(Artigo originalmente publicado a 23 de outubro de 2015)

Lado B é uma rubrica que apresenta a história de jogadores de futebol desde a infância até ao profissionalismo, com especial foco em episódios de superação, de desafio de probabilidades. Descubra esses percursos árduos, com regularidade, no Maisfutebol:

Jamie Vardy é o máximo goleador da Premier League 2015/16 com nove remates certeiros em igual número de jornadas.

Aos 28 anos, o avançado do Leicester vive a melhor fase da sua carreira e entrou no leque de opções da seleção inglesa, acumulando quatro internacionalizações nos últimos meses.

Esta é a incrível história de um jogador que, até 2011, não tinha o estatuto de profissional e vivia sobretudo do trabalho diário numa fábrica.

«Costumávamos fazer uma tala de fibra de carbono para ajudar pessoas com dificuldades de locomoção. Aquilo ajudava-as a andar normalmente. Estava a contribuir para a felicidade de alguém, portanto era um bom trabalho, embora fosse muito duro.»

Jamie Vardy tinha nessa altura 24 anos e as hipóteses de uma carreira ao mais alto nível no futebol pareciam reduzidas. O seu desenvolvimento foi travado por uma dispensa do Sheffield Wednesday, ainda na adolescência.

«Pelos vistos, era demasiado pequeno. Foi duro porque, um mês após a dispensa, dei um salto no crescimento, mas era demasiado tarde. Nessa altura pensei que tinha perdido a hipóteses de ser jogador profissional de futebol.»



Na entrevista recente ao The Telegraph, Vardy recordou esse momento difícil e o que se seguiu.

«Tinha 15 anos. Decidi fazer uma pausa no futebol e dediquei-me aos estudos. Oito meses mais tarde, um amigo perguntou-me se queria jogar aos domingos no Wickersley Youth. Daí saí para o South Yorkshire e depois fui contratado pelo Stocksbridge Park Steels.»

O avançado estava na base da pirâmide. O Stocksbridge Park Steels FC atuava na Northern Premier League, fora do patamar nacional e correspondendo ao sétimo escalão do futebol inglês.

Jaime Vardy ficou no clube de 2007 a 2010. Pelo meio, teve de lidar com a desconfiança alheia perante uma sentença de agressão.

«Um amigo meu foi atacado à porta de uma discoteca, apenas por ser surdo. Decidi defendê-lo mas acabei por também me envolver na confusão. Passei a ter uma hora de recolher obrigatório (18h30) e colocaram-me naturalmente um rótulo, isso podia ter sido o fim para a minha carreira, mas felizmente não me impediu de continuar a jogar futebol.»

O salário no Stocksbridge Park Steels FC nunca ultrapassou os 140 euros, obrigando o avançado a manter um emprego a tempo inteiro.

«Estava longas horas na fábrica e depois tinha de treinar na terça e na quinta-feira à noite, para além do jogo ao sábado. Era duro. Ainda estava na fábrica quando fui para o Halifax, em 2010, mas andava cansado e com dores nas costas. Não fui ganhar muito dinheiro para o Halifax mas decidi apostar um pouco no futebol e apresentei a minha demissão no emprego.»



Foi um momento de viragem na carreira. Após uma época com registo goleador no Halifax Town, Vardy foi assediado por vários clubes e assinou pelo Fleetwood. Precisamente na altura em que decidiu abandonar a fábrica.

«Assinar pelo Fleetwood foi um choque para mim. Nunca tinha estado num clube a tempo inteiro! Assinei na sexta-feira, havia jogo nesse dia e acabei por ser imediatamente titular.»

Jamie Vardy iniciou a carreira profissional nesse instante, em 2011, já com 24 anos. Estava aberto o caminho para a felicidade. Mais uma temporada e novo salto, obrigando o Leicester City a bater o recorde de transferências por um «non-league player».

O avançado inglês acompanhou a equipa na subida para a Premier League e, depois de um primeiro ano a lutar  desesperadamente pela permanência (Vardy marcou apenas 5 golos em 36 jogos), o jogador atingiu um nível brilhante no arranque da temporada 2015/16.

Por esta altura, o Leicester ocupa a 5ª posição na tabela classificativa da Premier League e Jamie Vardy está no topo da lista de goleadores. Nove tentos, contra os seis de Sergio Aguero (Manchester City), Alexis Sánchez (Arsenal) e Georginio Wijnaldum (Newcastle). Ascensão impressionante.