A História de Um Jogo é uma rubrica do Maisfutebol. Escolhemos um dos encontros da Liga portuguesa e partimos em busca de histórias e heróis de campeonatos passados. Às quinta-feiras, de 15 em 15 dias.
Moreira de Cónegos. O Sporting sabe de cor e salteado o grau de dificuldade nas visitas à pequena localidade minhota. Para a Liga, os leões têm no bloco de notas um histórico de dez jogos em casa do Moreirense e um saldo positivo mas, ao mesmo tempo, enganador.
Expliquemo-nos. Nos dez Moreirense-Sporting do campeonato nacional, os lisboetas têm seis vitórias, três empates e uma só derrota. O que os números escondem, como em tantas outras vezes, são as armadilhas que o tapete do Comendador Joaquim de Almeida Freitas costuma camuflar.
Nesses dez jogos, aliás, só por uma vez [abril de 2015], o Sporting ganha sem ter de puxar muito pela cabeça: 1-4. Nos restantes duelos na casa axadrezada, tudo muito equilibrado, tudo a exigir uma boa dose de sofrimento e expetativa até ao apito final.
A dez jogos do final da Liga, Ruben Amorim sabe, melhor do que ninguém, que o Sporting tem aqui um belo enigma para solucionar (segunda-feira, 21 horas).
O SPORTING EM MOREIRA DE CÓNEGOS
24 de Fevereiro de 2003 | 1-2 (V) |
20 de setembro de 2003 | 1-0 (D) |
18 de abril de 2005 | 1-3 (V) |
26 de novembro de 2012 | 2-2 (E) |
27 de abril de 2015 | 1-4 (V) |
16 de abril de 2016 | 0-1 (V) |
12 de fevereiro de 2017 | 2-3 (V) |
23 de setembro de 2017 | 1-1 (E) |
12 de agosto de 2018 | 1-3 (V) |
6 de julho de 2020 | 0-0 (E) |
Na noite de 20 de setembro de 2003, o herói chama-se Manoel. Avançado de alta estatura, elegante, que em 2005 haveria de ser contratado pelo… Sporting. É ele o responsável pela única vitória caseira do Moreirense sobre o Sporting para o campeonato. 1-0, golo aos 90+3 minutos.
Manoel tem agora 43 anos, é empresário de futebolistas e vive no Brasil. O Maisfutebol apanha-o numa viagem entre Minas Gerais e São Paulo, na rodovia Fernão Dias. A velocidade da memória é exemplar.
«Estava uma noite de muita chuva e um belo ambiente no estádio. Fomos muito superiores no primeiro tempo e o guarda-redes Ricardo teve de fazer duas ou três defesas boas», recorda o antigo avançado dos clubes que se defrontam na segunda-feira.
«Depois do intervalo, o Sporting melhorou bastante e ainda atirou duas bolas ao ferro [Silva e Lourenço], mas o Moreirense nunca se desorganizou e no final eu tive a felicidade de ser o herói do jogo.»
Manuel Machado é o treinador do Moreirense, Fernando Santos é o homem do leme leonino. O único estrangeiro na equipa inicial dos cónegos é, precisamente, Manoel. No lado do Sporting, o engenheiro aposta em três centrais [Quiroga, Beto e Polga], com os laterais Luís Filipe e Rui Jorge – ele mesmo, o atual selecionador dos sub21 nacionais – a darem largura e projeção atacante.
Toñito e João Vieira Pinto jogam no apoio ao avançado Elpídio Silva, o pistoleiro. A única bala certeira é, contudo, disparada por Manoel. Um golo de bela execução, sim senhor, mas envolvido em alguma polémica. Polémica, a parceira inseparável do futebol português.
É verdade, houve protestos e o meu golo já fora de horas. Começou tudo num canto a favor do Sporting. Eles reclamaram um penálti sobre o Silva e depois uma carga do Lito sobre o Anderson Polga. A meu ver não existiu nenhuma falta», defende Manoel.
«O Lito continuou pela esquerda e cruzou muito bem. Eu vi o Ricardo a sair da baliza e antecipei-me. Dei um toque em jeito na bola e fiz-lhe um pequeno chapéu. Resolvi o jogo já muito depois dos 90 minutos.»
O jogo acaba com Manoel em ombros e os jogadores do Sporting a atirarem-se sobre o árbitro Martins dos Santos. A noite de glória coloca Manoel nas primeiras páginas e, um ano e meio mais tarde, o avançado é contratado pelo emblema de Alvalade.
«Passei a ter contactos regulares com as pessoas do Sporting. Em junho de 2005 assinei mesmo um contrato de três épocas com o clube e fiz toda a pré-época com o plantel», revela Manoel que, no entanto, acabaria por nunca jogar de leão ao peito.
«Antes do jogo contra a Sampdoria, no final da pré-temporada, o professor José Peseiro veio falar comigo e disse-me que pretendia manter o Elpídio Silva e que o melhor para mim era ser emprestado. Assim foi.»
Manoel cria alguma expetativa nos adeptos leoninos, mas a concorrência para o lugar de ponta-de-lança é forte. «Havia o Liedson, o Pinilla, o Deivid, o Sá Pinto e o Silva para a minha posição. Falámos e decidimos aceitar a proposta do Vitória de Guimarães.»
Formado entre o Internacional de Porto Alegre e o Vitória da Bahia, Manoel tem uma experiência no PSV Eindhoven e chega a Portugal em 2001. Começa no Vitória de Guimarães e ruma depois ao Gil Vicente (2001 a 2003) e ao Moreirense (2003 a 2005).
O brasileiro marca 31 golos em Portugal, mas nenhum tão importante e mediático como aquele no Moreirense-Sporting de 2003. Na próxima segunda-feira, os leões voltam a um campo sempre complicado.
FICHA DE JOGO:
20 de setembro de 2003
Estádio Comendador Joaquim de Almeida Freitas
Árbitro: Martins dos Santos
MOREIRENSE: Nuno Claro; Primo, Ricardo Fernandes, Sérgio Lomba e Tito; Lima (Orlando, 72), Castro (Cristián Uribe, 68), Jorge Duarte e Vítor Pereira; Armando (Lito, 78) e Manoel.
Não utilizados: João Carlos (GR), Nuno Mendes, Bertinho e Demétrios
Treinador: Manuel Machado
SPORTING: Ricardo; Luís Filipe, Quiroga (Clayton, 87), Anderson Polga, Beto e Rui Jorge (Rodrigo Tello, 78); Custódio, Fábio Rochemback e Toñito (Lourenço, 57); João Vieira Pinto e Elpídio Silva.
Não utilizados: Nelson (GR), Hugo, Paulo Bento e Pedro Barbosa
Treinador: Fernando Santos
Golo: Manoel (90+3)
VÍDEO: o resumo do Moreirense-Sporting de 2003 (imagens RTP)