Daniel Gonçalves chegou este domingo ao México, a partir de onde vai começar a aventura de uma vida. Ele e a namorada Maria. Os dois juntos comprometeram-se a percorrer toda a América Latina, enquanto ele vai ensinar conceitos futebolísticos às comunidades pobres.

Mas por partes.

Antes de mais convém explicar que o projeto é de Daniel, um treinador de 34 anos apaixonado por viagens e pelo voluntariado.

«Quero chegar à América Latina e envolver-me com as pessoas, envolver-me com comunidades, com associações humanitárias, com os clubes, com orfanatos, o que seja, e ajudá-los a tornarem-se melhores», conta.

«Vou oferecer a minha ajuda a treinadores, jogadores e equipas, depois se eles se mostrarem recetivos vou desenvolver pequenos programas de treino adaptados a cada situação. Mas tudo isto é uma incógnita. Pode a recetividade ser boa e pedirem-me coisas que não posso dar, por exemplo. Quero descobrir o que vai acontecer e disponibilizar a minha ajuda para quem a quiser.»

Mas calma. Antes de mais, quem é afinal Daniel Gonçalves?

Para início de conversa, convém dizer que trabalhou oito anos no Sporting, integrando as equipas técnicas de Domingos, Sá Pinto, Vercauteren, Jesualdo e Leonardo Jardim, como analista da equipa principal, depois de ter trabalhado cinco anos com as camadas jovens.

Mas há mais.

«A seguir fui para a Colômbia com José Dominguez, segui para a Grécia com Leonel Pontes, depois fui para a Guiné-Equatorial sozinho gerir uma Academia em que tinha de fazer tudo. Entretanto tive uma passagem por Timor», explica.

«Sou aventureiro e sonhador. Quando meto uma coisa na cabeça, não consigo parar. Por isso quero ir e dedicar-me a isto de corpo e alma.»

A ideia é simples: arrancar no México e percorrer toda a América Latina a ensinar os miúdos a serem melhores. Começa em Cancún, onde Daniel chegou este domingo.

«Segue-se Guatemala, Belize, depois El Salvador e Honduras com cuidado, tenho de ver por onde vou passar porque são dois países perigosos, depois Nicarágua, Costa Rica, Panamá, Colômbia, Peru, Bolívia e acabo na Argentina», refere.

«Quanto tempo vai durar isto? Só tenho bilhete de ida, não tenho bilhete de volta. Gostava de chegar à Colômbia em junho ou julho. Por isso não sei, mas pode durar até um ano.»

A mala é muito pequena, garante.

«Levo computador, câmara, o meu equipamento com a marca do projeto que criei, bolas e duas mudas de roupa. Apenas o essencial.»

Afinal de contas não é preciso muito para se ser feliz: e o que Daniel quer é isso, ser feliz. O treinador confessa-se apaixonado «por viagens» e pela «adrenalina da aventura».

Também por isso não leva nada planeado: por isso e por uma outra razão, já agora.

«As pessoas, quando se fala disto, associam logo a um projeto de agenciamento de jogadores. Não tem nada a ver com isso. A essência do projeto não é descobrir jogadores, é ajudá-los com o meu conceito de futebol. Por isso não falei com ninguém», frisa.

«Não sei qual vai ser a recetividade, mas estou empenhado nisto. Sei que de início vai custar, mas depois vai encaminhar-se. Vou estar no Youtube, no Instagram, no Facebook, vou até ter uma página web e espero que toda essa estrutura me ajude a divulgar o projeto, de forma a que depois as solicitações passem pelas pessoas. Espero que elas vejam o que faço e me digam para ficar lá uma semana, ou ficar duas semanas.»

No bolso, acrescenta, não leva muito dinheiro.

«Tenho ideia de não gastar mais de dez euros por dia. Espero fazer workaway, couchsurfing, encontrar casas onde dormir, enfim. Sei que não será sempre possível, mas vou tentar. Depois as viagens... é como conseguir.»

«O meu projeto é este: ir à aventura e seguir caminho. Vou viajando e onde parar, ofereço a minha ajuda. Vou ao estádio, ao clube ou à associação humanitária, apresento-me, mostro-lhes o meu currículo e o que quero fazer. Logo se vê o que consigo.»

Nesta altura há uma pergunta obrigatória: não tem receio de percorrer sozinho alguns dos países mais perigosos do mundo, com uma passagem obrigatória pelas comunidades pobres? Daniel garante que não tem medo, porque o medo paralisa. Mas tem respeito.

«Temos o estigma da América Latina, por causa da violência, da droga, do tráfico que a televisão nos apresenta. Mas estes anos de viagem mostraram-me que há mais boas pessoas do que más pessoas no mundo», sublinha.

«O receio impede-te de seguir o teu caminho e eu não quero que isso aconteça. Sei que vou encontrar muitas pessoas boas que me vão ajudar. Já estou um bocado vacinado, já fui para a Guiné Equatorial totalmente sozinho e sem saber nada do país. Claro que vou com cuidado, vou seguir as regras de segurança, não vou para certos sítios a determinadas horas, não vou mostrar objetos valiosos, enfim, o normal numa viagem.»

Pelo caminho leva na mala um conceito que ele próprio criou: o Global Soccer Concept. Basicamente é um programa de desenvolvimento de jogadores em comunidades pobres e com poucos recursos. Um programa que garante poder aplicar-se em todo o lado.

Daniel tem o sonho de chegar à Argentina e poder dizer que o programa é um sucesso.

«Gostava que no final pudesse ter influenciado um pouco os conceitos de preparação, treino e competição dos jogadores, treinadores e equipas dos países por onde vou passar. Se conseguir ajudar um treinador ou um jogador a aproveitar uma oportunidade que mais tarde lhe seja dada, vou ficar muito satisfeito», garante.

«Quero consolidar o meu projeto, o Global Soccer Concept, que é um conceito de preparação de jogadores em comunidades pobres. Quem sabe um dia possa aplicar este conceito numa academia que ajuda estes miúdos.»

Quem sabe, Daniel... Boa sorte.