ARNHEM - Depois da eficácia goleadora, a fortuna. Decididamente, a Selecção portuguesa está a apresentar neste Europeu argumentos que não lhe são de todo habituais. A vitória sobre a Roménia marca, para além da vitória no Grupo A, graças ao resultado do Inglaterra-Alemanha, um distanciamento em relação à imagem de equipa simpática, ofensiva e sedutora, mas com evidentes fraquezas competitivas. E as circunstâncias em que foi obtida, com um golo de bola parada após 90 minutos de futebol táctico e irritação nas bancadas, faz lembrar um acerto de contas com a justiça, em relação à forma como esta mesma Roménia tinha travado o passo a Portugal na fase de apuramento, nas Antas. 

Abstraindo da importância do resultado, este não é um triunfo para pendurar no peito com orgulho, como o conseguido diante da Inglaterra. O previsível encaixe táctico conseguido pelos romenos, mestres na arte de nivelar o jogo por baixo, controlando o adversário por aquilo que não lhes deixa fazer, cedo encaminhou os acontecimentos para um ritmo sonolento, após 15 minutos iniciais em que a selecção portuguesa, com Secretário no lugar do lesionado Abel Xavier, surgiu embalada pela vitória de segunda-feira. 

O regresso do futebol «realista» 

Talvez tudo tivesse sido diferente se, logo no início, dois foras-de-jogo mal assinalados a Nuno Gomes e João Pinto, em situação muito favorável, nunca tivessem visto a luz do dia. Talvez. Mas essa é apenas uma suposição pouco realista. E foi o conceito de «realismo» que marcou o ritmo do jogo, do princípio ao fim. 

Com Figo manietado por Chivu e Rui Costa a sofrer a pressão de Galca, não houve possibilidades de reeditar o carrossel mágico de Eindhoven. Muito cedo os artistas perceberam que não seria dia para grandes festas. Tendo a circulação de bola condicionada, Portugal começou a recorrer aos passes longos, quase sempre controlados pela estrutura defensiva romena. 

Porém, apesar de necessitarem mais da vitória, estes apostavam na lei do esforço mínimo, preocupando-se em antecipar os movimentos portugueses e confiando apenas em algum rasgo de génio de Hagi ou numa movimentação mais conseguida de Ilie ou Moldovan (muito bem anulados pelos centrais portugueses). E assim o xadrez das tácticas tomou o lugar do futebol. 

Alterações ineficazes 

Até ao intervalo, nunca mais a Selecção se aproximou da baliza de Stelea. E, com dez minutos da segunda parte, Humberto decidiu mudar algo, colocando Sérgio Conceição na direita (para abrir mais o jogo ofensivo) e Sá Pinto no eixo (para conseguir um jogo mais ligado com o meio-campo). Mas nada ficou resolvido: Sá Pinto não entrou bem no jogo, Chivu neutralizou Sérgio Conceição com a mesma segurança com que o fizera em relação a Figo, e a pressão romena continuava a não deixar que Portugal saísse a jogar desde trás. 

A partir dos 70 minutos, tornou-se claro que só um lance de bola parada poderia evitar que o jogo se encaminhasse para o 0-0 anunciado, tanto mais que a Roménia nunca mostrou vontade de forçar a nota. Portugal, conformado, paciente e a dar sinais de cansaço (mais evidentes em Rui Costa e Figo) também não parecia dispor de argumentos para ir mais além.  

Costinha, o improvável fantasista 

Por isso, ninguém ficou surpreendido quando, a três minutos do fim, Humberto colocou em campo Costinha, no que era claramente uma opção «realista» para reforçar a solidez do meio-campo. Quem poderia adivinhar que, no último minuto do período de compensações, seria o próprio Costinha a corresponder, de cabeça, a um livre apontado por Figo, marcando o golo que garantia a vitória e o apuramento para os quartos-de-final? 

Na sua estreia nos grandes palcos, o médio do Mónaco resgatava-se para sempre do anonimato que até aqui o perseguia como uma sombra. Foi esse o único instante de fantasia, num jogo baço e comprido, como um relatório de contas. A festa nas bancadas do Gelredome, dominadas pela presença portuguesa, tinha sabor a desforra perante o destino: quantas vezes este mesmo filme, passado ao contrário, tinha condenado equipas portuguesas no passado? 

Para a satisfação ser total faltou, é claro, a magia daquele futebol dançado frente aos ingleses. Mas são precisos dois para a dança. Ontem, esta ficou adiada por falta de par. 
 

FICHA DO JOGO 

Portugal, 1-Roménia, 0 

Estádio Gelredome, em Arnhem (Holanda)

Árbitro: Gilles Veissière (França) 

Portugal: Vítor Baía; Secretário, Fernando Couto, Jorge Costa e Dimas; Paulo Bento e Vidigal; Figo, Rui Costa (Costinha, 85 m) e João Pinto (Sérgio Conceição, 55 m); Nuno Gomes (Sá Pinto, 55 m).

Treinador: Humberto Coelho. 

Roménia: Stelea; Contra, Popescu, Filipescu e Chivu; Galca; Petrescu (63 m), Munteanu e Hagi; Moldovan (Ganea, 68 m) e Ilie (Rosu, 77 m).

Treinador: Emeric Jenei. 

Ao intervalo: 0-0

Marcador: Costinha (90 m).

Disciplina: cartão amarelo a Figo (29 m); Hagi (15 m), Petrescu (21 m) e Contra (26 m).