Liverpool e Roma podem ser uma espécie de outsiders nesta fase da Liga dos Campeões, eles que começam a decidir nesta terça-feira quem passa à final, por comparação com o duelo de gigantes entre Bayern Munique e Real Madrid na outra meia-final. Ainda assim um e outro com estatuto diferente na hierarquia europeia. E com uma grande memória comum.

O sorteio das meias-finais evocou de imediato um mar de recordações com 34 anos, quando a Roma chegou à primeira, e até hoje única, final da sua história, frente ao grande Liverpool dos anos 70 e 80. A final em pleno Estádio Olímpico de Roma e os «reds» a levarem a melhor na primeira decisão da Taça dos Campeões Europeus nos penáltis.

Um ambiente intenso, que o Liverpool começou a desmontar ainda antes da entrada em campo, recorda agora o antigo goleador Ian Rush ao «Guardian»: «Foi como entrar no Coliseu, jogar uma final da Taça dos Campeões contra a Roma em Roma. No túnel antes do jogo alinhámos ao lado dos jogadores da Roma e, enquanto esperávamos para subir ao relvado, começámos a cantar «I don’t know what it is but I love it», do Chris Rea. Isso baralhou a Roma. Não sabiam o que se estava a passar mas foi a nossa forma de lhes dizer que não deixávamos intimidar-nos por nada.»

Phil Neal marcou para o Liverpool aos 13 minutos e Roberto Pruzzo igualou aos 42m. Não houve mais golos até final nem no prolongamento, chegaram os penáltis. Steve Nicol falhou o primeiro para o Liverpool, mas depois a Roma começou a perder a Taça quando Bruno Conti desperdiçou o primeiro. E por fim falhou Graziani, depois daquele número de Grobbelaar.

Só visto, para quem não tem memória disto. As pernas de esparguete do excêntrico guarda-redes do Liverpool, a pantomina que ele inventou para desconcentrar os rivais na final da então Taça dos Campeões Europeus, é um dos momentos eternos de uma final memorável.

Grobbelaar voltou agora àquele momento. «Improvisei. Sentia as pernas como esparguete, até a baliza parecia esparguete. Os fotógrafos ficaram doidos, em pisquei os olhos e abanei a cabeça e ele falhou», disse o antigo guarda-redes ao jornal «La Repubblica». Graziani também recordou agora aquele instante, em declarações ao inglês Daily Mail, e diz que não foi Grobbelaar quem o desconcentrou. «Parecia um palhaço. Tentou fazer-me perder o foco, percebo porque o fez. Mas a única coisa que me incomodou foram os fotógrafos, mesmo atrás da baliza. Pomos a bola no chão, pensamos onde vamos colocá-la e depois aquele «flash» dos fotógrafos. A seguir queixámo-nos e eles já não podem estar ali.»

Graziani falhou mesmo, Grobbelaar não chegou a fazer uma defesa. Do lado do Liverpool Alan Kennedy não vacilou na derradeira grande penalidade e os ingleses venciam ali a sua quarta Taça dos Campeões Europeus, quatro em menos de uma década.

Está aqui esse desempate por penáltis.

O Liverpool só voltaria a levantar o troféu muitos anos depois, em 2005, e regressa agora a uma meia-final ao fim de 10 anos de ausência.

Quanto à Roma, que volta pela primeira vez a uma meia-final desde então, viveu ali a grande desilusão da sua história. Para mais em casa. A final estava marcada originalmente para o Olímpico e assim se manteve. As palavras de Franco Tancredi, o guarda-redes da Roma naquela final, ao jornal «Il Messagero», dizem tudo: «É uma ferida que nunca irá fechar-se. Impossível, mesmo 34 anos depois, recordar aquela final sem raiva. Recordo a alegria enorme por lá estarmos, mas também a desilusão atroz por termos perdido.»

É um jogo que evoca também a memória de uma tragédia. Agostino di Bartolomei era o capitão da Roma no Olímpico. Deixou o clube no final dessa época, acabou por seguir para o Milan com o treinador Nils Liedholm, ainda jogou no Cesena e no Salernitana. Quatro anos depois de terminar a carreira, no meio de problemas financeiros associados a depressão, tirou a própria vida. Foi a 30 de maio de 1994, exatamente 10 anos depois da final com o Liverpool. Ninguém saberá se foi mera coincidência. Recorde aqui a história de Di Bartolomei

Há muito lastro neste reencontro entre Liverpool e Roma, tão perto da decisão da Champions. Os dois clubes voltaram a encontrar-se mais tarde, primeiro nos oitavos de final da Taça UEFA de 2000/01, com o Liverpool a levar a melhor, na época seguinte na segunda fase de grupos da Liga dos Campeões, também a sorrir aos «reds» e com a Roma a acabar eliminada. Agora, voltam ao grande palco, os dois tão perto da final.

Bayern, Real e Cristiano, os gigantes

A outra meia-final é história de gigantes. O duelo mais repetido das competições europeias, este será o 25º confronto entre Real Madrid e Bayern Munique. Não é preciso recuar mais que a época passada para o recordar: os espanhóis levaram a melhor nos quartos de final, na caminhada até à inédita revalidação do título.

O Real Madrid também levou a melhor em 2014, então na meia-final, mas dois anos antes foi o Bayern quem saiu por cima, deixando pelo caminho nos penáltis o Real então orientado por José Mourinho e seguindo até à final, ganha pelo Chelsea.

É uma história de equilíbrio: nos 24 jogos que já disputaram, o Real venceu 11 e o Bayern ganhou outros 11, sobrando dois empates. O Real Madrid marcou 37 golos e o Bayern 36. E depois há Cristiano Ronaldo a desequilibrar as contas recentes.

Cristiano, em mais uma época a definir recordes na Champions, defrontou o Bayern Munique por seis vezes e marcou nove golos. Entre eles cinco na época passada, um bis na primeira mão dos «quartos» e um «hat trick» na segunda.

No primeiro duelo, em 2011/12, o Real caiu mas só depois do bis de Ronaldo em Munique, na segunda mão, a igualar a eliminatória depois da derrota merengue por 2-1 em casa. E no duelo seguinte também bisou na goleada do Real na segunda mão (4-0).

Cristiano não é apenas o melhor marcador de sempre da Champions e o máximo goleador da época, com 15 golos. Antes de entrar em campo em Munique é também o melhor marcador de sempre em meias-finais, com 13 golos, além de recordista de jogos das meias-finais, nada menos que 19, a par com Paco Gento. O único português ainda em prova, pois. O senhor Liga dos Campeões.

Programa das meias-finais da Liga dos Campeões, que pode seguir aqui EM DIRETO:

24 Abril: Liverpool-Roma, 19h45

25 abril: Bayern Munique-Real Madrid, 19h45

1 maio: Real Madrid-Bayern Munique, 19h45

2 maio: Roma-Liverpool, 19h45