A despedida de Pepe do Real Madrid teve um valor sentimental muito grande para defesa central. Provavelmente, para colegas e adeptos do clube espanhol também. Mas ela encerrou também um ciclo muito próprio no futebol português.

Fazer carreira num clube estrangeiro começou a ser hábito desde que a Geração de Ouro abriu essa porta. Paulo Sousa, Luís Figo, Fernando Couto e Rui Costa passaram a maior parte da carreira em ligas que não a portuguesa.

Nenhum deles, porém, passou tantos anos num só clube estrangeiro como Duda, Danny e Pepe, quando se fala nas principais ligas da Europa. Estes três fizeram pelo menos dez anos a representar o mesmo emblema enquanto envelheciam e despediram-se de Málaga, Real Madrid e Zenit neste final de época.

São casos únicos no futebol nacional.

De Chalana a Rui Barros

Vários jogadores arriscaram o estrangeiro antes da denominada Geração de Ouro. Mário Coluna foi bicampeão europeu pelo Benfica e ainda jogou uma temporada no Lyon, por exemplo.

Quando João Alves saiu para Salamanca, houve algum mediatismo em torno da mudança, mas as circunstâncias da transferência de Fernando Chalana, após o Euro 84, levaram a que essa mudança tivesse holofotes centrados no Pequeno Genial.

Ainda assim, essa foi uma era em que o futebolista português emigrante pouco durava lá fora. Até que chegou a vez de Paulo Futre.

El Português foi, por assim dizer, o maior no Atlético Madrid. Pelo que jogou em termos de qualidade, mas também pela continuidade que teve na capital espanhola.

Seguiu-se-lhe Rui Barros, que passou seis temporadas longe: duas na Juventus, três no Mónaco, uma no Marselha.

Quando piccolo Barros regressou ao FC Porto, já uma geração estava pronta para fazer as malas, partir e, alguns deles, nunca mais porem pé em relva que tivesse jogo da Liga portuguesa.

O panorama foi mudando, o jogador português aventurou-se mais lá fora e três deles, pode dizer-se, terminaram como símbolos de Málaga, Zenit e Real Madrid. Mesmo que neste último caso, Pepe não se chame Cristiano Ronaldo ou Luís Figo. 

Duda foi sempre certeza em Espanha

Pela primeira vez em 14 anos, a Primera División vai começar sem Sérgio Paulo Barbosa Valente. Formado nas escolas do Vitória, de Guimarães, Duda era uma certeza na liga espanhola.

Primeiro, emigrou para Cádiz, depois, em 2001/02, transferiu-se para o clube de quase sempre: o Málaga. Representou-o por 13 épocas, embora nem todas seguidas: esteve emprestado uma temporada ao Levante, que na altura estava na segunda divisão.

Quando o Málaga lá caiu também, Duda mudou-se para Sevilha, mas voltou rapidamente aos malaguenhos. Despediu-se esta temporada, mas já era, com alguma vantagem, o jogador português com mais anos num só clube.

Duda pode não ter o mediatismo de outros emigrantes das grandes ligas, mas esteve nos maiores sucessos do Málaga: desde o quarto lugar no campeonato à presença histórica na Liga dos Campeões.

Danny: os milhões que ele custou!

Filho de emigrantes, emigrante foi. Nascido em Caracas, Venezuela, cresceu na Madeira, terra de um mais novo Cristiano Ronaldo. Ambos partilharam espaço no Sporting em 2002/03 antes de partirem: um rumo a Manchester, outro a Moscovo.

O Dínamo contratara Danny, que assim iniciava uma longa aventura na distante Rússia. Curiosamente, quando os dois já jogavam lá fora, Danny surpreendeu o mundo com os milhões da transferência para o Zenit, primeiro do que Ronaldo fez quando se mudou para o Real Madrid.

A troco de 30 milhões, em 2008, Danny foi para São Petersburgo: a maior transferência de um jogador da liga russa!

Depois de quatro temporadas na capital, o internacional português juntou mais dez em São Petersburgo. Na era soviética, o clube tinha sido campeão apenas uma vez e tinha conquistado uma Taça. Foi campeão e venceu a Taça UEFA antes de Danny chegar. Mas com o português viveu a fase de maior glória.

O internacional português deixou o emblema russo com três campeonatos nacionais, duas taças da Rússia, uma supertaça do país e uma supertaça europeia.

Tal como Duda no Málaga, Danny foi capitão no Zenit e uma das suas figuras icónicas.

Pepe: a despedida amarga

A lei Bosman transformou o futebol europeu ao ponto de as repercussões serem globais. A Geração de Ouro já começara a emigrar antes dela surgir, mas o caso Bosman permitiu que a vida de emigrante fosse mais provável.

Para além disso, ter nacionalidade comunitária facilitou. E Pepe beneficiou dela. Nascido no Brasil, adquiriu passaporte português e a porta do Real Madrid ficou mais aberta por isso.

Contratado ao FC Porto, Képler Laveran Lima Ferreira passou dez anos a servir o Real Madrid. Nenhum outro português, nem mesmo Cristiano Ronaldo, pode dizer o mesmo – para já, pelo menos.

Uma década inteira a representar um dos maiores clubes do mundo, a maioria desse tempo como principal opção. Pepe passou por momentos bons e maus na capital espanhola. Ganhou muitos títulos, em campo e na imprensa. Não deixou ninguém indiferente.

Chegou a vice-capitão do Real Madrid e deixa herança a Cristiano Ronaldo. Também deixou críticas ao modo como o clube o tratou na hora da saída.

Paulo Ferreira, Tiago e Cristiano Ronaldo

Paulo Ferreira esteve próximo de chegar aos dez anos de carreira no Chelsea. Ficou-se pelos nove. Ainda assim, notável, num jogador com uma carreira recheada de troféus.

Tiago passou muitos anos fora do país e completou sete temporadas e meia no Atlético Madrid. Despediu-se em lágrimas no Vicente Calderón. Da Geração de Ouro, Rui Costa e Fernando Couto foram os que dedicaram mais tempo a um emblema: sete épocas na Fiorentina e Lazio, respetivamente.

Agora, uma nova vaga de futebolistas portugueses começa a ocupar espaço nas grandes ligas. Cristiano Ronaldo está na calha para ser o próximo a fazer um mínimo de dez épocas, no caso no Real Madrid. Mas nesta quarta-feira, até isso ficou em causa. O que só releva o que fizeram Duda, Pepe e Danny.