De manhã, o encontro com o rei Eusébio, com quem por várias vezes cruzou talentos nos relvados da Europa, em Ajax-Benfica que entraram para a lenda. À tarde, o encontro com o presidente Jorge Sampaio, para uma conversa sobre futebol ¿ «uma paixão comum», como o próprio Cruijff salientou à saída do palácio de Belém ¿ e o seu papel na sociedade. «O vosso presidente também conhece muitos casos de grandes jogadores que não tiveram o apoio devido após o final de carreira e isso ajudou-me a expor os meus conceitos sobre o enquadramento dos desportistas na vida activa». 

Mas, estimulado pela conversa com Sampaio, Cruijff aceitou, pela primeira vez, falar de outros temas mais específicos: «Falámos de tudo um pouco: o Mundial 2002, o Euro-2004 em Portugal... e Figo, claro». O actual número 10 dos merengues foi, recorde-se, escolha prioritária de Cruijff na última época em que este orientou o Barcelona: «Já o tinha referenciado há muito tempo, mas a confirmação absoluta surgiu em Toulon, em 1992, numa selecção portuguesa de grande qualidade. Ele tinha então 21 anos e, juntamente com Rui Costa, e mais um ou outro jogador, tinha tudo para conseguir uma carreira ao mais alto nível. Pessoas que trabalhavam comigo de perto continuaram a acompanhá-lo em Portugal, até que finalmente, em 1995, foi possível levá-lo para a Catalunha». 

A pergunta é inevitável: o próprio Cruijff esperaria tanto do seu novo recruta? «Sempre acreditei nas suas qualidades, mas não há dúvida de que deu um passo muito difícil ao sair de Portugal para a pressão esmagadora de Barcelona. Conseguiu superá-la, impor-se em toda a linha, e agora está bem no topo». Mas as atenções de Cruijff não se esgotam no novo ídolo do Bernabéu, como se percebe no à vontade com que fala de Rui Costa, por sua própria iniciativa: «Rui Costa seguiu um caminho mais tranquilo, com muitos anos na Fiorentina, onde a pressão é menor. Agora, no Milan, vai ter finalmente, de provar a sua qualidade ao nível mais alto de exigência e pressão». 

Solicitado a comentar as qualidades da selecção portuguesa ¿ que, recorde-se, afastou a sua Holanda do Mundial-2002 ¿ Cruijff foi pragmático, deixando uma alfinetada de passagem a Louis Van Gaal, com quem mantém de há muitos anos a esta parte uma relação difícil: «Portugal tem hipóteses de ganhar o Mundial, a Holanda não, porque nem sequer lá está», afirmou com ironia. 

Depois, mais a sério, um elogio: «A vossa selecção é tecnicamente muito boa, e só precisa de ter confiança em si própria. Mas um Mundial é um torneio imprevisível, decidido num período muito curto. Há lesões, problemas de adaptação, e toda uma série de factores difíceis de controlar. Além disso há o handicap da inexperiência, que não se coloca em países como Itália, Argentina ou Brasil. Mas, repito a vossa selecção é forte, e tem hipóteses de ganhar», concluiu à despedida.