Já não há John Terry, já não há Petr Cech. Nesta altura o jogador com a ligação mais antiga ao Chelsea é Matej Delac, um perfeito desconhecido para a maioria dos adeptos. É guarda-redes, tem 25 anos e termina no final da época o contrato com o clube inglês sem ter feito um único minuto em jogos oficiais. Uma história que no princípio mete o Benfica e ainda passa por Guimarães.

Matej Delac pode ser quase anónimo, mas na verdade foi uma estrela precoce. Ainda jogava pelos sub-15 da Croácia quando esteve em Portugal, para treinar no... Benfica. Um período à experiência que terminou sem acordo. «Fui a Lisboa fazer uma experiência e foi fantástico. O olheiro deles observou-me durante um jogo de sub-15 pela Croácia e convidou-me a ir lá. Treinei algumas vezes e eles ficaram muito satisfeitos, mas os clubes não acertaram a transferência e tive que regressar ao Zapresic», contou em 2009 numa entrevista à UEFA, quando era já titular do NK Inter Zapresic, aos 16 anos.

Tinha-se estreado apenas dois meses antes e em estilo: defendeu uma grande penalidade no dérbi com o NK Zagreb. Foi um sucesso imediato, que Delac mediu desta forma: «Depois da minha estreia recebi 38 pedidos de amizade no Facebok, apenas em algumas horas. Nem queria acreditar. As pessoas agora passam na rua e cumprimentam-me. É demais!» Eram as redes sociais em 2009.

Nesse tempo Delac tinha um mundo de sonhos pela frente. Um deles podia ser repetido por qualquer candidato a guarda-redes ainda hoje, passados mais de oito anos: «Passo o meu tempo a ver jogos. Se pudesse escolher um jogador a quem defender um penálti, escolheria Cristiano Ronaldo. É soberbo. Sonho defender um remate dele uma vez na vida.»

E tudo parecia conjugar-se. Depois de mais uma época na baliza do Zapresic surgiu a grande oportunidade: a transferência para o Chelsea, no verão de 2010. O anúncio foi feito antes e Delac foi aliás o primeiro reforço anunciado com o Chelsea depois de ter estado proibido de contratar jogadores, por causa de um processo em torno de Gael Kakuta. Mas aí surgiram também as complicações, a primeira das quais o facto de não lhe ter sido dada uma licença de trabalho. A segunda, ter perdido o comboio da seleção da Croácia.

«Sempre sonhei jogar em Inglaterra, mesmo antes de o Chelsea aparecer. Sabíamos que podia haver problemas com a licença, mas a situação era diferente. Tinha tido uma boa época no Inter Zapresic, o Slaven Bilic tinha-me chamado à seleção com 17 anos e havia esperança de que conseguisse as internacionalizações necessáris para cumprir os critérios da licença de trabalho. Mas a realidade foi diferente. Lesionei-me para três meses, perdi o lugar na seleção, e pronto», contou Delac numa entrevista à ESPN.

E começou aí a longa odisseia de Delac. O primeiro destino, como jogador emprestado, foi o Vitesse Arnhem, que tem uma longa ligação ao Chelsea. Não jogou um minuto. Na temporada seguinte, mais uma complicação, a ajuda de rostos conhecidos e nova mudança. Depois de ter representado a Croácia no Mundial sub-20 viu-se sem clube perto do fim do mercado e quem o socorreu, conta, foi Petr Cech. «O Petr ajudou-me a encontrar clube através da agência dele. Contactaram o Karel Poborsky, que era presidente do Ceske Budejovice.»

Também não se afirmou no clube checo do ex-jogador do Benfica e foi na temporada seguinte que surgiu nova viagem para Portugal. Guimarães, ao abrigo de um protocolo com o Chelsea então anunciado pelo clube português. Rui Vitória era o treinador e Douglas já o dono da baliza. Delac fez apenas um jogo: foi titular na goleada ao Vilaverdense (6-1), para a Taça de Portugal.

Delac só tem coisas boas a dizer do Vitória, mas não se afirmou: «É um clube fantástico. O centro de treinos era excecional e os adeptos fantásticos. O treinador Rui Vitória, que agora está no Benfica, era bom, mas o único problema é que escolheu outro guarda-redes. Foi por isso que deixei Portugal a meio da época.»

Isto começa a tornar-se repetitivo, portanto adiante. Foram ao todo nove empréstimos em oito épocas. Jogou na Holanda, França, Portugal, Sérvia, Bélgica e Bósnia. Só não fez nenhum jogo oficial em Inglaterra.

Pelo meio regressou à seleção croata, mas para representar os sub-21. Aliás, cruzou-se com Portugal numa vitória da equipa que era já de Rui Jorge, em junho de 2013.

Ao V. Guimarães seguiu-se o regresso ao Kapresic para o resto dessa temporada. E depois mais dois clubes em 2013/14, Vojvodina e Saravejo.  Nesse verão ainda trabalhou com a equipa principal do Chelsea, às ordens de José Mourinho, e até teve o seu momento com a camisola «Blue» num particular com o Olimpia Ljubljana. Jogou 45 minutos, foi todo o tempo que jogou pelo Chelsea.

No verão de 2014 voltaria a sair, agora para França, para o Arles-Avignon. Só meia época, porque depois voltou à Bósnia, onde nasceu, para representar o FC Saravejo. A tempo de fazer 14 jogos, ser campeão e renovar a cedência para a temporada seguinte. Que ficou no entanto marcada por novo azar, uma lesão nos ligamentos que implicou o regresso a Londres para uma longa recuperação.

Em 2016/17 rumou à Bélgica e afirmou-se no Mouscron, onde fez 28 jogos. Agora, está no último ano de ligação ao Chelsea e assume que é o fim da linha. E não se arrepende. «O problema não era a minha qualidade. O Chelsea acredita em mim, renovou várias vezes. O problema foi sempre a licença de trabalho», disse por estes dias ao jornal bósnio Sportsport.

«Não me arrependo. Sinto orgulho por ter feito parte de um grande clube», disse à ESPN: «Este clube preocupa-se com os jogadores emprestados. Vimos todos os anos a Londres e há treinadores especiais que trabalham com a equipa, o Eddie Newton e o Paulo Ferreira. O Chelsea seguiu constantemente o a minha evolução e foi ver jogos meus. Tive a sorte de trabalhar com grandes treinadores: Carlo Ancelotti, André Villas Boas, José Mourinho.»

Agora, Delac vai ter de procurar clube por conta própria pela primeira vez na carreira. Que ainda pode ser longa, afinal ele tem só 25 anos. «Quero assentar num clube e evoluir na minha carreira. É importante escolher o clube certo e tomar a decisão correta. Depois, talvez regresse um dia a Inglaterra.»