Quando Chaves lhe acenou com um projecto de subida à Liga de Honra, Leonardo Jardim sorriu: era um passo em frente na carreira. Ao mesmo tempo não pôde deixar de evitar um aperto no coração. «Foram momentos conturbados», recorda José Barros, que era por esses dias adjunto do Camacha.

«O Camacha não o deixava sair a meio da época, a família não queria que ele abandonasse a Madeira. Sentiu pressões de muitos lados. Mas depois conversou com as pessoas, recebeu o apoio dos amigos, pensou muito e aceitou. Foi uma aposta pessoal forte e arriscada, mas ele tinha de dar esse passo.»

Perfil: um homem nascido para treinar

Leonardo Jardim era treinador do Camacha e somava épocas de tranquilo sucesso. Mas não era só: ao mesmo tempo que treinava a equipa, criou um projecto de formação que recebeu o apoio do Governo Regional da Madeira: o Projecto DES - desenvolvimento desportivo, escolar e social.

«É um projecto inovador, como não há em Portugal. Além de ser uma escola de futebol, damos aos alunos uma componente escolar importante. Temos professores de português, matemática e inglês a tempo inteiro, e podemos trazer professores de outras disciplinas quando necessário.»

O dia em que fechou o estádio a cadeado

José Barros ficou à frente do projecto de Leonardo Jardim. «Ele sente que o problema é sobretudo social: os pais não têm tempo, não ajudam os filhos, que não estudam como devem, tiram más notas e como castigo são retirados do futebol. Para evitar isso tudo, damos formação desportiva, escolar e social.»

Ora por isso Leonardo Jardim era remunerado em duas componentes: do Camacha e do Governo Regional. O sonho dele, porém, não era financeiro. «Sentia que para evoluir tinha de sair da Madeira, de levantar voo. Ele já tinha tido convites de fora, não aceitara nenhum, mas estava na altura de o fazer.»

A história do adeus difícil à Madeira

Por isso aceitou o Chaves e deixou uma vida na Madeira. Lá onde fizera toda a formação. «Eu brinco que a carreira de treinador começou no andebol. Fui eu que o levei para lá: no último ano de curso saí para o Académico do Funchal e entreguei-lhe a equipa no Santacruzense», sorri Duarte Freitas.

Não durou muito, claro: ficou só até ao fim da época. O futuro estava no futebol. «Na faculdade podíamos fazer Eramus. Tinha tanta paixão pelo futebol que me convenceu a ir para Itália, só para estar perto do calcio.» Entretanto Duarte Freitas foi convidado para treinar o Académico e a aventura gorou-se.

Leonardo ficou e acabou o curso enquanto auxiliava no treino do Santacruzense. Depois foi colocado em Porto Santo, onde os pais tinham uma casa de férias. Tornou-se adjunto do Portossantense e começa de facto a carreira: conheceu José Moniz e durante quatro anos segue-o para todo o lado.

Um ano no Portossantense, ano e meio no Câmara de Lobos e dois anos no Camacha. Este último, curiosamente, foi difícil. «Não o conheciam e não o queriam. Mas era bom adjunto, leal, trabalhador e informado, por isso fiz força e convenci-os a aceitá-lo à minha responsabilidade», conta José Moniz.

Quando o treinador que é o mentor de Leonardo Jardim saiu, o clube já tinha mudado de opinião: quis ficar com ele. Leonardo ficou então com João Santos. Foi o último ano de adjunto: na época seguinte, era treinador principal. Tinha 29 anos, o curso de quarto nível completo e muita vontade de triunfar.