Um conto da Disney. O menino sonha em jogar, sonha em estar com os melhores, em conhecer a princesa e em viver no castelo. Passa a infância, passa a adolescência, passam os verdes anos dos trinta e o menino não larga as saias da madrasta. Sonhos adiados, vida de anseios por cumprir.
A vida corre, o menino mais-sapo-do-que-príncipe está quase no fim da história e a história não é um livro para adormecer. Ele, o menino Alberto agarra o sonho pelos colarinhos, monta a cavalo, rapta a Cinderela e quer com ela viver feliz para sempre. De preferência, em Cádiz.
A Disney não é mais do que a liga espanhola, o castelo é o Estádio Ramon Carranza e o pequeno protagonista é agora um homem feito. Chama-se Alberto Cifuentes e tornou-se no dia 20 de setembro de 2020 no rookie mais velho a estrear-se no principal escalão do país vizinho: Alberto teve de esperar 41 anos e 114 dias para cumprir este desígnio.
«Estreei-me, o Cádiz ganhou ao Huesca e não sofri nenhum golo. No ano passado, o ano da subida, fiz 37 jogos e acho que estive muito bem. Mas este é o jogo que aguardava há mais de 20 anos», afirmou o bom do Cifuentes ao El Mundo.
Os 20 anos não surgem em vão. Fazem sentido. Porquê? Quando tinha 20 anos, Alberto Cifuentes fez parte do plantel do Maiorca na primeira divisão, mas a concorrência de três argentinos foi demasiado forte: Germán Burgos, Carlos Roa e Leo Franco não deixaram nada para o menino Alberto jogar.
Cifuentes teve de sair do paraíso balear para ser feliz. Passou pelo Múrcia, foi dois anos para o Rayo Vallecano, passou duas épocas em Salamanca, voltou a Múrcia, passou rapidamente por Lorca e fez uma época na primeira divisão da Polónia (Piast Gliwice).
Em 2015, Alberto Cifuentes chegou ao Cádiz. Cinco anos depois, aí está a recompensa maior e o baile de debutante numa das melhores ligas do planeta. «Estreei-me à custa do trabalho e não do talento. Ainda tenho de melhorar algumas coisas. Nesta fase jogo mais com a cabeça do que com o corpo», confessa o homem nado e criado em Albacete.
«Quero melhorar, sim. A vontade de evoluir surge em mim, independentemente da idade. Tudo é diferente. Aos 18 anos, na baliza do Albacete, nem sabia o que queria da vida. Agora tenho um bebé de um ano em casa e já não saio à noite. Prefiro mil vezes jantar fora com amigos e dormir a sesta com o meu bebé. É o que faço fora do futebol.»
Em 23 anos de sonhos e balizas, Alberto Cifuentes viveu quase tudo o que havia para viver, mesmo jogando nos escalões secundários. Agora que chegou onde queria, Alberto admite que esteve perto, muito perto de abandonar o futebol aos 35 anos.
«Voltei da Polónia, não tinha convites e ponderei mesmo deixar os relvados e fazer outra coisa. O Cádiz, que estava então na Segunda B, desafiou-me e lá voltei. Encantei-me com o clube, o estádio, os adeptos. Valeu a pena.»
Aos 41 anos, Cifuentes ainda tem sonhos. Quer manter o Cádiz na Primera, quer fazer muitos jogos e quer continuar a sentir-se jovem. O portero pode não ser o príncipe perfeito encantado, mas também há muito deixou de ser um sapo.
Além de ser o mais velho estreante de sempre, Alberto Cifuentes é também o terceiro mais velho da história a jogar na liga espanhola. Mais velhos do que ele, só Ricardo López, outro guarda-redes, e o britânico Harry Lowe, que nos anos 30 foi obrigado a entrar em campo porque o clube que treinava, a Real Sociedad, ficou sem jogadores.
OS MAIS VELHOS A JOGAR NA LIGA ESPANHOLA:
1. Harry Lowe (48 anos e 226 dias)
2. Ricardo López (41 anos e 154 dias)
3. Alberto Cifuentes (41 anos e 114 dias)
4. Amedeo Carboni (41 anos e 40 dias)
5. Juan Carlos Valerón (40 anos e 324 dias)
6. Donato (40 anos e 173 dias)
7. Manuel Pablo (40 anos e 110 dias)
8. Songo’o (40 anos e 67 dias)
9. César Sánchez (40 anos e 15 dias)
10. Juanfran (39 anos e 305 dias)