Dá para trabalhar a inspiração? Essa foi a grande questão em torno da vitória do FC Porto sobre o Brugge, esta noite, que deixa a equipa em muito boa posição para seguir para os oitavos de final, mas foi conseguida num jogo em que muita coisa saiu mal. Foi preciso transpirar muito para corrigir o menor acerto de algumas pedras basilares. Triunfou o grupo, com alguns sustos e, sobretudo, pouco futebol pelo meio. Triunfou, resuma-se. É a nota que fica e a que era pretendida, até pelo Clássico que aí vem.

Basta ver a primeira meia hora do encontro para perceber o porquê desta introdução. O futebol portista foi pobre, mesmo que o onze, pese Maxi Pereira no lugar de Layún, tenha sido o que já se pode considerar habitual. Unidades de mais abaixo do obrigatório. Este não era jogo para Herrera, Oliver, Otávio ou Diogo Jota. Todos abaixo do que já mostraram.

Com isto, é natural que o nervosismo, que também é cliente habitual do Dragão nos últimos anos, tome conta da equipa desde cedo. E a inspiração, madrasta, em vez de tardar fuja de vez. Com isto, foi natural que o Brugge tenha tentado uma gracinha. Mesmo deixando o goleador Vossen no banco, Michel Preudhomme montou um onze subido no terreno e o desacerto inicial azul e branco ajudou a equipa a confiar. É dos livros: a confiança é peça chave no futebol.

Com o FC Porto a tentar encontrar-se, Wesley obrigou Casillas à primeira defesa apertada do jogo e fez tocar o sinal de alerta. Se não há inspiração, venha, então, a transpiração ou o jogo iria complicar ainda mais.

E o FC Porto lá cresceu. Continuou com um futebol que não encantou ninguém, mas levou-o até mais perto da área belga, pelo menos. Foi ganhando faltas e pontapés de canto. Foi criando perigo através deles e, assim, retraiu o rival. Mostrou quem mandava sem conseguir asfixiar.

Alex Telles atirou à trave, de livre; Marcano cabeceou a rasar o ferro, após canto; André Silva marcou, por fim, em mais um lance de bola parada, com ajuda involuntária de Tomás Pina. Como água para matar a sede, o golo acalmava o FC Porto. Trazia conforto ao Dragão e a certeza de que era por ali o caminho. Mas faltava toda a segunda parte. E, mais do que isso, faltava confirmar que a receita estava entendida.

Não estava. Pelo menos foi a ideia que o FC Porto foi dando, num jogo em que acabou assobiado pelos adeptos belgas que reclamaram contra o tempo perdido.

Depois daquele primeiro tempo, o FC Porto voltou do descanso sabendo a letra da canção que precisava tocar. A inspiração poderia não vir mais, mas o remédio que tinha resultado no golo de André Silva estava definido. Era fazer o mesmo.

Mas a transpiração não deu para mais golos e a inspiração só Corona, depois de render Diogo Jota, trouxe para campo. E teve o mesmo efeito prático: zero. Ficaram as boas intenções, em dois raides, sobretudo o primeiro, magnífico, com a bola a fazer uma paralela à linha sem um desvio fatal.

Sem o 2-0, o Brugge aguentava-se à tona. E, no final, acreditou. Apoiou-se num remate forte de Izquierdo, acabadinho de entrar, e viu Casillas evitar que Pina empatasse, num desvio com o corpo quase à queima-roupa.

Sofreu de mais o FC Porto. Mais do que o esperado e mais do que o necessário. Como em Brugge, no fundo, embora com sabor diferente. Ficou, por fim, o triunfo que permite afastar os belgas, garantir a Liga Europa e ultrapassar o Copenhaga na luta pelos oitavos.

Tudo isto à base da transpiração. Chegou, esta noite, para encher uma folha que não poderia ficar em branco. Dificilmente chegará em todas.