Há noites assim. Mágicas. Inesquecíveis. Noites em que os astros se alinham e parecem congeminar a favor do improvável. Noites em que se pode saltar e a probabilidade de tocar o céu é alta. Em que se caminha no arame sem tropeçar. Noites, enfim, em que se coloca um stop na poderosa máquina alemã.
 
O FC Porto venceu o Bayern Munique. Repita-se para que a ideia assente: o  FC Porto venceu o Bayern Munique! 

E com uma classe que só deixa dúvidas a quem olhar para o resultado sem ver o que foi o filme. Com a categoria das grandes equipas, numa noite para a história do Dragão. Desde a vitória sobre o Manchester United em 2004, talvez, que um autêntico colosso do futebol europeu não caía no Dragão. E, é bom lembrar, este Bayern é muito superior àquele Manchester.
 
Perante 50092 espectadores, a atual lotação máxima do estádio, o FC Porto deslumbrou na melhor exibição da época. Foi competente, brilhante, mágico, num estádio que até na inauguração teve magia.

Bateu aquela que é, para muitos, a melhor equipa do mundo, com seis campeões do mundo no relvado, com um dos melhores treinadores de sempre a ditar leis no banco.
 
Lopetegui pediu uma noite de máximos, a equipa fez-lhe a vontade. Venceu 3-1, num jogo em que quase tudo correu bem. O resultado até nem é excelente para a segunda mão, em virtude do golo sofrido e das ausências que irá ter (Danilo e Alex Sandro estão fora, por castigo) mas abre boas perspetivas.

E, além disso, quem repara no lado direito do marcador quando há um três reluzente na banda oposta?
 
O FC Porto já tem o prémio desta Champions. E vai a Munique lutar pelo jackpot. Ganhou o direito a que assim seja com uma estratégia que resultou em pleno. Se o Bayern quer a bola, o FC Porto deixa-a por lá ficar. Mas não deixa os alemães fazerem o que querem. A pressão alta causou muito estrago e foi uma das chaves do triunfo histórico.
 
Aliás, resultou tão bem que aos dois minutos já tinha surtido efeito. Jackson Martínez, a surpresa de última hora guardada a sete chaves, pressionou Xabi Alonso (foi assim o jogo todo) no limite da falta. Roubou-lhe a bola e correu para Neuer que o derrubou na área.

Penálti e expulsão gritou o estádio. Só penálti, respondeu o árbitro Velasco Carballo. Incompreensível. Neuer ficou até ao fim e fará o jogo de Munique, quando deveria ver, ambos, na bancada.
 
Dez minutos com alemães em estado de choque
 
Indiferente, Quaresma abriu o ativo. E a boca de espanto dos alemães que, ainda nem a tinham fechado, já o português fechava o segundo. Minuto 10, desatenção de Dante (incrível como joga numa equipa destas...) e a mesma receita. Quaresma em frente a Neuer. Atirou de pronto. 2-0.
 
Choque no Dragão. Pelo mundo do futebol todo, arriscamos dizer. É verdade que o Bayern veio muito desfalcado para este jogo mas, insiste-se, colocou em campo seis campeões do mundo.
 
O melhor que conseguiu foi, na verdade, o período entre o segundo golo portista e o de Thiago Alcântara que ainda assustou o Dragão. Cerca de vinte minutos com mais bola, como sempre, mas também com perigo, como nunca antes nem depois. Lewandowski atirou de cabeça, por cima, na mais flagrante ocasião antes de Boateng descer pela direita, recuperando as suas memórias de lateral, e centrar para o hispano-brasileiro aproveitar o mau posicionamento dos centrais portistas.
 
Foi o tal pormenor que impediu que a noite fosse perfeita. Pouco depois, já o FC Porto lamentava uma bola de Alex Sandro à trave, num lance de evidente excesso de confiança de Neuer. Ou Casemiro cabeceava por cima, em excelente posição.
 
Era o sinal de que a magia que o FC Porto queria servir não se esgotara em dez minutos. Havia mais e a segunda parte foi a resposta. Brilhante até ao golo. Suficiente e controlador depois disso.
 
Uma pressão que não se esgota
 
Quem esperava que o Bayern caísse em cima dos portistas em busca do empate viu o inverso. Novamente o FC Porto a entrar melhor. A pressão voltava a resultar e parecia inesgotável. O FC Porto jogava de dentes cerrados. Operário perante a classe nobre.
 
Olhava o Bayern nos olhos e sentia-se que poderia fazer mais. Veio o terceiro e a loucura no Dragão. Passe de Alex Sandro, falha de Boateng e classe, a rodos, de Jackson. Olhou o melhor guarda-redes do mundo nos olhos, puxou para o pé esquerdo, tirou-o da frente e marcou. Só ao alcance dos predestinados.
 
Antes, já Neuer tinha evitado que Herrera marcasse numa jogada brilhante, ao primeiro toque, dos azuis e brancos. Era uma fase deliciosa do futebol portista. Até dava para esquecer o nome do adversário.
 
O Bayern voltou a pegar no jogo depois de sofrer o terceiro mas sempre controlado, e bem, pela teia montada por Julen Lopetegui.
 
Como se disse, o FC Porto teve esta noite o prémio pela carreira fantástica na Champions. Muita gente irá lembrar o dia em que o todo poderoso Bayern Munique, que nunca antes tinha perdido em Portugal, caiu no Dragão.
 
Vai, agora, com todo o direito a sonhar, tentar a proeza de seguir em frente. Uma missão difícil, sabe-se. Mas se for com a raça e inteligência desta noite, terá sempre a noção de que não é apenas a geografia que aproxima Berlim.