João Sousa colocou-se nestes dias mais recentes no ponto onde ainda nenhum tenista português tinha conseguido chegar. E, consigo, levou o ténis para um patamar inédito no nosso país. Ele, que assume querer mudar a mentalidade portuguesa em relação à modalidade. Ele, que saiu de Portugal para poder realizar um sonho. Ele, que deseja que outros portugueses também superem estas marcas.

A presença nas meias-finais em São Petersburgo tanto foi confirmação do excelente ano desportivo como alimentou genuinamente a esperança de resultados ainda melhores. Que aconteceram logo de seguida. Neste fim de semana, o sonho de João Sousa já começou a ganhar concretização com a vitória em Kuala Lumpur.

O tenista vimaranense venceu o Open da Malásia na final de domingo tornando-se o primeiro português a ganhar um torneio do ATP World Tour. E com os 250 pontos somados colocou-se nesta segunda-feira como nº51 do ranking mundial – o melhor registo de sempre do ténis português.

«Ter atingido este ranking é obviamente muito bom, mas é muito mais positivo ver o entusiasmo das pessoas e vê-las contentes, visto que o país passa por um momento menos positivo», declarou João Sousa ao Maisfutebol nesta segunda-feira. Mas para o tenista, «ser o melhor português de sempre respetivamente ao ranking também não é uma coisa muito significativa». Porque a intenção é «melhorar esse registo». E não só. O desejo é também que «os mais jovens e os jogadores atualmente profissionais o possam superar rapidamente». Isso «significaria que Portugal estaria nos lugares mais altos e que o ténis tinha dado outro passo à frente em termos competitivos».

Aos 24 anos (nasceu a 30 de março de 1989), João Sousa acabou também por ser o primeiro tenista luso a defrontar um nº1 do mundo – Novak Djokovic na terceira ronda do US Open, em agosto – e nesta semana que agora passou tornou-se ainda o primeiro português a derrotar um jogador do top ten mundial – quando bateu David Ferrer (nº4) nos quartos de final em Kuala Lumpur.



O vimaranense concede que «é gratificante ser reconhecido» e sentir-se «algumas vezes ao nível dos melhores do mundo em termos tenísticos». Mas esse é simplesmente «o sonho de todos os jogadores de ténis: poder jogar nos grandes torneios e contra os melhores». No fundo, está «só a cumprir os sonhos». E, para conseguir isso, tratou de persegui-los cedo.

João Sousa começou a jogar ténis aos 7 anos, com o pai, em Guimarães, a cidade onde nasceu. O ténis em vez do futebol foi a primeira escolha neste percurso. Adepto confesso do Vitória minhoto, João Sousa assume que «até jogava bem futebol», mas também que fez «a escolha certa». Durante o Open da Malásia explicou o que o motivou na hora da decisão: «Escolhi o ténis porque é um desporto individual. Se ganharmos, o mérito é nosso. Se perdermos, é por nossa culpa.»

Com o apoio dos pais, o então mais jovem João partiu para Barcelona. Tinha 15 anos. Foi para a BTT Tennis Academy com a vontade de igualar as pancadas dos favoritos Pete Sampras, Juan Carlos Ferrero e Roger Federer. João Sousa tomou essa decisão, lá está, «porque tinha um sonho». «Tinha o sonho de ser jogador de ténis, o de jogar um Grand Slam e também o de ganhar um torneio ATP» e, «aos poucos», vai «cumprindo» o que sonhou. «Isso é muito bom», garante o tenista que, olhando nove anos para trás, se confessa «feliz» por «ter tomado a decisão» de mudar-se do Minho para a Catalunha. «É muito bom ter sonhos», mas «é ainda melhor poder realizá-los».

Na BTT (Barcelona Total Tennis), o tenista português beneficiou do conhecimento e da experiência do antigo jogador Francisco Roig – o diretor técnico da academia que colabora com Rafael Nadal. Em 2005, um ano depois de chegar à Catalunha, João Sousa passou ao circuito profissional. Em 2009 ganhou o primeiro torneio Future – em singulares, pois em 2008 já tinha ganho um em pares, com Bartolomé Salvá-Vidal. Em 2011, ganhou o primeiro Challenger.

Os custos de uma profissão que implica viajar muito à custa dos próprios meios não são alheios à escolha dos torneios. E acaba por estar tudo ligado: quanto melhor é o desempenho num torneio, mais se ganha, claro. O novo nº51 do ranking já tem um prize money em 2013 que ultrapassa a metade do que já ganhou em toda carreira (de singulares e pares) desde que é profissional.

«Temos de fazer um calendário de acordo com as nossas economias. Felizmente, já consegui fazer alguma coisa no ténis. Mas anteriormente não podia permitir-me fazer isso, porque não tinha contratos como têm outros profissionais na Inglaterra, França ou Austrália, que têm grandes federações», explicou a meio da semana à Lusa o nº1 português (desde agosto de 2012): «Nunca tive qualquer contrato na minha vida, a nível monetário, a não ser de material.»

A vontade com que foi para Espanha agarrar um sonho entretanto já tornado realidade é, porém, idêntica à aposta na mudança que é preciso fazer. Se «hoje em dia, Portugal, se calhar, não reúne as condições para se poder fazer um jogador profissional de ténis» porque «a mentalidade portuguesa não é a melhor», João Sousa acredita que «isso está a mudar». E assume: «Eu espero conseguir mudar essa mentalidade.»



De chegada a Portugal nesta terça-feira após o triunfo na Malásia, João Sousa tem como compromisso, «de momento, recuperar algumas energias». «O João está a competir há três semanas seguidas, perdeu algum peso e precisa de recuperar devido ao desgaste acumulado de tanta competição», revelou ao Maisfutebol Frederico Marques, o treinador do tenista português.

A dupla regressará depois para Espanha preparando os seus últimos torneios do ano: os três torneios ATP de Moscovo (250), Valência (500) e Paris (1000) – até meados de novembro. Para a próxima temporada, Frederico Marques esclarece que «ainda não há nada planeado». «Reunimo-nos sempre no final da época para falar em conjunto sobre a temporada que acabou, assim como sobre a que vai começar», contou.

«Aumentar o nível atingido de torneios não é possível, visto que os torneios ATP são os torneios da máxima categoria. Agora, posso assegurar que um dos nossos objectivos é tentar melhorar dia a dia e torneio a torneio junto dos melhores do mundo», afirmou o treinador de 27 anos.

Frederico Marques está na BTT desde a mesma altura de João Sousa. Antigo nº1 português sub-14, sub-16 e sub-18, foi na academia espanhola que passou a treinador (atualmente de nível B) e tornou-se o responsável técnico de João Sousa quando o vimaranense ainda estava acima do nº200 do ranking mundial, em maio de 2011.

Em junho desse ano, o atual nº1 português ganhou o primeiro dos seus cinco torneios Challenger. «É óbvio que é uma recompensa para mim poder ver o João nos grandes palcos e a jogar contra os melhores jogadores. E muitas vezes fazer-lhes frente e até ganhar». E assim aconteceu. No domingo, João Sousa ganhou o primeiro torneio ATP World Tour 250. E a partir desta segunda-feira, é o nº51 do mundo.

JOÃO SOUSA

Carreira em Pares
Torneios Future: 9 vitórias em 11 finais
Torneios Challenger: 2 vitórias em 3 finais

Carreira em Singulares:
Torneios Future: 7 vitórias em 11 finais
Torneios Challenger: 5 vitórias em 7 finais
ATP World Tour: vencedor do Open da Malásia 2013
Torneios Grand Slam
Open da Austrália: 2ª ronda em 2013
Roland Garros: 1ª ronda em 2012 e 2ª ronda em 2013
US Open: 3ª ronda em 2013

Melhor ranking ATP: nº51 em 30-09-2013

Prize money em 2013: 341.037 euros
Prize money em toda a carreira (singulares e pares): 524.214 euros