De Londres para Nodar, pequena aldeia do concelho de São Pedro do Sul. O trajeto, absolutamente incomum, foi percorrido por Duncan Whistley. Em nome da arte e do futebol.

Duncan é um famoso artista inglês, especializado na gravação e manipulação de sons. Licenciou-se em Belas Artes, especializou-se em fonografia e é apaixonado pelo Coventry City, um histórico do futebol britânico.  

O Grupo Desportivo Parada, emblema dos distritais de Viseu, foi o alvo de um dos seus trabalhos. Uma relação inesperada, sim, e explicada na primeira pessoa por Whitley ao Maisfutebol.

Uma relação que gerou um projeto de som ainda em exposição numa galeria londrina. Chama-se «Joga, isso!» e disseca a matriz sonora do futebol no seu estado mais puro: o futebol amador, jogado no pelado.



«Como cheguei ao interior de Portugal? Bem, o convite foi-me feito pela Binaural/Nodar, uma entidade dedicada à arte dos sons e à pesquisa social em contexto rural», explica o artista inglês ao nosso jornal.

«Eles desafiaram artistas de todo o mundo a fazer trabalhos que tivessem a aldeia de Nodar como pano de fundo. Eu amo o futebol e já tinha utilizado técnicas de captura de som no Coventry e no Brighton. Por isso perguntei ao Luís Costa, diretor da Binaural, se havia algum clube na região. Foi assim que ele me indicou o GD Parada».  

O Parada está na I Divisão Distrital, mas chegou a brilhar no escalão superior, na Honra. Luís Costa completa a informação com mais alguns dados.

«O trabalho partiu de uma proposta minha, uma vez que a aldeia de Parada de Ester, casa do GD Parada, é vizinha da nossa aldeia de Nodar e na altura este clube era uma sensação na Honra da AF Viseu. Em poucos anos subiu três escalões, com condições logísticas bem humildes».

E assim ficou decidido. Duncan Whitley deixou o atelier em Londres e partiu para a casa do Grupo Desportivo Parada.

Um microfone a apontar para o pelado

A equipa técnica e todo o plantel do Parada mostraram-se entusiasmados com a presença de Whitley. O artista gravou várias sessões de treino e jogos oficiais do clube.

«O que mais me interessava eram os ritmos e as coreografias da repetição dos exercícios. Mas, obviamente, acabei por me envolver emocionalmente com os resultados da equipa, até porque jogavam sempre contra clubes de maior dimensão»
, acrescenta Duncan Whitley.

«O Parada jogava num campo de terra muito pobre. O treinador chamava-se Paulo e tratava de tudo. Até do transporte e das refeições da equipa. Nos jogos não havia mais de 40 ou 50 adeptos. Em Inglaterra tal é impensável e tudo isso me envolveu com a equipa».  
 

Duncan Whitley a gravar um jogo do GD Parada

Além dos berros, do contato entre a bola e as chuteiras, do apito do árbitro, dos palavrões e do vocabulário tão comum no futebol, Duncan Whitley gravou várias entrevistas.

«Recordo uma conversa incrível com o Carlão, capitão do Parada. Ele dizia que os outros clubes estavam desesperados por ver o GDP a descer de divisão, só para não terem de jogar naquele pelado duro».

No final das gravações, que duraram várias semanas, Duncan Whitley recolheu material suficiente para criar o «Joga, isso!» e o «G.D. Parada», este também em vídeo. Os dois trabalhos foram lançados no final de 2013.

«É um retrato do clube. Penso que captura algo sobre a peculiaridade daquele lugar, da sua identidade. Da forma como eles se envolveram com o jogo, mesmo a este nível».



«O que mais me atrai artisticamente é a ligação entre clube e lugar»

Agora à distância, Duncan Whitley continua a seguir a vida do GD Parada, enquanto prepara um projeto muito ambicioso sobre o clube do coração, o Coventry City.

«Foi fundado em 1883, ganhou uma FA Cup e está um verdadeiro caos. O filme explora o início da relação entre o Coventry e os proprietários atuais (um fundo chamado SISU)», explicita Duncan.

«Estes senhores decidiram tirar o clube da nossa cidade e levá-lo para Northampton, a 50 quilómetros. Não podia correr bem. Uma das coisas que mais me atrai artisticamente no futebol é a ligação entre clube e lugar, a ideia de casa»
.

Duncan Whitley, romântico e idealista inveterado, despede-se com mais uma ideia. «O futebol é um anacronismo nesta era globalizada. As pessoas valorizam muito o sentimento de posse, seja no futebol amador ou profissional. Adoro esse vínculo adepto-clube».