatro supertaças em sete épocas na Luz, Ricardinho rumou aos japoneses do Nagoya. Em três anos celebrou as conquistas de três Ligas e uma Taça da Ásia.

A magia de Ricardinho merecia, porém, pavilhões europeus. Regressou, sem surpresa, ao Benfica em 2011 para conquistar uma dobradinha. Os dribles desconcertantes, o talento inato com a bola despertou o interesse dos espanhóis do Inter Movistar. A mudança para Espanha ocorreu em 2013.

O nortenho foi um autêntico papa títulos no emblema de Madrid entre 2013 e 2020: conquistou seis Ligas, três Taças de Espanha, uma Taça do Rei, três Supertaças e duas Ligas dos Campeões. Pelo meio, Ricardinho foi eleito cinco vezes o melhor do mundo. 

Se a vida na quadra lhe corria de feição, a vida pessoal roubava-lhe o sorriso. O pai sofreu uma amputação da perna esquerda e o irmão mais velho foi condenado a nove anos de prisão por furtos e desobediência. 

O jogador dos franceses ACCS conquistou os títulos mais saborosos da carreira com Portugal: o Euro, em 2018 e o Mundial, em 2021. Foi o culminar de uma carreira e de um percurso feito a driblar o destino. 

Despediu-se o homem e o jogador, mas a obra será eterna.