Antes de Eric Moussambani, o homem que nadou nos Jogos Olímpicos de Sydney sem nunca antes ter visto uma piscina de 50 metros, e muito antes de Adrian Solano, o venezuelano que foi aos Mundiais de esqui deste ano sem nunca ter visto neve, houve Eddie The Eagle. Duas vezes último nos Jogos Olímpicos de Inverno de 1998, o primeiro dos «underdogs» adoptados pelo público nas grandes competições. Foi há quase 30 anos. E agora Eddie voltou a Calgary.

Eddie comoveu a Inglaterra em 1988. Num país sem tradição de desportos de inverno, ele acreditou que conseguiria chegar aos Jogos Olímpicos. Treinou por conta própria, andou pela Europa mais fria, a fazer trabalhos temporários para ganhar dinheiro. Quando soube que tinha conseguido finalmente o apuramento para os Jogos Olímpicos vivia num hospital psiquiátrico na Finlândia, uma escolha com motivações económicas: estava lá alojado porque pagava uma libra por noite. E contrariou a sua própria natureza, que não o recomendava para o desporto: era bem mais pesado que os outros competidores nos saltos de esqui e além disso via mal. Tinha de usar óculos em prova, o que trazia incómodos adicionais, como o facto de embaciarem nos momentos menos oportunos. «Às vezes arranco e não consigo ver para onde vou», contava, citado pelo «Guardian».

Eddie chama-se na verdade Michael, Eddie é uma alcunha. Anterior à que lhe ficou dos Jogos de Calgary, «a Águia». Naquele ano ele tornou-se um fenómeno imediato de popularidade, quando a sua história começou a circular. Também dividiu opiniões, entre os que o viam como o exemplo perfeito do espírito olímpico e aqueles para quem era apenas um motivo de gozo. Seja como for, foi uma das grandes histórias desses Jogos Olímpicos. Ele e a equipa de bobsleigh da Jamaica. Sim, aqueles também foram os Jogos de Inverno que assistiram à aventura de um punhado de homens que chegaram de um país tropical para competir na neve, com equipamento emprestado e sem que conseguissem terminar a prova.

Eddie, com os seus enormes óculos de neve cor de rosa e sorriso permanente, competiu nos 70m e 90m metros naqueles Jogos Olímpicos. Foi último em ambos, de longe.

Eddie continuou a tentar, mas não voltou a apurar-se para uns Jogos Olímpicos, até porque a partir de 1988 as regras de qualificação tornaram-se mais apertadas. Mas ficou para sempre no imaginário do público britânico. Teve algumas incursões pelo «show business» e a sua história inspirou um filme, que estreou em 2016 e tem o australiano Hugh Jackman entre os protagonistas.

Agora, aos 53 anos, voltou a saltar. Viajou de novo até ao Parque Olímpico de Calgary, um convite do Canadá, que pondera uma nova candidatura aos Jogos de Inverno, em 2026. Equipou-se e aventurou-se, de novo. E fez seis saltos, 18, 38 e 70 metros.

Parece que não correu mal, mas também não quis abusar da sorte. «Não tenho saltado muito nos últimos 20 e tal anos. Estava nervoso mas fiquei feliz por ter feito estes saltos. Depois pensei: Vou desistir enquanto está a correr bem, enquanto estou inteiro e feliz», disse à estação canadiana CBC.

Estavam várias centenas de pessoas a assistir, muitas delas mais familiarizadas com Eddie por causa do filme do que por terem reais memórias de 1988. «Estava uma grande multidão, a gritar «Eddie, Eddie», e foi como se voltasse a Caglary há 29 anos», disse Eddie.

O regresso

Houve mais fenómenos destes depois de Eddie. Um deles bem recente. O venezuelano Adrian Solano chegou aos Mundiais de esqui, no mês passado na Finlândia, sem nunca ter esquiado na neve. Aliás, esteve quase para não chegar, porque ficou retido no aeroporto de Paris, onde as autoridades duvidaram da sua história.

Lá chegou a Lahti e fez... o que pôde

Solano nunca tinha esquiado na neve, treinava em esquis sobre rodas. Não é novo, nem sequer em Portugal. Em 2006, o português Danny Silva chegou aos Jogos de Inverno a treinar-se também na estrada, em esquis sobre rodas. E repetiu a proeza em 2010.