A vida depois do futebol. O tema tem merecido vários destaques no Maisfutebol, nomeadamente na rubrica «Depois do Adeus», e a verdade é que o que acontece aos jogadores, sobretudo aos menos mediáticos, quando deixam de jogar futebol, algo que surge ainda cedo na vida, é um assunto que continua a merecer as mais diversas abordagens.

E casos como os de Joachim Fernandez podem trazer uma nova luz sobre algo que, de facto, é um problema. A primeira dúvida, neste momento, será mesmo um simples...quem é Joachim Fernandez?

A resposta, contudo, começa com uma correção à pergunta: quem foi. Joachim Fernandez jogou futebol a nível profissional nos anos 90. Foi internacional pelo Senegal e representou clubes como o Bordéus, onde terminou a formação e foi colega de Zidane, antes deste rumar à Juventus.

A 19 de janeiro desde ano perdeu a vida. E a que propósito o caso é notícia agora, quase três meses depois? Até uma reportagem recente da revista «So Foot» denunciar o caso, Joachim não era um ex-jogador de futebol mas um sem-abrigo. Foi assim que a notícia da morte foi dada pelos principais meios franceses.

Joachim Fernandez morreu enregelado nas ruas de Domont, cidade nos arredores de Paris onde, para praticamente toda a gente, era «apenas» um sem-abrigo. Poucos conheciam o seu passado.

A verdade é que a carreira nunca foi fulgurante. Terminou abruptamente devido a uma lesão grave no joelho, ainda com 29 anos. De igual modo, depois da formação e da experiência na primeira equipa do Bordéus, passou por clubes como Udinese, Toulouse ou AC Milan, mas sem sucesso.

Ao longo dos seus tempos de jogador enviava parte do seu salário para a família que ficara no Senegal. Foi em busca de melhores condições e de explorar o seu talento para o futebol que veio para a Europa, tentar a sorte. Naturalmente, o ordenado de um jogador de médio calibre não permite luxos desmesurados e, mais importante que isso, quando deixa de surgir, as poupanças não duram para sempre.

O jornal «Le Parisien» contactou alguns amigos de Joachim que deram conta de como este chegou ao estado que o levaria à morte.

«A separação da mulher matou-o…Isso e não poder ver o seu filho. Isso era o pior para ele», afirma Bruno, um dos amigos que falou ao jornal.

Faz parte de um trio que costumava conversar com Joachim desde que este chegou a Domont, já em 2013. Elogiam-lhe a personalidade. «Ele era muito tranquilo e ninguém conhecia o seu passado. Aliás, demorámos algum tempo a perceber. Vimos que era alguém muito culto, especialmente sobre futebol. E então, a dada altura, percebemos», conta Rachid, outro membro do grupo.

Perceberam que Joachim era mais um jogador a quem o final de carreira deixou marcas psicológicas para sempre. Ainda por cima de forma abrupta e madrugadora, como foi o caso. Joachim, como todos, começou cheio de sonhos, com a referida temporada de 1995/96, no Bordéus, a ser o ponto mais alto.

Participou na caminhada do clube até à final da Taça UEFA, perdida, depois, para o Bayern Munique. Jogou ao lado de Zidane e outros internacionais franceses, como Dugarry ou Bixente Lizarazu. Parecia lançado…

A verdade é que nunca foi um indiscutível na equipa, embora regularmente utilizado. Saiu no final da época mas ficou por França, no Caen. Depois Itália, com Udinese, Monza e Milan. Em comum o insucesso. Aliás, nem sequer vestiu a camisola do clube de Milão. Na Escócia representou o Dundee United, mas essa passagem é mais recordada pelo caricato episódio em que apertou o pescoço a Paul Gascoigne durante um particular com o Everton.

Acabou a carreira em 2001 na Indonésia, seis anos depois da época que parecia lançá-lo para o sucesso. Voltou a França, mas sem a fonte de rendimento de outros tempos. Nunca se conseguiu adaptar a um estilo de vida que teria de ser, necessariamente, diferente.

A separação da mulher foi o passo final da espiral em que entrou ao deixar os relvados. Ficaria sem casa, sem rumo e, depois, sem vida.

Na mesma reportagem do «Le Parisien», outras pessoas recordam o homem que «queria ser como as outras pessoas». Tinha uma conta num café local e «pagava quando podia». Era lá que fazia a sua higiene, por exemplo, ou mudava de roupa.

Deixou um filho com o qual não tinha contacto, como se disse, depois da separação da mulher. «Ficou contente por saber que ele seguiu os seus estudos. Não sabemos se o filho sabe a situação em que ele estava», conta Bruno.

Agora, também, será tarde de mais.